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No último dia 13 de abril, a literatura perdeu mais um grande nome. Morreu o jornalista, escritor e pensador uruguaio, referência na Esquerda latino-americana, Eduardo Galeano. Muito conhecido por sua obra “Veias Abertas da América Latina”, na qual faz uma análise da história da América Latina, Galeano também conseguia com maestria aventurar-se pelas crônicas futebolísticas, como mostra “O futebol de sol à sombra”, que uniu sua paixão por futebol e o jornalismo. Para os “não iniciados” no autor, sempre gostei de recomendar “O Livro dos Abraços”, uma obra carregada de poesia em historietas e pequenas crônicas cotidianas presenteadas ao leitor por Galeano.

São histórias que passeiam pelos comportamentos cegos da ditadura, mas que rompem as barreiras do tempo e podem ser vistos até hoje, à singeleza de uma criança que pede ajuda ao pai para olhar o mar, assombrada diante de sua imensidão. Histórias de sonhos, encontros e desencontros, (des)humores, paisagens e personagens da vida cotidiana que passam por nós diariamente e nem nos damos conta. Falta de tempo? De saber olhar o mundo à nossa volta com olhos de ver (de verdade)?

Em “O Livro dos Abraços”, Galeano consegue nos transformar na pequena Lucia, uma leitora de livros escondidos, em “A função do leitor/1:

“Quando Lucia Pelaez era pequena, leu um romance escondida. Leu aos pedaços, noite após noite, ocultando o livro debaixo do travesseiro. Lucia tinha roubado o romance da biblioteca de cedro onde seu tio guardava os livros preferidos. Muito caminhou Lucia enquanto passavam-se os anos. Na busca de fantasmas caminhou pelos rochedos do rio Antióquia, e na busca de gente caminhou pelas ruas das cidades violentas. Muito caminhou Lucia, e ao longo do seu caminhar ia sempre acompanhada pelos ecos daquelas vozes distantes que ela tinha escutado, com seus olhos, na infância. Lucia não tornou a ler aquele livro. Não o reconheceria mais. O livro cresceu tanto dentro dela que agora é outro, agora é dela.”

Para mim, esse talvez seja um dos grandes textos do livro. Porque mostra a todos a grandeza da leitura, palavra em latim que vem da mesma raiz do verbo colher (legere, colegere). Ou seja, a leitura não deixa de ser uma colheita também. Colhemos os melhores frutos, os melhores textos… colhemos os sinais do mundo por onde passamos. É a partir desses sinais que começamos a construir e a representar o mundo para nós. É a partir da leitura de um texto que começamos a criar em nós o nosso livro, com os nossos personagens, nossos cenários, nossos contextos. Mas isso requer tempo. Lentidão. Silêncio… uma certa degustação interior que nem sempre conseguimos ter nas escolas, nos ambientes de trabalho.

Trazer esse texto de Galeano para este espaço hoje foi um motivo para homenageá-lo e também um apelo para que reflitamos sobre o silêncio e sobre o tempo em um mundo onde o barulho, a velocidade, a superficialidade (inclusive nas relações) têm sido cada vez mais comuns. É preciso resgatar o tempo da delicadeza…

*Cristiane Parente de Sá Barreto é pesquisadora em Educação para a Mídia do Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade – CECS, da Universidade do Minho e Sócia-fundadora da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação – ABPEducom. A profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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