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Texto escrito pela colaboradora do Mulherio, a jornalista Lívia Inácio. Ela é integrante do Coletivo de Jornalistas Feministas Nisia Floresta e autora do blog Rodapé, também na Gazeta do Povo.

Os homens também podem (e devem) ser responsáveis pelo cuidado da casa e das crianças

Os homens também podem (e devem) ser responsáveis pelo cuidado da casa e das crianças

O machismo é uma pedra no sapato do progresso. No campo moral, enquanto ele tira da mulher o direito de ser independente e dona do próprio corpo, lança toda uma responsabilidade sobre os ombros dos homens de maneira cruel. Claro que mais cruel para nós, que ficamos de mãos vazias. Mas para eles, também não é ótimo.

Do pão de cada dia ao cenário político, tudo está a cargo dos senhores. Ou, ao menos, precisa estar. Obrigatoriamente.

Nós, mulheres, somos quem mais perde nesse contexto, sobretudo, porque somos afastadas da esfera pública, que é o espaço mais importante na sociedade quando se fala em reconhecer e exigir direitos. Em lugar disso, somos condenadas ao silêncio solitário da esfera privada.

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Mas, embora o que sofremos e o que os homens sofrem, nem de longe, representem uma simetria, eles não saem ilesos desse processo. Não podem chorar, não podem demonstrar fragilidade, não podem querer se cuidar, e necessitam, a todo tempo, cuspir testosterona em declarações que comprovem: esse aí é homem de verdade.

Parar para se olhar no espelho? Ah, por favor! Vá trabalhar, fazer algo que preste! Quer ir ao médico? Ora, deixe de frescura! Isso é coisa de mulherzinha. Está usando hidratante? Humm.

Aos homens, cabe o dever de ser um porto seguro imperturbável, o braço forte, infalível. Às mulheres, cabe o dever de ser doce, quieta, frágil e submissa, não necessariamente a este ou àquele sujeito, mas a um sistema que também amarra os homens a padrões que eles mesmos estruturaram para nos reduzir.

O machismo é uma perversa via de mão dupla. As limitações que ele nos impõe são bem maiores do que as impostas aos homens, mas a mesma gangorra que concentra de um lado a obrigação feminina de ser “uma mulher digna” mantém na outra ponta o dever masculino de ser “homem que é homem”.

Assim, se estabelece um equilíbrio mentiroso que, cedo ou tarde, revela sua mais traiçoeira face. Mulheres ganham menos em um mercado dominado pelos homens. E os locais que elas ocupam são muitas vezes verdadeiros campos minados de dominação e assédio. A ideia central em que se baseia o domínio está escondida por todos os cantos. Das mais variadas formas.

No mesmo âmbito, homens, se achando donos do sexo oposto, se impõem a ele com violência física ou verbal, assumindo um controle doente sobre aspectos que, no fundo, não lhe dizem respeito.
As mulheres são limitadas a beleza e produto. Os homens são limitados a olhar e desejo (com poder de compra, obviamente).

Essa loucura toda tem muito mais desencadeamentos. E é importante que se conheça a raiz deles antes de querer sair cortando tudo pela superfície. Tanto a violência contra a mulher, por exemplo, quanto a submissão compulsória dos homens à obrigação de ser firme, indestrutível e aprisionado ao dever de ser macho têm um só suporte: o machismo. E é ele que a gente quer combater.

O feminismo não é contra homens, mas contra um esquema que amarra homens e mulheres com um nó na garganta que pode ter nos sufocado durante anos, mas não nos prendeu a voz.

O mundo deve estar nas mãos de todos. Com seus pesos, desafios e prazeres. Sem nenhuma cerca que comprometa o que podemos fazer para melhorá-lo. Porque a gente não quer tudo isso para a gente. Só queremos poder dividir a conta. Da liberdade e do cinema.

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