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(Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo)
(Foto: Jonathan Campos / Gazeta do Povo)| Foto:

A centralidade que a Tecnologia da Informação adquiriu em nossas vidas nas últimas duas décadas teve impactos óbvios sobre a educação. A expansão da educação a distância, o uso de plataformas e dispositivos computacionais e a geração de grandes volumes de informação referentes aos estudantes, escolas e sistemas de ensino são alguns dos aspectos mais notáveis desse impacto, e seus resultados ainda precisam ser mais bem compreendidos.

Este último aspecto citado – a criação de dados massivos, ou big data – é talvez o mais fascinante e obscuro para nós, sejamos professores ou alunos. O potencial que o big data têm sobre a educação é apontado por especialistas de várias áreas, e principalmente naqueles ligados ao universo da TI o entusiasmo é compreensível, ainda que por vezes desmesurado. Como exemplo, um artigo recente publicado no Mashable destaca a entrada dos sistemas educacionais no ecossistema de informação e alguns dos efeitos práticos disso, traduzidos em novas técnicas, ferramentas de pontuação e classificação em testes, na personalização e adaptação da aprendizagem individual e no gerenciamento de problemas acadêmicos tais como o plágio.

Subjacente à análise, como é comum no caso, reside a premissa que a informática alterou de maneira indelével a forma como o ser humano pensa – o que acho, no mínimo, questionável. Tais caminhos, na visão seus entusiastas, poderiam deitar por terra os modelos padronizados e despertar a criatividade, num processo de “libertação” em busca “daquilo que realmente importa” dentro da escola.

Na mesma linha, imagina-se que o uso de big data no espaço de aprendizagem online dará às instituições as ferramentas de previsão que precisam para aprimorar os resultados de aprendizagem para os alunos individualmente.  Nessa visão, a educação online em geral e os MOOCs (cursos online abertos e massivos, na sigla em inglês) em particular seriam um passo evolucionário no desenvolvimento da educação, por apenas transmitirem informação de maneira mais eficaz e abrangente; já o big data teria efeito revolucionário por não apenas transmitir informação, mas por ser capaz de ensinar com base nos nossos comportamentos e cliques – assim como os anúncios do Facebook e do Google que estão à sua volta.

Algumas das técnicas e princípios mais importantes da relação entre Big Data e educação podem ser encontradas num MOOC da Universidade de Columbia. Lá podemos ter uma ideia da abrangência e do impacto que o uso dos megadados pode ter no sistema educacional como um todo e em cada aluno em particular.

O cenário dos sistemas educacionais, especialmente na faixa etária do ensino médio, não é animador. Tanto aqui como nos EUA os adolescentes insistem em largar a escola numa proporção muito maior que nos demais níveis de ensino, e isso deve ter relação com o fato da escola, em geral, parecer muito chata para essa geração. O big data poderia, nesse cenário e na visão de seus entusiastas, prever os fracassos e incorporar novas dinâmicas ao aprendizado que contornassem os obstáculos de cada indivíduo, numa espécie de alfaiataria educacional baseada em dados.

Um detalhe que obviamente escapa aos arautos da revolução é que o uso e o acesso ao big data tem custos, e esses não são insignificantes. Dadas as carências estruturais que vemos na maior parte das instituições de ensino (e atenho-me ao Brasil para fazer essa constatação), é difícil imaginar que outros além das grandes corporações tenham capacidade de usar ferramentas de big data.

Se imaginarmos, num futuro distópico, que o big data irá, a exemplo dos anúncios do Facebook, ‘personalizar’ nossa experiência de aprendizado, legando a um conjunto de algoritmos os conteúdos, abordagens e ferramentas a que cada aluno será exposto, podemos igualmente vislumbrar a adoção de categorias e padrões pré-determinados nos quais os alunos serão enquadrados – com todos os perigos que a previsão do “fracasso” e do “sucesso” implicam.

O fascínio com a tecnologia é geralmente acompanhado do temor acerca de seus efeitos, e na relação big data – educação esse binômio não desaparece: em que medida um ensino assim customizado, baseado em cliques e testes padronizados, serve a uma educação que vise emancipar a humanidade de seus fantasmas? Não estaríamos, ao tomar cada aluno como um conjunto de bits, relegando à educação uma função absolutamente narcisista e individualista, esquecendo que é na escola que depositamos, como sociedade, a esperança nas mudanças de longo prazo? Em suma, não seria o big data mais uma ferramenta à serviço do status quo e das grandes desigualdades observadas na educação em todo o mundo?

>>Christiano Ferreira é historiador e atua há mais de 10 anos no Ensino Básico e Superior como docente e gestor educacional. Atualmente coordena o Projeto Tetear, da Parabolé Educação e Cultura, que leva oficinas de arte e educação para crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social na Região Metropolitana de Curitiba. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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