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Família normal: quem pode definir?
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Henry Milleo
Alysson tem dois pais. E parece feliz da vida

A recente polêmica a respeito da autorização da Justiça para que dois homens adotassem uma criança – gerada, inclusive, por conta de um artigo publicado neste jornal – fez com que este blog, que defende os direitos da mulher, e por consequência o direito de lésbicas de adotarem crianças, e das mesmas crianças de terem pais ou mães, ou os dois, viesse a público comentar a situação.

Assim como meu colega Rogério Galindo, que publicou um excelente post sobre o assunto, gostaria de analisar os argumentos expostos no texto, e expor meus questionamentos.

O título, que trata da adoção como perversão, não é um contrassenso? Levando-se em conta que a adoção visa ao bem estar dos adotantes e do adotado, e da possibilidade de oferecer à criança um lar, uma família e um suporte financeiro, afetivo, psicológico, moral e social, ao mesmo tempo em que realiza um desejo legítimo — inclusive incentivado pela sociedade (o de ter filhos, e assim perpetuar, se não os seus genes, pelo menos seus ideais e valores)–, como pode ser este ato uma perversão?

Em relação ao bulliyng, também não consigo compreender a lógica do argumento exposto. Se um ato cruel como o bullying acontece, cabe a nós combatê-lo, ou ceder a ele, melindrados? O problema é o ato/situação que causa a discriminação, ou a discriminação em si? Cabe aos homens gays sepultar o sonho de uma família, ou cabe aos pais das demais crianças educar seus filhos para que aceitem o diferente?

Seguindo o raciocínio, deveríamos impedir que casais de cabelos crespos, com tendência à obesidade, à acne ou ruivos tenham filhos? Ou, então, deveríamos incentivá-los a não matricular seus filhos nas escolas, evitando o dissabor de ouvir crueldades das crianças –- que, por sua vez, reproduzem a crueldade que ouvem dos adultos? Cabe à vítima se esconder, ou cabe a quem agride mudar o seu comportamento?

Também me pergunto, numa época em que se discute o conceito de família, o que é de fato uma família normal? Num tempo em que os núcleos familiares se rearranjam, buscando formas de sobreviver e se fortalecer, é válido dizer que as configurações atuais colocam em risco esta instituição? Não seria o contrário? Afinal, se só grupos de pai, mãe e filhos fossem considerados, a família não iria à ruína, já que esta configuração está diminuindo em todo o mundo?

Gostaria de perguntar aos que desmerecem este tipo de família o quão tradicional é a família em que cresceram. Será que não conhecem ou não vivem eles mesmos em uma família onde houve divórcio, morte de um dos genitores, casos de infertilidade? Para essas pessoas, a família deve realmente ter esta definição conservadora? Não é de uma pobreza assustadora?

Por fim, o artigo afirma que não cabe ao Estado incentivar este tipo de situação. Oras, o Estado não está incentivando, apenas faz o que um Estado laico deve fazer: não diz o que é correto ou errado em termos de moral ou costumes. Afinal, se o Estado não pode incentivar, o contrário seria possível, ou seja, ele poderia impedir a formação de uma família? Com que direito e argumento?

O argumento de que, para o bem da criança, é melhor não permitir, é totalmente infundado. O que causa constrangimento e dor não é ser tirado de um abrigo por dois “barbudos”, mas sim ser diminuído por este mesmo fato. Afinal, quantas crianças filhas de pais divorciados nos anos 70 e 80 sofreram muito mais pelo preconceito do que pela separação dos pais em si? Será que, na ânsia de defendermos estas crianças, que precisam mesmo é de uma família, e não da nossa opinião, não estamos, na verdade, ofendendo-as ainda mais, ao dizermos que seus pais são menos pais do que os nossos?

Em tempo: esta é a opinião da blogueira, e não do jornal Gazeta do Povo, que não se responsabiliza nem pela opinião da coluna nem pela opinião do blog. Serve para mostrar que, dentro do veículo, existem diversas opiniões a respeito do assunto, e não apenas aquela manifestada pelo colunista. Comentários são bem-vindos e incentivados, desde que respeitem as regras já expostas no blog.

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