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Em Curitiba, Dilma fala a convertidos e parece aceitar seu destino
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Política não é casamento: não existe juramento de fidelidade na saúde e na doença. Quando Dilma Rousseff estava no momento da alegria, milhares de pessoas iam aonde quer que ela fosse: no seu comício em Curitiba, em 2010, a Boca Maldita encheu para ver a futura presidente.

Agora, na tristeza, Dilma voltou a Curitiba – afastada da Presidência, foi recebida no circo da Democracia. Tenda cheia, gente nas escadarias da UFPR apesar do frio. Gritos de “Fora, Temer!”, “Fora, Moro!”, “Volta, querida!” São os que decidiram ir com Dilma até o fim do calvário, cada vez mais próximo.

Mas apesar da fidelidade desses, que não são tão poucos, nem de longe a cerimônia desta terça-feira parecia ser a de uma presidente que está à beira de voltar ao centro do poder. Falando para os convertidos, Dilma disse o que precisava dizer: que está em curso um golpe. Que a direita utilizou mecanismos não democráticos para impor uma pauta impopular. Que não houve crime de responsabilidade.

Diante de seu público cativo, parecia nadar de braçada. “Eu tenho essa mania de resistir. E quem me dá força para resistir são vocês!” Palmas e gritos na plateia. Quem causou o golpe? “Parte da mídia oligopolista”, começa ela, e não é preciso mais nada: irrompe o coro contra a Rede Globo.

Os conversos reunidos em praça pública foram suficientes para tornar a participação de Dilma menos triste. Mas é impossível não perceber que o ar foi de uma missa de corpo presente. Em cima do palanque, ao lado de aliados (cada vez mais raros) como Gleisi e Requião, a presidente nem mesmo arriscou as bravatas típicas de um comício.

Em nenhum momento Dilma disse que irá voltar. Em nenhum momento cantou vitória. Sequer incitou as pessoas a continuarem se manifestando. Disse apenas que é importante “tentar parar” o golpe. Nada mais. De resto, o comício pareceu o tempo todo uma espécie de desagravo, uma tentativa de afirmar que não foram os erros de Dilma que a puseram nessa situação constrangedora.

Dilma falou o tempo todo de quem pode ter acabado com seu mandato. Falou da parte da oposição ao seu governo que considera “mais programática”, em contraposição à que considera “mais fisiológica”. E esse foi o mais perto que ela passou de admitir qualquer erro dela e de seu partido.

A oposição mais programática existe na comparação com o grupo mais fisiológico do Congresso, que foi em grande medida cooptado pelo projeto petista de governo. Gente que por ideologia não iria jamais querer qualquer coisa com Dilma e Lula, mas que lá estava em função de… sabe-se lá o quê. Ou melhor, desconfia-se.

O trágico da situação se via a cada vez que Dilma mencionava seu vice e que fazia questão de classifica-lo como “ilegítimo”, quando extravasava sua raiva contra ele. Temer, símbolo máximo do fisiologismo, só estava em condições de fazer o que fez porque Lula e Dilma o colocaram onde estava: lhe deram a vice e lhe deram todos os argumentos necessários para o impeachment.

A plateia, cuidadosamente escolhida dentre associações próximas ao petismo, vibrou. Dilma sorriu. Mas exceto pela proposta de um plebiscito (e por que alguém decidido a derrubá-la aceitaria isso agora, estando no poder?) não houve qualquer propósito prático, qualquer grito de vitória, qualquer ordem unida. Não era um evento com vistas para o futuro, a não ser no sentido de que pretende manter vivo um certo projeto – era um evento para negar os erros e desagravar a presidente, à beira do fim de seu mandato.

Na tristeza, Dilma se viu diante de poucos. Cumpriu seu papel protocolarmente, e foi-se embora. No dia seguinte, Temer continuaria no poder. E ela sairia dali rumo aos livros de História.

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