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(Imagem: Acervo)

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É comum ouvirmos murmúrios de lamentação em tempos de crise. É ainda mais comum ouvirmos chavões travestidos de expressões eloqüentes que têm a pretensão de justificar tudo e proclamar, numa única frase, a panaceia de todos os males. Costuma-se então destacar que “é nos tempos de crise que surgem as grandes oportunidades”.

De fato, as oscilações econômicas são absolutamente comuns em mercados cada vez mais interconectados; de fato, as crises econômicas podem efetivamente servir de estopim para a criação de novas oportunidades para empreendedores e para o surgimento de movimentos de inovação tecnológica, comumente voltados à expansão de nichos de mercados já existentes ou à instauração de novos consumidores, efetivos ou potenciais.

Mas, as crises podem implicar também momentos de reflexão interior visando a modificar velhos paradigmas, postura normalmente inviável ou impraticável diante da correria do dia a dia. Nesse sentido, uma detida análise sobre as causas dos movimentos de distúrbio micro e macroeconômico também pode tornar-se uma boa oportunidade para repensar o futuro, mantendo os trunfos do que deu certo e alterando as premissas do que não deu.

Este momento de reflexão deve ser útil para criar alternativas em meio à crise, para repensar modelos a fim de que se possam manter saudáveis e equilibrados os níveis de troca de bens de consumo e de serviços, especialmente os voltados à satisfação de necessidades básicas dos cidadãos. Partindo-se do pressuposto de que algumas de nossas carências mais sensíveis para concretização do bem-estar pessoal não podem simplesmente ser suprimidas de uma hora para outra, devem-se criar e impulsionar novos meios para promoção da qualidade de vida das pessoas, que possam efetivamente ser capazes de transformar os rumos da sociedade e da própria economia envolta em crise. É justamente essa a ideia por trás do chamado consumo cooperativo.

A concepção de cooperação está vinculada à realização de ações conjuntas e interligadas dirigidas não unicamente à obtenção de benefícios puramente individuais, mas diretamente ligadas à promoção de maior bem-estar coletivo. Assim, consumir cooperativamente pressupõe a adoção de um conjunto de intermediações de trocas de produtos, que, de um lado, não detêm mais utilidade real ao atual titular, mas, de outro, podem ser úteis a inúmeras pessoas que fazem parte da rede de intercomunicação para permutas. Há uma premissa básica que é a de idealizar a satisfação mútua dos envolvidos a partir de atos que têm essa finalidade precípua: a de gerar benefícios a todos os partícipes do processo de trocas.

Segundo ponderou a australiana Rachel Botsman, existem quatro pontos-chave para o fortalecimento do consumo cooperativo: a crença renovada na importância da comunidade; uma torrente de redes sociais e tecnologias em tempo real; preocupações ambientais não resolvidas; e a recessão global que chocou os comportamentos de consumo.

Por conta disso, o sistema se apoia também em três pilares intercomunicativos: mercados de redistribuições (no qual o produto usado é retirado de um lugar onde ele não é necessário e levado para um lugar onde é), visando ao prolongamento do ciclo de vida do produto e à redução do lixo; estilos de vida cooperativos, no qual as pessoas podem compartilhar recursos entre si (dinheiro, habilidades e tempo); e sistema de serviços de produtos, a partir do qual a pessoa paga pelo benefício que o uso do produto traz sem pagar pelo bem em si.

As redes nas quais ocorrem as trocas são chamadas de swap trading. Trata-se de locais virtuais que promovem encontros de pessoas desconhecidas entre si, viabilizando a verificação e a identificação de interesses, a fim de possibilitar o intercâmbio direto e voluntário dos bens, reinserindo os produtos no mercado sustentável gerador de utilidades coletivas e retirando o intermediário monetário da troca, se resumindo basicamente pelo contato pessoa para pessoa.

Há uma modificação de percepção sobre o interesse que desperta na aquisição de um produto: altera-se a ideia de obtenção da propriedade da coisa para fixar-se nos benefícios que o bem irá gerar. A obtenção de produtos se dá pela sua funcionalidade e não pela sua natureza. Em verdade, compra-se uma furadeira ou um DVD justamente pela função que estes bens possuem em determinadas ocasiões e pela necessidade que se tem em utilizá-los para exercer específicas ações (conserto ou entretenimento). Com esta visão, a maior mudança de paradigma em relações comuns de trocas não está apenas na cooperação entre as pessoas, mas diretamente na base em torno da qual se sustenta o sistema: a confiança, antes depositada na capacidade financeira dos agentes econômicos, agora é avaliada a partir da reputação nas operações de trocas de acordo com o rastro de asserção que os sujeitos operadores do sistema de compartilhamento deixam na web.

Por tais razões, para Botsman o “consumo colaborativo não é um nicho de tendência; é uma onda socioeconômica que irá transformar a forma como as empresas pensam sobre suas proposições e valorizar a forma como as pessoas cumpram as suas necessidades”. Em outras palavras, em momentos de depressão econômica e carência de capacidade financeira das pessoas, o consumo colaborativo pode ser a moeda do futuro.

*Artigo escrito por Antonio Augusto Cruz Porto, mestre em Direito Econômico e Socioambiental/PUCPR, advogado e professor da Universidade Tuiuti do Paraná-UTP, e Cibele Merlin Torres, mestre em Direitos Fundamentais e Democracia/Unibrasil, advogada e gerente do Núcleo de Concursos da PUCPR, associados do Sindicato das Escolas Particulares do Paraná (Sinepe/PR). O SINEPE é colaborador voluntário do Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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