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Sobre a relevância dos departamentos de música em Curitiba
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Não temos na cidade um departamento de música significativo no meio acadêmico brasileiro.

Eu escrevi a frase acima num dos últimos textos que publiquei aqui no blog:

Curitiba pode ter música popular?

Era um texto comentando a absurda ação da polícia contra os foliões que curtiam o prá-carnaval do bloco Garibaldis e sacis. O contexto geral da frase acima era mais ou menos o de dizer que Curitiba já não é um polo de música clássica, e que deveria aceitar o fato de que está assumindo alguma importância na música popular.

Logo depois que publiquei o texto, a frase citada foi motivo de uma interessante conversa com o prof. Álvaro Carlini, que questionou minha afirmação, e levantou algumas questões sobre a relevância do curso de música da UFPR.

Desde então, fiquei devendo um texto sobre o assunto, que tratasse a questão com a produndidade que ela merece. Como o tempo para uma reflexão aprofundada nunca chega (como se pode perceber pela demora de mais de 3 meses para voltar ao tema), acabo fazendo mais um texto geralzão mesmo.

Mas ao menos espero esclarecer um pouco melhor o que penso sobre a questão, aproveitando para fazer uma análise geral da situação da música na academia em Curitiba.

Hoje temos 4 Instituições Ensino Superior que oferecem cursos de música em Curitiba: PUC-PR, UFPR, EMBAP e FAP.

O curso da PUC ainda é muito recente para ser avaliado. Entretanto, vários fatores apontam para limitações sérias da música como Departamento Acadêmico na instituição.

Em primeiro lugar, a PUC, apesar de ser uma instituição comunitária e confessional, tem comportamento de Instituição Privada. Ou seja, as limitações para se construir um departamento de música academicamente significativo estão todas atreladas a uma questão básica: não é interessante manter um curso cujas despesas não sejam pagas pelas mensalidades dos alunos.

A possibilidade de que um curso de música se pague por esta contabilidade simplória são absolutamente nulas.

Ou seja, o curso da PUC esbarra na limitação de ter de atrair alunos capazes de pagar mensalidade, ao mesmo tempo que as instituições públicas da cidade oferecem outros 7 cursos de graduação em música gratuitos para o aluno.

Nenhuma possibilidade de se construir um departamento universitário relevante por esta via.

Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
Embap: perplexidade diante do resultado do Índice Geral de Cursos do MEC

A EMBAP oferece três cursos de música, além de cursos enventuais de pós-graduação lato sensu.

A grande limitação da EMBAP é que ela se estrutura como conservatório, e não como departamento universitário. Os cursos de Licenciatura em Música, Bacharelado em Instrumento e Bacharelado em Composição e Regência contam com um bom corpo de professores de instrumento. A EMBAP possui também um importante setor de atendimento à comunidade com os cursos de extensão, já muito tradicionais.

Ou seja, a EMBAP é o principal centro de formação de instrumentistas, cantores e regentes em Curitiba. Ali estão os melhores professores de instrumento e canto da cidade.

Mas a EMBAP não tem estrutura de pesquisa universitária, tem um corpo docente bem grande mas de pouca titulação, pouca produção científica e pouca articulação com outros departamentos universitários, agências de fomento, etc.

A FAP vive situação semelhante à EMBAP em certo aspecto. Ambas são faculdades isoladas (no sentido de não pertencentes a uma universidade) mantidas pelo governo do estado.

Esta limitação impõe diversas questões que são impossíveis de superar neste status. A FAP tem situação semelhante à EMBAP, com um agravante: possui um quarto dos professores na área de música. Ou seja, a FAP é como a EMBAP sem os professores de instrumento.

A principal diferença é que a FAP se beneficia da sua maior diversidade de cursos. Enquanto a EMBAP possui apenas as áreas de música e artes visuais (desenho, pintura, escultura e gravura), a FAP tem cursos nas áreas de Teatro, Dança, Artes Visuais, Musicoterapia e Cinema.

Na área de música são dois cursos: Licenciatura em Música e Bacharelado em Música Popular.

A exsitência de uma gama maior de cursos fez a FAP se parecer mais com o ambiente acadêmico universitário, principalmente pelo fato de existirem um núcleo comum de disciplinas de Ciências Humanas e Educação.

Isso levou a FAP a constituir alguma tradição em Iniciação Científica, além de ter um corpo de professores cuja titulação e produção é crescente, apesar de ainda baixa.

As limitações dos cursos de música são dadas pelo número reduzido de professores, e pela impossibilidade de contratações, bloqueadas por uma visão curta do governo do estado.

Boa parte das limitações descritas a respeito de FAP e EMBAP tem perspectiva de superação a médio prazo. Porque hoje existe uma perspectiva de que as duas instituições irão se fundir num Capus único na capital, integrando a UNESPAR, uma nova Universidade estadual multi-campi que já tem processo tramitando no Conselho Estadual de Educação.

