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Eu à frente da Orquestra Sinfônica do Paraná  há exatos 30 anos
Eu à frente da Orquestra Sinfônica do Paraná há exatos 30 anos| Foto:
Eu à frente da Orquestra Sinfônica do Paraná  há exatos 30 anos

Eu à frente da Orquestra Sinfônica do Paraná há exatos 30 anos

No dia de hoje a Orquestra Sinfônica do Paraná completa 30 anos. Acho importante dar meu testemunho a respeito de fatos que poucos sabem, e que por muitas vezes escondi dos próprios músicos. Os primeiros tempos da Orquestra Sinfônica do Paraná não foram fáceis. Como a orquestra tinha sido fundada pela Secretaria de Cultura e instalada no Teatro Guaíra havia um certo atrito entre a diretoria do Teatro e a extinta Coordenadoria de ações culturais da Secretaria de Cultura, que era dirigida pela violinista Eleni Betes, a verdadeira idealizadora da orquestra. Eu fui contratado logo após minha aprovação no concurso para maestro, ainda no mês de fevereiro. A contratação dos músicos, no entanto, ficou emperrada por dois meses, e quando todos os aprovados foram contratados o Teatro não ofereceu nada, nem sala, nem cadeiras, nem estantes. Conseguimos um “cantinho” para ensaiar, mas não haviam cadeiras próprias, nem estantes e nem partituras. Um funcionário do DRH, cujo nome prefiro não declinar, disse em segredo para mim que aquilo era proposital, que a ideia da diretoria era de que a Secretaria de Cultura arranjasse um outro lugar para a orquestra. Insistimos, e depois de duas semanas combinamos que cada musico traria sua própria estante. Sem montador arrumamos um canto, montamos sozinhos a orquestra, e fizemos nosso primeiro ensaio em meados do mês de abril.
Muita gente pergunta o porquê de eu ter escolhido uma obra tão pouco conhecida para ser a primeira partitura que a orquestra tocou. Explico: no final de 1984 eu tinha regido em Porto Alegre uma obra raramente executada no Brasil: a Abertura da ópera Anacreón, de Luigi Cherubini. Como por acaso eu ainda tinha em casa as partituras necessárias que usei em Porto Alegre e como o teatro não se mexia para nada, não tive muita escolha: esta seria a obra a ser ensaiada.
Membros da diretoria do Teatro até riam com a nossa teimosia em ensaiar, e foi somente com a pressão do Secretário de Cultura, Fernando Ghignone, que a diretoria, a contragosto, ofereceu uma data que tinha sobrado na agenda: 28 de maio. O êxito da estreia da orquestra calou a boca de muita gente, mas as dificuldades não pararam. Um membro da diretoria tinha conhecimento que os dois primeiros violinistas da orquestra eram adventistas. O que fizeram? A segunda data oferecida, no mês de julho, caia numa sexta-feira de noite, dia normalmente que os adventistas não trabalham. Mesmo com toda a pressão da igreja os dois violinistas, Paulo Torres e Paulo Ângelo Florêncio, tocaram neste concerto. Como não existia verba para solistas Analaura de Souza Pinto, a pianista da orquestra, foi a solista desta segunda apresentação da orquestra. No final do concerto um abraço apertado que recebi do então governador José Richa parecia selar a continuidade da empreitada. Pouco a pouco conseguíamos espaço e projeção. A qualidade era indubitável.
A preparação das obras que eu e o maestro Alceu Bocchino regíamos no início da orquestra era feita com um capricho excepcional. Para o segundo concerto da orquestra foram feitos mais de 25 ensaios para a apresentação da Grande Sinfonia de Schubert, por exemplo. Mesmo com todo este cuidado com uma orquestra em formação a diretoria veio com uma ordem expressa: a orquestra teria que tocar em tempo recorde (5 ensaios) a ópera Fausto de Gounod. Revolta, minha, de Eleni, do maestro Bocchino, mas o que tínhamos a fazer? Numa produção medíocre em todos os aspectos (da direção musical à direção cênica), no segundo semestre daquele primeiro ano eu e a orquestra tivemos que engolir um enorme sapo. Não foi nem o primeiro e nem o último. Mas, sobrevivemos.
Como a orquestra era pequena, tinha apenas 57 músicos, tivemos que pesquisar um repertório variado para um grupo tão reduzido. Lembro que tínhamos apenas duas trompas (aliás excelentes) e queríamos fazer uma sinfonia romântica. As únicas sinfonias românticas que solicitam a participação de apenas duas trompas são a “Italiana” de Mendelssohn e a Segunda de Schumann. Resultado: este foi nosso repertório no início, uma era de lutas, mas que resultaram em algo positivo: Curitiba ganhava uma orquestra sinfônica profissional. Em tempo, lembro que hoje em dia, felizmente, a atual diretoria do Teatro apoia, dentro de suas limitações orçamentárias, as temporadas e a própria existência da orquestra.
Que este texto sirva de testemunho de alguém que viveu este período tão atribulado. Penso até em escrever um livro sobre os meus 30 anos de Curitiba. Apenas planos…

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