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O apedrejamento dos jornais e a defesa dos fascistas
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Era previsível que o impeachment de Dilma Rousseff fosse ter consequências bem diferentes da queda de Collor. Dilma tem um partido forte, sindicatos e movimentos sociais a seu lado. Collor era um outsider sem partido e sem militância. Caiu e o som da queda mal se ouviu.

Estranhamente os partidários históricos do petismo fizeram menos barulho nas ruas do que se esperava antes da queda. Agora, rugem pedindo a saída de Michel Temer. Faz parte do jogo: aparentemente preferiram se preocupar em detonar Temer rumo a 2018 do que em salvar a pele de Dilma.

Nas manifestações anti-Temer viram-se abusos tremendos das autoridades policiais, da repressão. A polícia de São Paulo, que no mandato de Alckmin já bateu em todo tipo de manifestante continua aumentando sua ficha criminal. Cegou um, continuará cegando.

As armas usadas pela PM, antidemocráticas, devem ser repelidas – é preciso se denunciar os excessos contra as manifestações. E isso está sendo feito. Mas é preciso denunciar também os excessos dos manifestantes. E aqui há um caso especialmente simbólico.

Deu-se agora de empastelar jornais, como era moda em meados do século passado. A ideia dos fascistas por trás desse tipo de comportamento é que às palavras só se pode reagir com pancadaria. De que a agressão é um meio válido de discurso político.

Boa parte da intelectualidade brasileira há tempos vem criminalizando a atividade jornalística e especialmente as empresas de comunicação. Em tempos de oligopólio mundial de Facebook e Google, continuam com o discurso de manuais escolares de denúncia à imprensa típicos dos anos 80.

A imprensa comercial, nesse discurso, só pode agir por interesses espúrios. O discurso do jornalismo, nessa narrativa, é sempre vil. As reportagens, assim como os editoriais, devem ser repelidos não com a força das ideias, mas com a demonização de tudo o que não vá de acordo com a ideologia do leitor.

Não que a imprensa não erre. Não que não haja motivos de contestação. Não que a crítica seja proibida. Mas assim como não se pode balear manifestantes com tiros de borracha; assim como não se pode arrancar o celular de uma senadora em um avião; assim como se deve denunciar quem bate em professores; desse mesmo modo não se pode permitir por um instante que seja a violação dos direitos dos jornalistas e dos jornais.

Você não gosta do jornalismo de certas empresas? Ótimo! Proteste. Vá às ruas. Procure outros veículos. Denuncie abusos. Em tempos de internet, há literalmente centenas de opções de onde se informar, de todos os matizes – inclusive veículos que compactuam com a violência e com o fascismo, tanto de esquerda quanto de direita.

Mas o que não se pode permitir é a demonização, e a demonização generalizada, o discurso de que é quebrar ou perder, de que a aniquilação, a violência, o vandalismo são a única possibilidade de a democracia vencer.

Certa intelectualidade vê na imprensa um inimigo. A mesma imprensa que denuncia dia a dia casos de desvios de políticos, de maus-tratos contra minorias, que retrata os dramas dos desvalidos, que ajuda a dar visibilidade ao trabalho acadêmico, que promove cultura, que permite a existência, em grande medida, de uma esfera pública.

O viés é visto em todo canto – até onde não existe – e tudo se coloca num mesmo balaio que nunca ou quase nunca é especificado: não se diz que “este jornal” ou “este texto” errou. É preciso um vilão maior: a imprensa.

Como se todos os jornalistas fossem robôs programáveis por patrões inescrupulosos em busca de lucro vil; patetas acríticos comandados por mefistofélicos capitalistas meramente interessados em oprimir os seus leitores e em enganá-los em troca da manutenção do status quo.

Um discurso burro, preguiçoso e mil vezes perigoso, que termina sabe-se como: com um cinegrafista morto por um rojão em praça pública – e com os fascistas comemorando aquilo que já não enxergam como a morte de um trabalhador, e sim como a vitória sobre um inimigo perverso.

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