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O que você vai ver no Festival de Curitiba
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In on It, da Cia. dos Atores, dirigida por Enrique Dias chega ao Festival de Curitiba consagrada.

Hoje escrevo de Belo Horizonte. Vim acompanhar dois dias do festival Verão Arte Contemporânea, o que é muito pouco para uma programação tão cheia de possibilidades. O melhor é que as companhias de teatro que participam são, via de regra, um pessoal novo e, como diz o crítico mineiro Miguel da Anunciação, bastante inquieto. Ontem, vi por indicação dele É Só Uma Formalidade, um trabalho instigante do grupo Quatroloscinco que vai para o Fringe, em março, a convite do Chico Pelúcio, do Galpão. Vou escrever mais sobre a peça aqui mais tarde, mas desde já recomendo.

Falando no Festival de Curitiba, o Caderno G publica na edição deste domingo, com exclusividade, a lista completa da peças da Mostra Contemporânea 2010, já com uma grade de dias, locais e horários dos espetáculos, para começarmos a escolher o que ver.

Minha amiga Fernada Trisotto, a jornalista que me substitui por lá enquanto voo de parapente e derreto trabalhando sob o sol de Matinhos (a temporada de Verão nào acabou ainda), conversou por telefone com a Tânia Brandão, uma das três curadoras da mostra. Nós duas formulamos as perguntas. E Tânia disse duas coisas que me deixaram alerta: Segundo ela, a edição 2010 teria a intenção de dar conta dos opostos tradição e experimentação teatral. A proposta é boa, se der certo, e na lista das peças destaco prontamente o In on It da Cia. dos Atores, um dos grupos mais importantes do país fazendo um teatro de fato contemporâneo. E Memória da Cana, o Newton Moreno reinventando o Álbum de Família do Nelson Rodrigues, outra montagem da qual se falou muito bem ano passado. Dois espetáculos para os quais é bom garantir seu lugar na plateia – e que, se não fosse o festival, tenho minhas dúvidas de que viriam a Curitiba.

O outro ponto, que achei bastante polêmico, é dizer que os curadores não encontraram nenhum espetáculo de fora do Sul e Sudeste com contundência bastante para ser incluído na seleção final. A vitrine do teatro brasileiro só mostra Sul e Sudeste. O país não é maior do que isso? Daqui debaixo temos poucas notícias do que se está fazendo na Bahia, em Recife… e perdemos em março uma chance de tê-las. Mas deixemos que a Tânia Brandão fale por si mesma e explique os caminhos seguidos pra compor a programação 2010:

PERGUNTA – Quais foram os critérios? Essa edição tem um perfil mais específico?

Tânia Brandão – O que norteia o festival é que ele contribua efetivamente para se ter um painel expressivo, vigoroso, do teatro feito no país hoje. Buscamos a percepção de qual é a tradição teatral brasileira e a quantas anda a invenção, qual é o grau de experimentação que se pode encontrar hoje. Chegamos a um resultado muito feliz, impactante.

Na questão da tradição, foi possível trazer o Grupo Galpão, que já tem uma trajetória consolidada. Till é das montagens mais impressionantes do ano passado. Evoca a Idade Média, a redução da figura do indivíduo, e mostra o poder de resistência dele. Essa força e luta do indivíduo fala muito da sociedade e do teatro brasileiro.

Por outro lado, temos o Domingos Oliveira, autor consolidado que aparece com uma proposta de estreia nacional, um retorno a um texto sedimentado sob um olhar de hoje. É uma fatura de um teatro de playwriting, que dá atenção aos procedimentos da dramaturgia. Isso aparece ao lado do Bortolotto, autor da novíssima geração, e de Memória da Cana, que é uma reinvenção cênica do Nelson Rodrigues. Oui oui Paris É Aqui é retomada contemporânea do que era o humor e irreverência do teatro carioca que apaixonou o Brasil nos séculos 19 e 20, com atores vinculados à Cia. dos Atores, que são inquietos.

Temos ainda a essa invenção cênica efervescente de In on It , que vai se tornar histórico pelo trabalho bom do diretor e interpretações notáveis, transgressão d rompimento dos limites da linguagem teatral convencional.

Ao lado disso, temos um Shakespeare (Lady Macbeth), autor que tem uma história recente no teatro brasileiro, montado a partir do século 20. Reúne Renata Sorrah e Daniel Dantas, que vêm dessa geração rebelde dos anos 70 e 80 e se encontram com o Aderbal Freire-Filho, um dos maiores nomes de direção poética e inventiva contemporânea. Essa relação entre tradição e experimentação preocupou a curadoria.

Quantas peças são estréias e como chegaram a elas?

São sete com a São Paulo Companhia de Dança. Eu trabalho na imprensa, o Celso [Curi] também, normalmente recebemos muita informação sobre o que está acontecendo na classe teatral. Houve um estado de pesquisa permanente e reuniões periódicas em que discutíamos essas propostas.

A Mostra Contemporãnea traz uma peça paranaense, duas gaúcha e duas mineiras, enquanto nove são cariocas e dez paulistas. O que explica, uma vez que o festival se coloca como uma vitrine nacional, tamanha concentração no eixo Rio-São Paulo? No fechamento da edição passada, falou-se em buscar variar os estados. Não houve interesse em nenhuma peça do nordeste, por exemplo? Vocês visitaram quais estados enquanto selecionavam?

Não adianta ter políticas artificiais de descentramento porque a consolidação de um mercado não depende de um ato de vontade, mas de coordenadas históricas e condições econômicas, sociais e políticas. Percorremos Norte e Nordeste e não encontramos produções que tenham relevância nacional. Às vezes, os grupos passam até três anos com um trabalho ou não têm proposta nova, forte e densa no ano seguinte que justifique o deslocamento. Eu recebi informação via internet do Amazonas e do Pará. Estive em Pernambuco e no Ceará. Depois recebi muita informação da Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba via internet.

No balanço do festival passado falou-se na grande quantidade de peças comerciais. Como foi pensado o equilíbrio, este ano, entre espetáculos de pesquisa de linguagem e produções de caráter comercial?

Há uma redução bem grande do espetáculo comercial. Tem transgressão de conteúdo – um espetáculo como o do Domingos de Oliveira tem uma dramaturgia tradicional, mas o tema é explosivo. Mesmo o Oui Iui que é uma revista que tem um índice de deboche muito forte. Você vê a torre Eiffel dançando, rebolando. A Loba de Rayban é um espetáculo com atores consagrados, que estão na mídia, mas o conteúdo é nitroglicerina pura. Texto muito forte, falando de traição, sedução. Não vejo esse ano na grade nenhuma inclinação para a questão do comércio no sentido de um espetáculo que não toque e sacuda a sensibilidade do espectador, que seja conciliador e de tranqüilidade.

Há sempre uma gama muito ampla de possibilidades de espetáculos internacionais possíveis para preencher a única vaga para estrangeiros na Mostra Contemporânea. O que os fez se decidirem pelo espetáculo canadense?

Ele tem essa linha de combinação de perfomance: Dulcineia, Dom Quixote e a apropriação no trabalho de interpretação da atriz dessas questões da literatura e da situação da mulher. Teatro muito dinâmico e pouco conhecido como é o canadense, julgamos de muita importância apostar nessa trilha nova, que pode render um caminho positivo. O Leandro viu a peça, os curadores viram o vídeo.

Aqui você encontra a grade.

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