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Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Aniele Nascimento/Gazeta do Povo| Foto:

Sem qualquer controle do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os Tribunais de Justiça nos estados regulamentam livremente o pagamento de indenizações e demais penduricalhos. O melhor exemplo disso é o auxílio-alimentação, que varia de R$ 726 no Maranhão até R$ 3 mil para os desembargadores do Amapá – mais de três vezes o valor do salário mínimo.

Dividindo pelos dias úteis do mês, são R$ 138 por dia. Em um ano, R$ 36 mil – mais do que recebeu o senador que mais gastou com alimentação em 2017, Ciro Nogueira (PP-PI), que consumiu R$ 32 mil. Reportagem da Gazeta do Povo mostrou que a verba permitiu o pagamento de refeições em restaurantes luxuosos de Brasília, São Paulo e Teresina.

Os critérios para fixar o valor do benefício passam longe de itens como custo de vida, que é mais baixo nas regiões Norte e Nordeste. Os valores do auxílio-alimentação são elevados também no Acre (R$ 1,4 mil), Roraima (R$ 1,4 mil), Amazonas (R$ 1,6 mil) e Piauí (R$ 1,6 mi). Por outro lado, no estado mais rico do país, São Paulo, o auxílio é de R$ 810. Em Minas Gerais, fica em R$ 884.

Os tribunais dos 26 estados e do Distrito Federal gastam R$ 12,9 milhões por ano com auxílio-alimentação, o que projeta um gasto anual de R$ 155 milhões.

Em alguns estados, a verba para alimentação é reduzida, mas os tribunais compensam com o valor elevado do auxílio-saúde. No Acre, por exemplo, os magistrados recebem R$ 1.447 de auxílio-alimentação e R$ 3.047 de auxílio-saúde. A soma fica próxima da renda líquida do teto salarial da Previdência Social.

No Maranhão, que tem a verba de alimentação mais reduzida, o auxílio-saúde também bate nos R$ 3.047 – o mesmo valor pago aos magistrados de Minas. No Mato Grosso do Sul, os dois benefícios têm o valor de R$ 1.523.

A “simetria constitucional” justifica o penduricalho

Mas os números não são aleatórios. Questionado sobre os critérios para fixar o valor do auxílio-alimentação, o Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) respondeu que o valor corresponde a 10% do subsídio do cargo. Assim, varia de R$ 2.616 a R$ 3.047 no estado.

O valor foi fixado por resolução da presidente do TJAP, Sueli Pereira Pini, considerando que o CNJ, por meio da Resolução 133/2011, reconhece a simetria constitucional entre a magistratura e os membros do Ministério Público.

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A decisão da presidente, assinada em dezembro de 2016, destaca que o auxílio tem caráter indenizatório. Portanto, não sofre a incidência de Imposto de Renda e da contribuição previdenciária. Também não é considerado para o cálculo do teto remuneratório constitucional.

Reportagens da Gazeta do Povo nos últimos meses mostraram casos de juízes que recebem remuneração acima de R$ 200 mil, incluindo todos os penduricalhos, como os pagamentos retroativos. Os valores descontados pelo abate-teto são mínimos.

O auxílio-saúde, fixado também por resolução da presidente do TJAP, é concedido independentemente de comprovação de despesa pelo beneficiário ou de possuir plano de saúde. O valor corresponde a 5% do subsídio da classe a que o magistrado pertence.

Benefício criado por lei estadual

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais informou que o pagamento do auxílio-saúde, no valor de 10% do subsídio mensal, está previsto na Lei de Organização e Divisão Judiciária (LODJ) – uma lei estadual – no artigo 114, inciso XII. O TJMG regulamentou o benefício na Resolução 782/2014.

O auxílio-alimentação também está previsto na LODJ, no artigo 114, inciso XIII. O TJMG regulamentou o benefício na Resolução 702/2012.

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“O valor mensal do auxílio-alimentação foi fixado em R$710 e sofre atualização com base na variação acumulada de índices oficiais, os valores adotados em outros órgãos públicos e a disponibilidade orçamentária e financeira do TJMG”, diz nota do tribunal.

Os tribunais do Acre e Maranhão foram procurados pela reportagem, mas não responderam até a publicação da matéria.

Descontrole preocupa CNJ

Ato administrativo do CNJ assinado em dezembro do ano passado demonstra a preocupação com a falta de padronização na regulamentação de verbas remuneratórios e indenizatórias nos tribunais.

O corregedor nacional de Justiça, João Otávio de Noronha, apontou os motivos desse ato administrativo: a necessidade de padronização e uniformização das remunerações dos magistrados do Judiciário, a disparidade de nomenclaturas das remunerações dos magistrados, a falta de transparência nos portais dos tribunais e a necessidade de atuação do CNJ no controle prévio da remuneração dos magistrados.

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O ato tenta barrar os penduricalhos que elevam a renda de juízes e desembargadores. A decisão diz que o pagamento de qualquer nova verba remuneratória ou indenizatória prevista ou não na Loman, só poderá ser realizado com a aprovação do conselho.

Mas a decisão do CNJ abriu exceção para verbas remuneratórias ou indenizatórias previstas na Resolução do CNJ 133/2011, como auxílio-alimentação, licença para representação de classe, licença remunerada para curso no exterior e indenização de férias não gozadas.

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