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“Get Me Roger Stone”: um embuste de fazer Michael Moore parecer honesto
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A Netflix está lançando com estardalhaço um, digamos, documentário sobre a eleição de Donald Trump: Get Me Roger Stone. É de chorar de tão partidário, mentiroso e datado.

Não é novidade para ninguém que a esquerda americana não quer aceitar o novo presidente e está fazendo de tudo para tirar sua credibilidade, obstruir seu governo e interromper seu mandato. A política americana poucas vezes esteve tão radicalmente dividida como agora. O ambiente está tão conflagrado que lembra os tempos da Guerra de Secessão (1861-1865), quando o mesmo Partido Democrata não aceitou a vitória do republicano Abraham Lincoln e a abolição da escravidão, jogando o país numa guerra fratricida que terminou com quase 1 milhão de mortos, mais do que as perdas americanas na Primeira Guerra e na Segunda Guerra Mundial somadas.

Get Me Roger Stone é tão surrealista e moralmente torto que o brasileiro mais atento reconhece as mesmas táticas dos veículos umbilicalmente ligados ao petismo fazendo revisionismo histórico sobre o impeachment de Dilma Rousseff. Assim como a esquerda americana busca desesperadamente explicar a derrota do ano passado, vemos por aqui diariamente os que sonham emplacar embustes como os citadas no artigo “Cinco narrativas que vão destruir o país de vez“. O mundo da pós-verdade perdeu qualquer senso de ridículo e de conexão com a realidade.

Roger Stone é tratado no documentário como alguém com poderes quase mediúnicos, um manipulador que exploraria o que há de pior no eleitor para eleger seu cliente, quando é, na verdade, um estrategista de campanha como tantos outros – e foi demitido por Trump num estágio inicial da campanha, o que de cara já desmoraliza a tese central defendida pelos diretores do filme. Não satisfeitos, eles tentam ligar Trump e Stone à Ronald Reagan, Richard Nixon e até Joseph McCarthy, naqueles malabarismos argumentativos que normalmente só os teóricos da conspiração mais psicóticos são capazes.

Tente imaginar o Partido Democrata, preferido por Hollywood e pela indústria cultural mais poderosa do planeta, além de ser o partido da imprensa e da academia, sendo mostrado em Get Me Roger Stone como vítima indefesa de um jogo de manipulação de um bufão. É tão ridículo e cara-de-pau que assisti até o final para acreditar no que estava vendo. Some-se a estes embustes partidários a total inversão sobre quem representa hoje as “elites” no espectro político americano e a supressão canalha do papel dos estrategistas de campanha do Partido Democrata e está feito o samba do esquerdista doido.

Os diretores de Get Me Roger Stone tentaram criar uma teoria conspiratória em que a eleição de Donald Trump seria o resultado das idéias e táticas de um “gênio do mal”, na verdade um fanfarrão histriônico. Aos 64 anos, Stone participa ativamente e desde a juventude de campanhas eleitorais republicanas, mas seu poder de influência é absurdamente exagerado no filme.

É preciso uma dose cavalar de mau-caratismo para sugerir, como faz o documentário, que há um monopólio da virtude na esquerda e que os republicanos representariam o lado que joga sujo, faz falsas acusações, espalha mentiras contra adversários na internet ou, depois de eleger seus candidatos, abre as portas do governo para lobistas.

Quem acha que o partido bancado por George Soros e pelos banqueiros de Wall Street, que escolheu Hillary Clinton como candidata, representa os ideais mais elevados e a ética na política, enquanto seu oponente, escorraçado pela imprensa e por Hollywood, desprezado até pela cúpula do próprio partido, representa o mal e os interesses escusos dos “bilionários”, merece mesmo ser enganado por um lixo panfletário como Get Me Roger Stone.

O documentário sequer menciona o nome do sinistro estrategista e chefe de campanha de Hillary Clinton no ano passado, John Podesta. Perto dele, Roger Stone é um amador, como revelado nos e-mails vazados pelo WikiLeaks poucos dias antes da eleição ou por qualquer um que conheça Podesta de perto.

O braço direito de Hillary na campanha, a muçulmana radical Huma Abedin, também é “esquecida” no roteiro. David Axelrod, o estrategista de Barack Obama, era tão influente na imprensa americana durante suas campanhas que o próprio Obama, no famoso jantar anual dos correspondentes, chegou a fazer piada com a contratação dele como analista na TV dizendo “Axelrod agora vai trabalhar para a MSNBC, depois de tantos anos da MSNBC trabalhando para ele”. Nenhuma dessas figuras muito mais poderosas que o fanfarrão republicano interessou os diretores e roteiristas de Get Me Roger Stone.

Se há um mérito no documentário é o de relembrar como a esquerda americana tem dinheiro e investe pesado na construção de narrativas, usando todos os recursos possíveis para dar sustenção moral e política ao revisionismo histórico, neste caso quase orwelliano.

A direita ainda tem muito o que aprender e, principalmente, tem que colocar a mão no bolso de verdade para sonhar em igualar o jogo na guerra cultural. É claro que o documentário servirá como alfafa ideológica para os menos informados, além dos que não resistem a uma teoria conspiratória, e cumprirá seu papel.

O resultado final de Get Me Roger Stone é tão constrangedor que faz Michael Moore parecer honesto. Fuja, seu tempo é precioso demais para isso.

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