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URBS sabota sistema de ônibus curitibano
| Foto:
Alexandre Costa Nascimento/Ir e Vir de Bike
Publicidade na frota de táxis de Curitiba estimula a troca do transporte público pelo veículo individual motorizado

Táxis da frota de Curitiba estão circulando pelas ruas da cidade exibindo nos vidros traseiros uma campanha publicitária da Volkswagen. O mote de uma das peças é a frase: “Sinta saudades do ônibus”.

Antes de ganhar as ruas, a propaganda foi avaliada e autorizada pela Urbanização de Curitiba S/A (Urbs), empresa responsável pelo sistema de transporte público da capital; o que inclui, claro, os ônibus e os próprios táxis.

A situação é simbólica e beira a piada pronta. Na prática, ela é tão bizarra quanto seria ver um outdoor da Unimed no postinho de saúde do Boa Vista ou a propaganda do grupo Bom Jesus nas creches do Bairro Novo.

A questão não é a propaganda em si. É legítimo que montadoras queiram vender carros e que usem a publicidade como ferramenta para estimular o consumo. Mas que o façam nos meios privados.

O que é incompreensível é essa lógica obtusa em que o próprio poder público, ao invés de estimular o uso do transporte coletivo, acaba incentivando o uso do veículo individual motorizado.

Mais carros nas ruas significa menos passageiros para o sistema público. Perdem os taxistas, perde a própria Urbs e perde toda Curitiba, que fica cada vez mais congestionada.

A decisão também não faz o menor sentido do ponto de vista econômico. Dificilmente a receita financeira com a venda do espaço publicitário cobrirá o prejuízo no longo prazo da perda dos usuários que trocarem o ônibus ou mesmo os táxis por um Gol zero quilômetro.

Marcelo Elias/Gazeta do Povo

Na pior das hipóteses, no futuro, será preciso torrar alguns milhões de reais do dinheiro dos contribuintes em publicidade institucional para tentar convencer o curitibano a trocar seu Gol zero quilômetro pelo ligeirão azul ou pelo novo hibribus.

Aliás, o sistema gerido pela Urbs, que já foi modelo para o mundo, atravessa uma profunda crise. Recentemente a Gazeta do Povo mostrou que o sistema de ônibus curitibano perdeu 14 milhões de usuários em 4 anos.

A capital paranaense foi a única da Região Sul com resultados negativos no período. Em São Paulo, o aumento foi de 105 milhões de usuários (5% em quatro anos). Pensando bem, não é preciso ser um gênio para entender esses números.

Além disso, o sistema está trabalhando no vermelho, já que o preço da passagem é inferior ao valor que seria necessário para cobrir o total de gastos. Em 2012, por exemplo, a tarifa técnica (que equilibra custos e arrecadação) na capital paranaense foi calculada em R$ 2,79, mas a prefeitura decidiu cobrar R$ 2,60 por usuário. O que resulta em um prejuízo de R$ 0,19 por passageiro. Novos reajustes devem ser discutidos apenas após o período eleitoral.

Walter Alves/ Arquivo Gazeta do Povo
Segundo a Urbs, a passagem pode ser reajustada anualmente. Nos últimos dois anos, a correção foi feita em fevereiro

Transparência

Tanto o site da Urbs quanto o portal da transparência Curitiba Aberta não trazem informações detalhadas sobre a receita financeira da Urbs com a venda de espaço publicitário para empresas privadas. No último balanço orçamentário da empresa. há a previsão de R$ 300 mil para divulgação de campanhas governamentais na frota de ônibus.

Um taxista que dirige um dos carros com a publicidade conta que a contratação é feita diretamente nas centrais de rádiotaxi ou na própria Urbs. Ele explica que qualquer peça antes de ser colocada no carro deve ser aprovada pela empresa. Ele não soube informar o custo dessa propaganda para o anunciante mas disse que o adesivo custou R$ 150 e que o permissionário (proprietário da licença do táxi) recebe uma comissão de R$ 150 pela propaganda.

Visões de mundo

Em entrevista publicada no jornal Metro Curitiba em junho, o prefeito de Curitiba, Luciano Ducci (PSB), avaliou como um aspecto positivo o crescimento exponencial da frota da cidade.

“[A frota] aumentou bastante, mas não é um fator negativo, é positivo. Aumentou porque a renda do brasileiro melhorou. A frota em Curitiba é a maior do Brasil. Isso se explica pelos indicadores. Maior diminuição da pobreza e miséria, maior renda média, menor taxa de desemprego, mais serviços públicos”, disse Ducci.

A análise contrasta, por exemplo, com a avaliação do ex-prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa, que em entrevista à Folha de S. Paulo, disse: “A cidade avançada não é aquela em que os pobres andam de carro, mas aquela em que os ricos usam transporte público”. O colombiano defendeu ainda que o poder público dificulte o uso do carro, para devolver a cidade às pessoas. “Quando falamos de cidade sem carros, ou com poucos carros, não estamos falando da ilusão de um hippie louco. Estamos falando de cidades que já existem e que são as mais bem-sucedidas do mundo, como Nova York, Londres, Zurique”.

A avaliação do arquiteto Ítalo Stephan também vai no mesmo sentido: “Quando as condições econômicas são favoráveis, as pessoas logo trocam os seus automóveis por outros mais novos, mais potentes, maiores, imponentes. Se puderem, as famílias compram mais uma moto ou outro automóvel. Todo mundo quer ter um automóvel, já que as condições do transporte coletivos nas nossas cidades são lamentáveis. Caminhar é inseguro. Usar a bicicleta é perigoso. Parece não haver solução embora a velocidade do trânsito já seja parecida com a velocidade de caminhar. Nossas cidades já possuem mais rodas do que pernas. Só que as pernas, bem ou mal, vão continuar a andar e as rodas vão parar de rodar.”

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