Quanto a estas três instituições, creio não haver possibilidade de dúvida quando afirmo que não são departamentos acadêmicos significativos no meio brasileiro.

Resta o caso da UFPR, cujos cursos de música mantidos pelo DEARTES são efetivamente um departamento universitário.

A UFPR tem os cursos de graduação de Licenciatura em Educação Musical e Bacharelado em Produção Sonora. Além do Mestrado em Música.

O site do Departamento só informa o corpo docente do mestrado, constiuído de 12 professores, dos quais um é visitante de outra instituição. Pelo que sei, a graduação tem mais um professor que acaba de retornar de um doutorado na Inglaterra.

Ou seja, os cursos de música da UFPR contam com 12 professores, todos doutores e com significativa produção científica, bem como uma razoável interlocução com outros departamentos universitários nacionais e internacionais.

Que o setor de música do DEARTES UFPR é um departamento universitário de qualidade, não resta dúvida. Fica então a questão de saber se o departamento é “significativo no meio acadêmico brasileiro”.

Isso poderia ser pensado sobre diversos aspectos. Se interpretarmos o conceito de “meio acadêmico brasileiro” como envolvendo apenas os departamentos de música existentes no Brasil, poderíamos entender que o DEARTES/UFPR é sim significativo.

Os professores produzem. Há um mestrado. O Departamento já organizou 5 Simpósios de Pesquisa de abrangência nacional (o último tem o anais aqui). Alguns membros do departamento mantém significativa participação nas atividades da Associação Brasileira da Cognição e Artes Musicais. O Departamento também mantém a Revista Música em Perspectiva, que tem Qualis B2 – o que não é ruim na área de música.

As limitações do Departamento se devem principalmente a duas questões: primeiro, é um departamento muito pequeno. Não sei como é possível manter duas graduações e um mestrado com apenas 12 professores. Acredito que a força política da área de música dentro da Universidade limita a possibilidade de alguma expansão – ou seja, isso aí corrobora um pouco o que estou dizendo: nossa cidade (e nossa Universidade Federal) não dão muito valor à área de música.

A outra questão é que o departamento é muito recente, a maioria dos professores estão lotados ali há não mais que 10 anos. O curso de mestrado foi aberto há pouco tempo, e a primeira avaliação trienal que recebeu da CAPES (2007-2009) o colocu com o conceito 4.

Foi uma melhora em relação ao conceito 3 aplicado na avaliação inicial da proposta do curso. Mas ainda é pouco para dizer que o departamento é relevante nacionalmente. Quando esta nota subir mais um pouco, e o departamento tiver autorização para ofertar também um doutorado, as coisas começarão a mudar de figura. Embora seja bem difícil fazer este up-grade com apenas 12 docentes.

Outros aspectos para pensar a relevância entre os departamentos de música do Brasil: a inserção dos professores do DEARTES/UFPR em órgãos associativos da área como a ABEM, a ANPPOM, as comissões de área do MEC e da CAPES, entre outras.

E se pensarmos a coisa de um modo um pouco mais amplo? Ou seja, pensemos o conceito de “meio acadêmico brasileiro” como não restrito à área de música.

Aí, o quadro é desesperador.

A área de música é uma área recente e pouco relevante no cenário acadêmico nacional. O Departamento de Música da UFPR não está entre os principais da área de música, fica ainda pior se pensarmos a questão de forma abrangente.

Ou seja, no frigir dos ovos, e sem querer simplificar demais as coisas, acho que minha afirmação se sustenta.

A música em Curitiba vive uma situação de perda de status. A cidade já foi um polo relevante, e aliás, o prof. Alvaro Carlini é o pesquisador que vem mapeando esses momentos históricos, investigando o trabalho de várias pessoas e instituições importantes do passado musical da cidade.

Hoje Curitiba vive uma situação de perda relativa de status, em comparação com meios musicais muito mais dinâmicos como os de Porto Alegre (a UFRGS tem o único departamento de música com avaliação máxima pela CAPES – conceito 7), São Paulo (OSESP e vida de concertos em geral, mas não os departamentos universitários), Rio de Janeiro, Campinas (a UNICAMP é um polo), Belo Horizonte (tanto a EM-UFMG como a Filarmônica de Minas Gerais), Goiânia (a UFGO está em franca ascensão), Salvador (especialmente o Neojibá).

A questão da relevância dos nossos departamentos universitários de música é uma questão menor. A questão é que Curitiba como um todo está perdendo significativamente o posto de cidade dinâmica e polo em ascenção. Nossa vida cultural não pode mais ser vista como um exemplo para o Brasil.

Curitiba está ficando velha, conservadora e acomodada.

Teremos força para reverter este este quadro?

Espero que sim. O primeiro passo é ter a consciência dos nossos problemas. Se continuarmos acreditando no velho mito da cidade modelo, e não trabalharmos duro para construirmos avanços significativos, ficamos para trás. Por que os outros estão se mexendo. E rápido.

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