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(Foto: Divulgação/Gazeta do Povo)
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Curitiba alcançou em 2014 a incrível marca de um milhão de motoristas habilitados e mais de um milhão e trezentos mil veículos registrados, conforme a Gazeta do Povo noticiou em edição de abril daquele ano. Os recordes de emplacamento e habilitações produziram, além dos efeitos visíveis sobre as cidades e a vida cotidiana, uma máquina de arrecadação para a União, os governos estaduais e as prefeituras.

Para se ter uma ideia da dimensão dos recursos que as multas geram ao poder público, apenas a cidade de São Paulo arrecadou, no ano passado, mais de R$800 milhões de reais em radares, pardais e fiscalização nas ruas. Na Lei Orçamentária Anual de Curitiba aprovada para o mesmo período, a previsão de arrecadação daquilo que é competência do município era de R$53 milhões de reais. Não encontrei números para a arrecadação conjunta de todos os entes da Federação, mas podemos imaginar que não sejam modestos.

O aumento da fiscalização, ou melhor, da eficácia na aplicação da multa não significou, infelizmente, a superação de problemas crônicos relacionados ao trânsito e a segurança nas ruas e estradas. Segundo informa o Mapa da Violência 2014 que analisa dados, sobre mortalidade, gerados pelo Ministério da Saúde no ano-base 2012, morreram naquele ano mais de 46 mil pessoas em acidentes de transporte no país, uma variação positiva de 3,4% em relação a 2011 e de 38,3% em dez anos. Em termos internacionais, somos o 4º país com mais mortes (em números absolutos) no mundo, ficando atrás apenas de China, Índia e Nigéria.

Ou seja, nosso ciclo recente foi de mais carros e motoristas, mais multas nos cofres dos governos e mais mortos e feridos no trânsito. E, ao que parece, ninguém está preocupado com isso. As razões do problema certamente são múltiplas e as soluções invariavelmente não são fáceis, mas a sempre alegada “falta de recursos” para ações mais contundentes de prevenção não pode ser usada como desculpa.

O Código de Trânsito Brasileiro prevê que 5% do total arrecadado com multas seja destinado a um fundo de educação e segurança no trânsito. Além disso, o CTB dedica todo um capítulo à educação, no qual se combinam belas intenções (tais como a articulação do MEC, Detrans e escolas na elaboração de conteúdos específicos de trânsito), um pouco de letra morta (a obrigatoriedade de toda propaganda à beira das estradas conter material educativo) e, é claro, as fontes de recursos. O denominador comum aos elementos da lei é uma visão publicitária da educação, como se campanhas episódicas pudessem, por elas mesmas, alterar um comportamento coletivo assustador, que é o do brasileiro ao volante.

Pensemos nos momentos de formação do motorista, que é a autoescola, e de habilitação formal à direção, que é o teste do Detran. Tanto num como noutro o que se vê é um conjunto de macetes e decorebas, pelos quais se paga caro e que, por não educarem, cospem nas ruas centenas de motoristas despreparados a cada dia. O neófito passa no teste, compra seu carrinho e é jogado na Linha Verde, às 18 horas, com chuva, em dia de greve de ônibus. Ou na descida da serra para Joinville, no meio das carretas. O resultado? As cifras do Mapa da Violência e as histórias que vemos diariamente na imprensa.

A obrigatoriedade da realização de ações de educação para o trânsito é o que nos faz ver, de vez em quando, um anúncio pago na TV falando em respeito à vida, cuidado ao volante e outras atitudes. Investimento na formação do motorista, só aquele que eu, você e todo mundo é obrigado a deixar no balcão da autoescola e no guichê de arrecadação do Detran. Da derrama das multas se vê muito pouco revertido em educação nas escolas, na formação de condutores e nas ruas. Faltam ações preventivas, falta coordenação entre as instituições de ensino e o poder público, falta transformar a diminuição da violência no trânsito em prioridade nacional. Só não falta dinheiro.

>>Christiano Ferreira é historiador e atua há mais de 10 anos no Ensino Básico e Superior como docente e gestor educacional. Atualmente coordena o Projeto Tetear, da Parabolé Educação e Cultura, que leva oficinas de arte e educação para crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social na Região Metropolitana de Curitiba. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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