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A direita está pedindo uma “polícia do ensino”
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Da coluna Caixa Zero, publicada nesta quarta-feira, na Gazeta do Povo:

Como flagrar um professor que esteja doutrinando seu filho? O manual existe. Está no site do programa Escola Sem Partido. Há uma série de pistas a que os alunos e os pais devem estar atentos. Caso as regras sejam infringidas, a orientação é para que se denuncie para que o professor seja enquadrado em uma lei. Sim, uma lei.

O primeiro ato proscrito que identifica um professor-doutrinador é: “se desvia frequentemente da matéria objeto da disciplina para assuntos relacionados ao noticiário político ou internacional”. O segundo: “adota ou indica livros, publicações e autores identificados com determinada corrente ideológica”.

Pelo rigor da letra, um professor de história que comente com frequência o desenrolar da guerra na Síria ou a crise dos imigrantes na Europa doutrina seus alunos. Se indicar “O caminho da servidão”, idem. Outro item diz que doutrinador é também o professor que “ridiculariza, desqualifica ou difama personalidades históricas, políticas ou religiosas”. Ai de quem ousar falar mal de Stálin!

A minuta de projeto de lei criada pelo Escola sem Partido vem ganhando legisladores de vários estados e municípios do país. Em Curitiba, virou proposta de lei da vereadora Carla Pimentel (PSC). No artigo 2.º, veda-se “a veiculação, em disciplina obrigatória, de conteúdos que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos estudantes ou de seus pais ou responsáveis”.

Em vários países considera-se (ainda) que a teoria da evolução é uma afronta à religião. Pode ser que a intenção inicial nem fosse essa, mas o projeto dá margem a que se saia por aí pedindo punição a um professor que ensine Darwin. Levado a ferro e fogo, o projeto pode proibir que se fale sobre a Reforma, Contrarreforma ou sobre Nietzsche.

É claro que, como tudo no mundo, o projeto e a ideia como um todo do Escola sem Partido têm lá suas razões de ser. É evidente que há professores que usam de maneira espúria seu poder em sala de aula para distorcer informações em nome de uma ideologia. É evidente que essas distorções não são boas e que devem ser combatidas.

Não deixa de ser irônico, porém, que sejam os liberais a querer esse Estado policialesco de denúncias e de leis que regulem a livre circulação de ideias. Logo eles que sempre afirmam que o mercado autorregula tudo e que acusam a esquerda de querer criar um Estado monstro que nos diga o que podemos e o que não podemos fazer.

Agora dizem lutar por uma “desmonopolização” (o termo é do site do Escola sem Partido). Parece uma óbvia confissão de que o que incomoda é o “monopólio” de uma ideologia que não é a deles, muito mais do que a politização em si. Sobre isso, vale registrar um depoimento de um cidadão encampado pelo site do Escola sem Partido como prova do “gramscismo” da escola atual. Depois de assistir a uma palestra sobre o ensino relativo à ditadura de 64 e de apontar os erros da doutrinação, o partidário do programa escreve:

“Antes de retirar-me, identifiquei-me, dizendo à Coordenadora que respeitava seus pontos de vista, mas não concordava em nada com as ideias ali expostas. Sua expressão foi de espanto. Depois, fiz entrega a uma das professoras de um material escrito (a variadas mãos) com o posicionamento de alguns militares sobre a contrarrevolução democrática de 31 de Março de 1964, mesmo sabendo ser atitude vã, pois a ‘Academia’ nunca compreenderá o tema como por nós ali descrito.”

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