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O livro perdido e a magia da poesia
| Foto:
Joakim Buchwald / Sxc.Hu
Poesia…

O último dia 14 foi Dia Nacional da Poesia. Valeu a comemoração. Mas todo dia é dia de poesia, não é, Dona Maria? E nem precisa da rima, não é, Dona Julieta? Todo dia é dia de poesia – mesmo os dias cheios de problemas rendem versos e poemas. Por falar nisso…

Dia desses, fuçando em um baú de tesouros pessoais, voltei no tempo ao esbarrar em um livrinho mágico, feito à mão. Numa etiqueta colada à capa de cartolina revestida de papel aveludado, escrito com letra de professora, destaca-se o título da obra: “Livro de poemas – Vinícius – 3ª Série – Profª Eliane Hungaro – 1991”. Confesso que tenho apenas uma vaga lembrança da professora Eliane – nem recordo se a chamava de “profe” ou de “tia”. Mas nunca me esqueci do primeiro poema que escrevi (talvez o primeiro digno, ou não tão indigno, de alguma lembrança), cumprindo uma tarefa passada pela professora. Eu tinha oito ou nove anos, provavelmente nove, já que sou nascido em maio e o poema trata da Independência do Brasil. Desde então, sempre tive o poeminha, intitulado “Pátria amada, Brasil”, na ponta da língua:

“Ó pátria amada,
que por D. Pedro I,
no dia 7 de setembro,
teve sua independência proclamada.
E que ainda é amada.
Mesmo com suas crises,
continua idolatrada.
Salve, salve, meu Brasil,
que tem o céu cor de anil.
A mesma cor tinha a espada varonil,
que cometeu tal ato, tão nobre,
a Independência do Brasil.”

Como se lê, por certo não foi a qualidade do material que me estimulou a memorizar o poema. Nem foi o ufanismo inocente, que eu já deixava àquela época – o “mesmo com suas crises, continua idolatrada” logo virou “você tem tantas crises que deveria ser internada”. Também não ponho a culpa pela lembrança na minha habilidade para decorar, que só foi boa naqueles tempos de catequese, de muito Creio e Salve Rainha. Na realidade, os versinhos nunca saíram da minha cabeça porque eu me encantei pela possibilidade de poetizar a vida. Mesmo que eu não tenha evoluído muito (como poeta, hoje não me distancio tanto do piá do primário que rimava Brasil com anil), o despertar para a poesia, para o olhar poético, foi fundamental. Devo isso à professora Eliane, que reuniu os poemas (entre eles, o meu) da turma da 3ª Série do Colégio Marista de Cascavel, de 1991, no tal livro que encontrei. Com o capricho da boa professora, ela datilografou os poemas e montou os livrinhos, um para cada aluno, prendendo as páginas com um laço de fita. Com a própria obra-prima “publicada” em livro, que guri não se encantaria? Encantamento. Eureca! Coisa de criança. Coisa de poeta.

Aliás, já que foi (é e sempre será) dia de poesia, quero melhorar a qualidade do produto para a freguesia. Vamos de “Os poemas”, de Mário Quintana.

“Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti…”

E já que o Dia Nacional da Poesia é uma homenagem ao nascimento do poeta Castro Alves (em 14 de março de 1847), encerro com um trecho de uma obra dele, “Sub Tegmine Fagi”:

“Amigo! O campo é o ninho do poeta…
Deus fala, quando a turba está quieta,
Às campinas em flor.
— Noivo — Ele espera que os convivas saiam…
E n’alcova onde as lâmpadas desmaiam
Então murmura — amor —

Vem comigo cismar risonho e grave…
A poesia — é uma luz… e alma — uma ave…
Querem — trevas e ar.
A andorinha, que é a alma — pede o campo
A poesia quer sombra — é o pirilampo…
Pra voar… pra brilhar.”

***

P.S.: Para abrir o livrinho da nossa turminha, a professora Eliane escolheu um poema intitulado “Minha Professora”, de um colega meu chamado Rafael. Começa assim: “Tia Eliane, minha querida, Tu és parecida com uma margarida. Ou serás com uma rosa? Uma rosa milagrosa.” E seguia: “Eliane tu és bela, bela como a Cinderela”. Adiante: “Eliane é nossa paixão, uma paixão do fundo do coração. Eliane, uma mensagem, para o Céu já tem uma passagem”. Como escrevi, não me lembro se ela era parecida com uma margarida ou com uma rosa, mas, só por nos ter aberto as portas da poesia, merece a passagem para o Céu.

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