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Contribuição de luxo para o blog do jornalista Guilherme Voitch, da Gazeta do Povo:

Consequência direta da festa da democracia, o Brasil presenciou, nos últimos dias, uma ampla e maciça propagação de bobagens. Quase todo mundo teve direito a sua. Ex-presidentes falaram bobagens, deputados falaram bobagem, ex-roqueiros em atividade falaram bobagem, humoristas-colunistas de jornal falaram bobagem.

As redes sociais, como sempre, amplificaram as besteiras de um exército de clones daquela sua tia simpática, admiradora do Collor e do Maluf, que vive de postar fotos patrióticas com os dizeres “Acorda Brasil!”. Sim, caro leitor, o calor das urnas fez o Brasil perder as estribeiras.

Agora vivemos o momento seguinte em que todo mundo aponta o dedo para todo mundo. Estamos apontando, uns na cara dos outros, as besteiras que foram ditas e escritas. Trata-se de uma espécie de expurgo pós-eleitoral com finalidades terapêuticas. A ideia é que os ânimos se acalmem. Aos poucos, quem sabe, essa ressaca eleitoral irá passar. Saberemos contemporizar e colocar as coisas no seu devido lugar. “Falou umas besteiras, mas é a nossa querida tia Maria. Você sabe que no fundo é uma boa pessoa”, ou “fez um discurso esquizofrênico na mesa do bar, mas, tadinho, ele é jornalista”, ou “disseminou umas mentiras, mas veja bem, é só um político eleito pelo voto direto”.

Existe, no entanto, uma classe especial de seres humanos alheios a essas cobranças mundanas. Eles aparecem, especialmente, em tempos como esses, falando muito, quase o tempo todo. Eles são os cientistas políticos, os famosos especialistas que os jornais procuram para explicar à massa incauta o que está acontecendo.

Cientistas políticos são, no geral, pessoas muito inteligentes e preparadas, mas que possuem algumas peculiaridades. Alguns cientistas políticos não gostam muito de gente, dessa coisa de eu, você, tia Maria e tio João. Eles preferem usar “classes”. Para eles, quando essas classes brigam é que a história anda. Então, quando tem bastante gente brigando, como agora, os cientistas políticos ficam ouriçados. Eles tentam fazer a realidade caber certinho na teoria. O problema é quem nem sempre cabe.

Quer um exemplo? Um professor de filosofia, cheio de títulos, fez uma coluna em que promulga uma espécie de decreto moral sobre a vida dos brasileiros. Segundo ele, fica proibido, a partir do final do segundo turno, que possamos conviver com gente que votou de maneira contrária a nossa. Vale para a família e vale para os amigos, não tem conversa. A tia Maria, aquela das postagens vexatórias no facebook, tem de cortar relações com aquele outro tio, cabeludo, fã do Chico Buarque. Uma pena porque os dois sempre se deram tão bem. Falavam mal dos outros parentes no telefone e o tio sempre tirava uma soneca no sofá da casa da tia depois do almoço de domingo. Mas agora não tem mais jeito.

As “placas tectônicas se moveram”, vocês sabem como é. Teremos de desmarcar a festa de Natal.

Outro dos cientistas, também laureado, disse que os eleitores do Aécio que dirigem carros grandes tomaram o lugar dos militares nos seus tanques?!?! Sei que é difícil entender, mas parece que é o seguinte: Você, que botou um adesivo do candidato tucano e dirige uma Duster parcelada em sei lá quantas prestações, é, na verdade, uma espécie de reencarnação do general Olímpio Mourão Filho, que desencadeou o golpe de 64. Organize sua tropa e marche para tomar a Guanabara! O professor não terminou a análise, mas, pela lógica, imaginamos que se você tem uma EcoSport e colocou um adesivo da Dilma, transforma-se automaticamente no general Assis Brasil. Bote esse dispositivo militar legalista pra funcionar!

Há besteiras para todos os gostos, inclusive essas, ditas pelos nossos acadêmicos. Nesse grande expurgo democrático, vamos rir também dos cientistas políticos, não só da tia Maria. Eles também merecem.

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