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Foto: Teh Eng Koon/AFPENG KOON
Foto: Teh Eng Koon/AFPENG KOON| Foto:

Neste ano a Revolução Russa completa 100 anos. Embora também chamada de “Revolução de Outubro”, ela ocorreu nos primeiros dias de novembro, sendo seu aniversário no dia 7 deste mês, segundo o calendário gregoriano, que nós utilizamos atualmente. A Rússia da época, sufocada pelo atraso do czarismo, ainda utilizava o calendário juliano, que havia alguns séculos já se sabia continha um erro de cálculo em alguns anos bissextos, e por isso a contagem do tempo tinha alguns dias de atraso; assim, em Moscou ainda eram os últimos dias de outubro.

Liderada pelo partido bolchevique, a revolução foi um marco importante do século 20, que, segundo o historiador Eric Hobsbawm, teria “começado” nesse episódio de 1917. Não é possível explicar o temperamental século 20 sem dar destaque para a Revolução Russa. O contraponto norte-americano ao poder russo deu origem à chamada “Guerra Fria”, uma disputa de poder que não se dava apenas pelo embate de forças, mas também pela demonstração das condições de desenvolvimento de cada país.

Possivelmente, sem a “ameaça soviética”, os Estados Unidos não teriam avançado tanto. E vice-versa. O desenvolvimento que ocorreu na Rússia a partir da revolução é inquestionável. De um país predominantemente rural, a Rússia chegou à posição de polo econômico mundial, centralizando não apenas os países da chamada União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), mas também metade do mundo.

A palavra “soviético”, que chegou a ter conotação pejorativa no mundo ocidental, era, na verdade, uma grande inovação nas práticas democráticas. Os “sovietes” eram os conselhos de participação popular que organizavam o governo socialista. Uma noção que nunca chegou a ser totalmente praticada no mundo democrático. Aqui no Brasil, ainda ensaiamos na criação de mecanismos de participação direta da população.

Depois de realizado, o feito se revelou monumental até para os seus principais personagens. A cúpula dos bolcheviques mal podia acreditar ter dirigido esse momento histórico. A partir daí, surgem discussões sobre os próximos passos. Com a morte de Lenin, perde-se a liderança consensual da revolução, e daí duas grandes vertentes derivam do movimento revolucionário russo. De um lado, Stalin, que obteve os meios de substituir Lenin na liderança da União Soviética. Stalin acreditava no desenvolvimento do movimento socialista a partir da União Soviética, tenho realizado feitos notáveis, como a vitória sobre Hitler na Segunda Guerra Mundial. Ao fim, dissolveu o movimento socialista internacional, contendo assim a participação direta da União Soviética em movimentos antiamericanos em outros países.

De outro lado, Trotsky, perdedor na disputa com Stalin, fugiu da perseguição política do novo dirigente máximo. Como conta o poeta curitibano Paulo Leminski biografia que escreveu sobre Trotsky, não é possível saber se ele seria melhor ou pior que Stalin, pois na história não existe “se”. Existe o que ocorreu e, quanto a isso, Trotsky foi o maior opositor de esquerda à União Soviética. Tendo sido, durante a revolução, o líder do Exército Vermelho, passou, sob o comando de Stalin, a ser um exilado político perseguido pelas forças assassinas do comandante soviético. Trotsky defendia uma revolução permanente, internacional, que não permanecesse apenas nos países soviéticos. Suas amizades com intelectuais americanos e sua crítica ao comando da União Soviética lhe renderam acusações de traidor a serviço dos Estados Unidos. Foi assassinado por um agente stalinista em sua residência no México. Seu legado ainda hoje inspira movimentos socialistas internacionalistas.

A velocidade dos tempos atuais dá a falsa impressão de antiguidade a esses fatos. A revolução e suas consequências aconteceram neste intervalo dos últimos 100 anos, e é inevitável que ainda tenham repercussões na atualidade. A clivagem política entre esquerda e direita que atualmente se concebe tem origem e explicação nos polos da Guerra Fria. Embora com tintas mais discretas, o mundo ainda hoje é governado pela divergência entre os ideais socialistas e capitalistas. A China, o segundo país mais poderoso economicamente da atualidade, rivaliza em igualdade de condições com os Estados Unidos sustentando ideais socialistas.

A riqueza das inspirações da Revolução Russa é tão marcante que muito se discute se o movimento soviético de fato praticava o socialismo, assim como muitos afirmam que a China não seria socialista. Os erros desses movimentos também legaram imagens negativas para o movimento socialista da atualidade, que tem de lidar com as críticas baseadas nesses fatos. Importante frisar, por outro lado, que os erros dos governos socialistas não são maiores que os dos governos capitalistas. Afinal, não dá para dizer que o mundo que vivemos seja aquele que “deu certo”, e que desejamos para nossas futuras gerações. E o que é que temos feito para que essa realidade mude?

Os revolucionários russos deixam ao menos este legado: o de tentar mudar o mundo na prática.

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