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Ives Gandra Filho. Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo.
Ives Gandra Filho. Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo.| Foto:
Ives Gandra Filho. Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo.

Ives Gandra Filho. Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo.

Imagine que você está numa festa com amigos e de repente alguém diz o seguinte: no casamento, quem manda é o homem. Mulher tem mais que obedecer. Acho provável que você ficasse chocado, certo? Mas, afinal, a gente vive em uma democracia e cada um pode pensar o que quiser – o que resta, além de tentar convencer a pessoa a mudar de ideia – é torcer pelo destino de quem se casar com ele.

Mas é potencialmente muito diferente uma pessoa pública dizer isso, ainda mais quando se trata de alguém do mundo do direito escrevendo isso num artigo que pretende estabelecer quais são as bases de uma boa legislação sobre família. Sendo claro: não se trata da opinião de um popular. É alguém que está defendendo que o princípio de “o homem manda, a mulher obedece” seja a base da lei de um país.

A afirmação do possível ministro do STF Ives Gandra Martins Filho tem justamente esse potencial. O que ele afirmou, em livro – não numa conversa entre amigos – foi literalmente o que se segue. “O princípio da autoridade na família está ordenado de tal forma que os filhos obedeçam aos pais e a mulher ao marido.”

Ou seja: não é uma ideia privada. É alguém que quer que essa seja a base “natural” do direito de um país. No caso, o nosso país. A argumentação do texto de Gandra é pífia, como dificilmente deixaria de ser – o que deixa ainda mais chocados os que se contrapõem a uma possível indicação ao STF.

Gandra é um “jusnaturalista”. Em seu texto, ainda que curto, sobram comparações com o mundo animal para mostrar o que a natureza quer de nós. Se osm pássaros são assim, se os animais fazem desse jeito, quem somos nõs, parece ser a base de seu pensamento, para dizer que devemos fazer o contrário, ofendendo a natureza. (O tipo de pensamento que logo cai em contradição quando ele diz que “sexo sem amor é próprio de animais”, e portanto deve ser evitado pelos humanos.)

Evidente que nem tudo que a natureza quer é bom para homens. Fosse assim, jamais poderíamos mudar muitas coisas que todos nós quisemos mudar. Ou alguém, acha que deveríamos manter todos os comportamentos do homem primitivo como base para pensar o que deve ser uma sociedade civilizada.

Mas a contradição mais grosseira sobre a submissão feminina como base para o direito se dá no último parágrafo do texto de Gandra, em que ele critica o governo Chinês por limitar o número de filhos que cada casal deve ter, “interferindo em seara afeta exclusivamente à deliberação do casal”.

Está certo em dizer que é patética a ideia de um governo delimitar o número de filhos que alguém pode ter. Mas como então ele pode querer que o Estado (pois só isso explica a inclusão da premissa da submissão em um texto sobre direito) poder dizer quem manda em quem dentro de uma família? Por que nisso o Estado poderia interferir? Por que nesse caso isso coincide com a ideologia do ministro?

Gandra, pelo que se vê, mal chega a ser um conservador. Conservador é aquele que quer manter o modo como uma sociedade é. Serviria, por exemplo, para a discussão dos direitos dos gays, em que ele se mostra também contrário a todos os avanços recentes da legislação. No caso dos direitos das mulheres, Gandra é reacionário – quer voltar a um estado de coisas que nem existe mais.

E como ficaria a mulher que não queira se submeter? Nem divorciar, segundo os preceitos de Gandra, poderia. O divórcio, na cabeça de Gandra, é simplesmente algo que não deveria existir no nosso país. Assim, quem não se submtete não pode nem acabar com uma situação que surja adiante. É, de novo, o machismo como lei. A regra de que a mulher é inferior e deve aceitar o seu lugar. Isso como base de um Estado.

Não é conservadorismo. É machismo mesmo.

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