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O Banco Central, quem diria, foi um dos assuntos mais importantes da eleição que passou. Isso graças ao pessoal de Marina Silva, que acabou nem passando para o segundo turno. Será que teve a ver com sua proposta de independência do BC? Pode ser. Não que a população em si repudie a proposta (novidade para muita gente, e assunto um tanto esotérico), mas isso levou a candidata a passar por amiga de banqueiros, graças à agressiva campanha petista. Ironicamente, agora cogita-se que o presidente do Bradesco seja ministro da Fazenda de Dilma. A presidente não confirma mas já disse que “gosta muito” dele.

A tese petista (endossada por Requião, aqui no Paraná) é de que o BC independente cairia inexoravelmente nas mãos do mercado e tenderia a defender o lucro de meia dúzia, ao invés dos interesses da maioria. Pode ser, pode não ser. Se você indicar pessoas sérias, não há porque crer que elas se venderão assim tão fácil. E o BC continuará atrelado a metas, só terá independência para decidir como atingi-las. No calor da hora, porém, vá explicar isso…

O problema, me parece, da tese do BC independente é outro. É o de querer dizer que a economia é algo tão importante que não pode depender de simples mortais como nós. Deve ficar restrita às decisões de adultos responsáveis e inteligentes capazes de compreender coisas que nós não compreendemos. Eles, os economistas. Eles, os sábios. Como se a economia fosse intrinsecamente algo diferente do restante das áreas em que a política atua. Uma ciência inatingível.

É óbvio que conhecimento de especialistas é algo muito útil e que eu e você, e a maioria dos brasileiros, não temos condições de disputar com profissionais da área em temas mais áridos. Eles certamente sabem mais do assunto e, falando francamente, fosse eu o ministro da Fazenda e este país já teria ido à bancarrota facilmente. Várias vezes. Mas não é esse o ponto.

Saúde pública também é assunto para poucos. O mesmo vale para educação. Ou para turismo. E, no entanto, ninguém advoga que se coloque um pedagogo com independência do presidente no Ministério da Educação. Nem vi alguém dizendo que seria fundamental ter um sanitarista com mandato fixo e alternado com o do presidente no Ministério da Saúde. Turismólogos, então, nem se fala.

Claro que alguém poderá dizer que a economia é algo mais complicado. Debêntures, derivativos, mercados financeiros, investimento estrangeiro direto etc são coisas que exigem realmente muito estudo. Mas, e aqui vai o mais importante, não são uma ciência que deveria estar separada da decisão política. Principalmente porque não há a “ciência econômica”, esse monolito em que os técnicos simplesmente fazem cálculos e usam leis universais para chegar a conclusões unânimes e sem falhas. A economia é uma ciência, mas não uma ciência exata.

Há diversas escolas de economia, e cada uma trata uma crise, trata a inflação, trata o crescimento econômico de um jeito. E nenhuma delas está “certa” 100% das vezes. Porque não existe isso. Não é assim que funciona. Economistas podem errar como qualquer outro. E as decisões podem ser melhores ou piores mesmo seguindo as boas práticas. E, portanto, não se pode confiar que é só deixar na mão do especialista que ele resolver.

Claro: não é o caso de fazer um plebiscito a cada vez que for se decidir a Selic. Mas tratar isso como se fosse algo em que não podemos nem devemos dar palpite é o que o economista Ha-Joon Chang, sul-coreano, em seu Economics, the User Guide, ainda inédito no Brasil, a insistência em teses do gênero vem da desconfiança de que políticos são pessoas de má fé, que a política sempre se curva aos interesses errados e, mais, da certeza de que os economistas, pelo contrário, são pessoas de boa fé e incapazes de errar.

A ideia é a da “despolitização” da economia. Dizer que aquele é um assunto sagrado, e nós, como leigos, não podemos botar a mão. Ora, eu quero saber se o BC estiver errando, e é evidente que um debate com 200 milhões de pessoas é mais rico do que um debate com um pequeno grupo de diretores fechados numa salinha com ar-condicionado. Por que não? Em nome de qual teoria isso deve sair de nossas mãos?

Chang diz, inclusive, que os próprios economistas de livre mercado são os maiores detratores da política. Fazem questão de sujar o mais possível o nome dos governantes e de qualquer um que se envolva com política. Assim, fica claro quem é que deve mandar. Faz sentido.

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