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(Imagem: Divulgação)

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Inspirada por uma das muitas conferências do escritor Mia Couto, resolvi compartilhar algumas ideias com vocês sobre o medo, esse sentimento que nos faz levantar mais muros que pontes, grades no lugar de estradas que nos ligariam uns aos outros. E falar em medo é também nos interrogar sobre o papel da educação na construção do nosso “eu”; e falar da mídia, como perpetuadora e criadora de medos ou oportunidade de novas miradas críticas.

Falar de medo é nos questionar constantemente sobre nossos (pre)conceitos em relação ao que é diferente de nós; nossa incapacidade de aceitar pontos de vista, culturas, hábitos, opiniões, relações que não se enquadram em nosso “mundinho” protegido por ilusões de perfeição; é rasgar a Declaração dos Direitos Humanos, o Estatuto da Criança e do Adolescente e pedir a redução da maioridade penal embalados por discursos de violência proferidos muitas vezes pelos mesmos causadores dessa violência e por aqueles que vão lucrar com ela.

Falar sobre medo é também perceber que muitas vezes não temos uma postura crítica em relação aos meios de comunicação, engolindo goela abaixo todas as mensagens recebidas diariamente em forma de notícias sensacionalistas ou publicidade de alarmes de carro e seguros de vida para o nosso mundo ficar melhor. Falar de políticas públicas de qualidade em educação, saúde, lazer, etc não está em questão entre os medrosos, porque é preciso coragem para sair da zona de conforto do “mimimi” e lutar não por você, mas por todos.

Os que sentem mais medo do que indignação, defendem mais polícia, mais cadeia e até a volta dos militares e a suspensão temporária da cidadania, porque já não conseguem pensar por eles próprios e precisam de “pseudo-salvadores”. Por isso escutamos vozes cada vez mais extremistas, conservadoras e reacionárias ocupando lugares políticos de destaque em todo o mundo e oferecendo-se para defender os tais “valores tradicionais” dos quais muitos dizem sentir falta.  O que não costumamos nos perguntar é: Quem ganha com esse radicalismo?

Em meio à crise econômica mundial não parece que as indústrias bélicas, por exemplo, estejam falindo. Talvez o contrário. Talvez se produzam mais armas do que nunca, porque há mais fantasmas e um mal irremediável e invisível a ser combatido. E esse mal normalmente tem cor (negra), localização geográfica (oriente) e classe social (pobres).

“Para fabricar armas é preciso fabricar inimigos; para produzir inimigos é imperioso sustentar fantasmas” (Mia Couto)

Onde fica a ética quando falamos sobre o medo?

Qual o papel da educação quando nos referimos a medo de violência?

Onde estão as políticas públicas de Educomunicação para a formação de cidadãos que tenham uma postura mais crítica e criativa diante das mensagens do mundo, e que compreendam a informação/comunicação como um direito humano capaz de transformar vidas, histórias e realidades?

Enquanto combatermos só as consequências de um mundo corrupto, sem educação de qualidade voltada à formação de cidadãos, sem direitos garantidos na prática e não apenas em folhas de papel, estaremos perdendo a oportunidade de entrar para a História como uma geração que mudou a realidade a partir das lutas por seus direitos, e não se deixou vencer pelo medo.

Numa conferência sobre segurança, Mia Couto destacou que provavelmente morreram mais chineses a construir a Muralha da China do que propriamente pelas invasões das quais ela deveria protegê-los. Sendo um Patrimônio Mundial e considerada uma das Sete Maravilhas do mundo, a muralha na verdade pode ser considerada um monumento ao medo. Vários trabalhadores que morreram em sua construção foram emparedados lá mesmo: corpos, tijolos, pedras, cal…. corpos que se converteram em muros e nos lembram de forma metafórica que o medo pode nos aprisionar dependendo da maneira como lidamos com ele.

Como reflexão, sugiro algumas questões:

Como você tem trabalhado seus medos?

De que maneira educadores podem discutir o medo nas escolas?

Estamos educando nossos filhos tendo como horizonte os Direitos Humanos e o respeito ao Outro-Sujeito de direitos igual a nós?

“Há muros que separam nações, muros que dividem pobres e ricos, mas não há hoje no mundo muro que separe os que têm medo dos que não possuem”. (Mia Couto)

* Cristiane Parente de Sá Barreto é Jornalista, Educomunicadora, Sócia-Fundadora da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação (ABPEducom), Doutoranda em Comunicação e Pesquisadora do Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade – CECS da Universidade do Minho, Mestre em Educação pela UnB e em Mídia e Educação pela Universidad Autónoma de Barcelona.. A profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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