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Afinal, por que o Congresso vota leis orçamentárias?
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Por Chico Marés, interino

O primeiro embate entre o novo governo e a nova oposição, na votação das novas metas fiscais do orçamento de 2016, seguiu o script esperado. PT acusa PMDB de golpe. PSDB diz que PT quebrou o país. PT tenta obstruir a votação. Governo tenta passar o rolo compressor. Governo passa o rolo compressor. Fim de sessão.

Em meio a toda a gritaria, nem um lado, nem o outro apontaram o grande problema de todo esse processo. Afinal, com Dilma Rousseff, Michel Temer ou Rui Costa Pimenta, para que o Congresso analisa o orçamento?

Antes de entrar no projeto em questão, vamos relembrar de 2014. Em dezembro, ou seja, com o ano fiscal praticamente já encerrado, Dilma Rousseff apresenta projeto de lei alterando a meta fiscal da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2014. Isso foi feito porque, obviamente, o governo não cumpriu a meta, mas não queria descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Os deputados, em sua maioria, votaram sim, e, com o ano praticamente encerrado, colocou o governo de novo dentro da lei.

A definição de meta, seja qual for, é um objetivo traçado a priori, com um prazo estipulado, para atingir um objetivo ou servir como baliza para uma determinada ação. Acho que qualquer pessoa minimamente sensata concordaria que alterar uma meta quando o resultado já está definido invalida o próprio conceito de meta. Ou, falando de outra maneira, se uma meta pode ser alterada quando a ação está concluída, ela não tem razão de existir – na prática, ela sequer existe.

Dilma fez isso: ao descumprir a meta, criou uma nova meta. O Congresso, depois de muita briga, confirmou. Ou seja: de fato, o governo trabalhou sem uma meta fiscal em 2014, porque cometeu um ato, ainda que possa ser considerado legal, absolutamente invalido do ponto de vista lógico.

(antes que me cobrem, o governador Beto Richa fez a mesma coisa, após a conclusão do exercício de 2014, diga-se de passagem)

Voltamos para a votação de ontem. Na segunda-feira, Temer, com toda a pompa e circunstância, entrega seu projeto de revisão das metas fiscais de 2016 para o Congresso. Frise-se: não se trata de uma situação análoga à de 2014. Primeiro, porque estamos no primeiro semestre, e o objetivo estipulado inicialmente simplesmente não bate com a realidade fiscal – uma correção da meta no meio do caminho é diferente da invalidação no final. Segundo, porque se trata de um novo governo, ainda que interino.

Esse ato de entregar em mãos um projeto orçamentário é um símbolo de compromisso, de respeito ao parlamento e ao próprio orçamento. Mas ações simbólicas não valem nada quando contraditas pela realidade prática. E, no mundo real, o projeto foi votado, já no dia seguinte, por um rolo compressor, que tinha muita pressa e nenhuma qualquer disposição de analisar o conteúdo da proposta.

Os deputados votaram totalmente no escuro, pelo sim ou pelo não, tendo um único dia para analisar um caminhão de novas informações apresentadas pelo novo governo. Foi tamanho o açodamento que sequer uma análise pela Comissão Mista de Orçamento foi realizada, o parecer foi inventado na hora. Havia urgência? Lógico que havia. Mas isso não justifica uma confiança cega do Congresso no governo.

Quando Dilma inventou uma nova meta fiscal após descumprir a antiga, ela invalidou completamente o conceito de meta fiscal. E quando o Congresso votou uma nova meta fiscal sem saber o que estava votando, invalidou o conceito de análise do orçamento pelo Legislativo.

Sendo assim, restam duas opções: ou o Congresso passa a tratar mudanças no orçamento com a seriedade devida ou elimina-se essa parte burocrática, cabendo ao governo mexer na LDO e na LOA conforme entende, por decreto. Fico com a primeira opção.

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