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O produtor Dario Torres e o agrônomo Tomás Mayol na região de Mercedes (Oeste). Potencial da cultura ainda não foi atingido. | Jonathan Campos / Gazeta Do Povo
O produtor Dario Torres e o agrônomo Tomás Mayol na região de Mercedes (Oeste). Potencial da cultura ainda não foi atingido.| Foto: Jonathan Campos / Gazeta Do Povo
  • Com baixo investimento, lavoura custa a alcançar 3 mil kg/ha.
  • Na região Nordeste, várzeas seguem em teste.
  • Solos rasos e menos férteis garantem espaço à pecuária.

O Uruguai surpreendeu o mundo com uma inserção meteórica no mercado global da soja. Apesar da base pequena, em dez anos multiplicou a área cultivada por cinco e a colheita por sete e alcançou a sexta posição entre os exportadores, atrás de Estados Unidos, Brasil, Argentina, Paraguai e Canadá. Depois de uma sequência de safras recordes na América do Norte e na América do Sul, no entanto, se antecipa ao rever a estratégia de contínua expansão da agricultura, apurou a Expedição Safra Gazeta do Povo, em nova viagem pelo país latino.

Uma clara demonstração de que não é mais possível sustentar sistemas de produção pouco competitivos surge na agricultura uruguaia. Com proporções que permitem uma análise clara da perda de lucratividade da commodity agrícola mais comercializada no mundo, o país perdeu ritmo de crescimento e se vê diante de um dilema: a saída é ampliar investimentos para ganhar em produtividade ou fazer contenção de custos?

Com baixo investimento, lavoura custa a alcançar 3 mil kg/ha.

O próprio clima se encarregou de limitar a colheita uruguaia. A área de plantio de soja foi incrementada em 7% na comparação com 2013/14, chegando a 1,4 milhão de hectares. Já a colheita –que caminha para a parte final –cresceu 2%, de 3,57 milhões para 3,64 milhões de toneladas. Com áreas de pastagem disponíveis para conversão à agricultura, no entanto, a estratégia para 2015/16 tende a ser de mais investimento em tecnologia do que propriamente na ampliação das lavouras, relatam produtores e técnicos. Por outro lado, redução de área é uma hipótese considerada improvável.

“Cultivar a terra não é algo que se possa abandonar logo após um ano ruim. É como andar de bicicleta: para não cair, não se pode parar”, afirma o agrônomo Luis Simean, gerente da Cooperativa Agrária Nacional (Copagran) em Paysandu, no principal polo agrícola do Uruguai, situado no Oeste do país.

Dez anos atrás, a cooperativa tinha foco em culturas de inverno e o trigo respondia por 50% da produção. Agora “a soja é o motor da agricultura”, afirma o agrônomo Edgardo Nasta. Os 2,5 mil agricultores ligados à empresa plantam perto de 50 mil hectares com a oleaginosa. O primeiro passo necessário à viabilidade da soja em época de margens reduzidas é a redução do preço dos arrendamentos, afirmam os produtores. O custo do aluguel da terra caiu em dólar mas se mantêm elevado em volume de soja. O aluguel de um hectare custa 800 quilos do grão. Com produção abaixo de 3 mil quilos por hectare, a conta não fecha, conclui o setor.

Na região Nordeste, várzeas seguem em teste.

Por outro lado, os resultados desta temporada tendem a estimular investimento em tecnologia (mais adubo e sementes adaptadas). Um dos maiores produtores de grão no país, com 6,6 mil hectares de soja, Alberto Gramont conta que consegue 2,9 mil quilos por hectare com essa estratégia. Num ano de chuvas escassas, o solo melhor preparado faz a diferença, argumenta.

A partir de agora, expansão vai exigir mais determinação

A era da expansão “fácil” na produção e exportação de soja chegou ao fim no Uruguai. A partir de agora, o agronegócio terá de perseguir aumento na produtividade e redução nos custos com mais determinação, afirmam os especialistas.

“O preço da terra teve um salto [da média de US$ 1 mil para US$ 5 mil por hectare em dez anos], os arrendamentos subiram junto, a viabilidade passou a depender de produtividade elevada. É um novo cenário, que exige especialização e estratégia”, aponta João Sandri, gerente comercial da Solaris, empresa de serviços e insumos que monitora as tendências no país.

Na viagem pelo Uruguai, a Expedição Safra encontrou exemplos claros dessas tendências. Os produtores sentem na pele o redução no ritmo de crescimento do próprio país, que tenta alcançar variação de 3% no Produto Interno Bruto em 2015. A soja devolveu à carne o posto de principal produto de exportação no país, alcançado em 2013. E a queda nas cotações globais da oleaginosa, que chega a 35% em um ano, anuncia quadro semelhante para 2015. Para que as exportações se mantenham acima de US$ 9 bilhões, será necessária expansão nos embarques de carne bovina.

Solos rasos e menos férteis garantem espaço à pecuária.

O problema climático que impediu uma aproximação à marca de 3 mil quilos de soja por hectare é um problema pontual, dentro de um cenário que exige análise de médio prazo, afirma o produtor Dario Torres, de Mercedes (Oeste). “Com uma chuva a mais chegaríamos a 3,3 mil quilos por hectare”, disse.

Nesse patamar, a oleaginosa recupera viabilidade, analisa o agrônomo Tomás Mayol. Se isso ocorrer nas próximas temporadas, quem está no negócio terá condições de consolidar a expansão da soja, considera.

Torres espera 3 mil quilos/ha numa área de 2 mil hectares na região de Mercedes, ao Sul do Rio Negro (no Oeste). Sem um palmo de terra, conseguiu montar uma estrutura de produção com maquinário e equipe de trabalho e se tornou uma referência de aposta acertada entre os agricultores uruguaios.

Basicamente duas zonas produtivas se consolidam na sojicultura no país: uma no Nordeste, nas várzeas da região de Rio Branco, e outra – maior e mais estável – no Oeste, nos campos da região de Paysandu, Mercedes e Young.

A produtividade varia bastante dentro dessas próprias regiões. Na região das várzeas, os solos tradicionalmente explorados na pecuária rendem de 2 mil a 3 mil quilos por hectare, dependendo da fertilização. No Oeste, região também conhecida como Litoral, por estar à margem do Rio Uruguai, a parte Norte recebeu menos chuvas e rende 2,2 mil quilos por hectare. No Litoral Sul, lavouras mais bem adubadas ou que receberam mais umidade rendem entre 2,8 mil e 3 mil quilos de soja por hectare nesta temporada.

América do Sul sustenta liderança na exportação

Com ajuda de países que produzem soja praticamente só para exportar, como o Uruguai, a América do Sul sustenta liderança no comércio global da oleaginosa. Deve participar com 53% dos embarques, ou 62,4 milhões de toneladas, em 2014/15. O volume é praticamente o mesmo de 2013/14, mas a participação caiu três pontos, uma vez que o comércio global cresceu 4% e a América do Norte está abocanhando essa expansão, conforme números do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o USDA.

Apesar da previsão de queda brusca no valor arrecadado com a exportação de soja – que pode chegar a 20% em dólar, na comparação com a última temporada –, o Uruguai planeja embarcar 3,3 milhões de toneladas do grão, volume que se equipara ao da última temporada. O país possui logística privilegiada ao embarque. Todo o Oeste exporta soja pelo Porto de Nueva Palmira, a menos de 300 quilômetros das lavouras. Mesmo o Nordeste pode exportar com percurso de 400 quilômetros, até o Porto de Montevidéu.

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