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Villaggio Bassetti, vinhos brasileiros que encaram os lá de fora de frente
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Vinhos Villagio Bassetti

Os vinhos da Villaggio Bassetti, com personalidade e no nível de alguns dos melhores lá de fora. (Arte/ Sandra A.G. Lopes)

– Ele é um profundo conhecedor de vinhos. Foi como me apresentaram ao proprietário da vinícola.

– Nada disso. Aliás, longe disso, apenas um apreciador – apressei-me em responder.

E é isso mesmo. Nesses anos todos de prazerosa convivência com a gastronomia fui aprendendo a conhecer melhor este ou aquele vinho, esta ou aquela uva. E sabendo algumas regras básicas de harmonização que me permitem apenas não errar feio quando faço minhas escolhas. Nada mais que isso.

Pensando bem, boa parte das pessoas de enche a boca de palavras para explicar os efeitos do terroir ou dos ventos do mar ou da exposição ao frio ou das consequências das barricas de aço ou de carvalho não sabe exatamente do que está falando. Vai na onda. E como boa parte dos demais também não tem convicções, vai concordando e acrescentando alguns outros adjetivos, até que se chegue a uma definição que, por vias tortas, engloba o conceito geral de todos da roda. Sem convicção, diga-se.

Já fui assim também, confesso, em meus primeiros tempos de convivência no mundo gastronômico. Foi logo que comecei a escrever sobre o assunto, 2001, ainda no Estadinho. De comida eu podia falar, pois dominava e cozinhava muito bem. Mas de vinhos, apenas sabia escolher os que gostava mais, gostava menos ou não gostava.

Fui convidado para uma dessas degustações enormes no salão do Curitiba Pestana Hotel. Havia produtores de todas as partes do mundo expondo e eu ali, curioso, bebericando um gole e outro e ouvindo as conversas no entorno. Note como é encorpado, aroma de couro e com muita mineralidade – me dizia alguém.

Eu saía dali e ia para outra roda e quando alguém mencionava o tal vinho, eu já tinha de pronto: notou como é encorpado, aroma de couro e com muita mineralidade? E o interlocutor, concordando, completava: desce macio, com um retrogosto agradável e um toque de madeira que não passa por cima do sabor do vinho.

Na conversa seguinte, a alguns metros dali, minha definição já era mais completa: é encorpado, aroma de couro e com muita mineralidade, além de descer macio, com um retrogosto agradável e um toque de madeira que não passa por cima do sabor do vinho. Notei que todo mundo me ouvia, prestava atenção e saía comentar com os mais próximos. Provavelmente a grande maioria fazendo a mesma coisa, impostando importância e conhecimento.

Hoje já falo apenas por mim, passando algumas sensações que tenho, alguns aromas que reconheço. Mas sem empinar o nariz e nem com a pompa que costumo ver a quase toda degustação que compareço. Pois, a rigor, são pouquíssimos os verdadeiros entendedores de vinho, aqueles com condições de identificar uva, país e até ano de fabricação. Dois ou três, se muito. Aos demais basta uma degustação às cegas para desmontar qualquer afetação.

Tive a oportunidade de escrever sobre isso tempos atrás, quando uma degustação às cegas na então La Vinothèque pegou todos os presentes de jeito. Sem exceção, entre os conhecedores, os apreciadores e os curiosos. O que se imaginava ser um branco da nova Zelândia, um tinto do velho mundo, um sul-africano frutado e por aí em diante eram todos vinhos de uma mesma produtora. Sul-americana, brasileira e… paranaense (o post em questão está aqui).

Vinhos da altitude

Isso tudo me veio à cabeça na degustação a que compareci e na qual me apresentaram como “profundo conhecedor”. Foi no restaurante Mukeka Cozinha Brasileira e o convite era para uma noite com os “vinhos de altitude” da vinícola Villaggio Bassetti, aqui do lado, do alto da serra catarinense, em São Joaquim – com altitudes que variam entre 1.267 a 1.330 metros sobre o nível do mar em seus vinhedos.

Vinícola catarinense por assim dizer, pelo que a geografia e o terroir explicam. Mas é possível cravar tratar-se de uma vinícola paranaense fincada em Santa Catarina, pois, engenheiro químico José Eduardo Pioli Bassetti (fundador da casa junto com seus irmãos e esposa) é daqui, com origens em Rio Branco do Sul, onde sua família já fazia alguns vinhos, digamos, caseiros, décadas atrás. Eram os vinhos artesanais de Juca Pioli, o avô que despertou a paixão da família pelo vinho.

Há dez anos estabelecida e utilizando equipamentos italianos, cepas francesas e barricas de carvalho também francesas, prensa pneumática de última geração e controle de qualidade em todo o processo da vinicultura, a vinícola produz cinco rótulos com produção média de 30 mil garrafas/ano. Produção pequena, perto dos milhões de outras grandes vinícolas nacionais. Mas com vinhos de profunda qualidade, de sabores e fragrâncias que confundiriam até mesmo os mais preparados em qualquer degustação às cegas realizada onde quer que fosse.

Os presentes à degustação tiveram a oportunidade de conhecer os cinco vinhos produzidos pela Villagio Bassetti e concebidos pelo enólogo Anderson De Césaro, um jovem de 33 anos, ousado em suas criações, a ponto de criar alguns dos vinhos mais significativos da produção brasileira.

A degustação

O primeiro vinho apresentado foi o Villaggio Bassetti Rosé (R$ 55 ao consumidor final), feito com a combinação não muito usual de duas uvas tintas, Merlot e Pinot Noir (50% de cada). Aliás, a vinícola tem um vinhedo próprio de Pinot só para fazer este rosé. E o resultado é bem interessante, um vinho descomprometido e muito fresco, com 13% de graduação alcoólica, bem a caráter para um aperitivo de fim de tarde ou para abrir uma refeição de verão.

Em seguida veio o Villaggio Bassetti Sauvignon Blanc (R$ 59), que impressionou muito pelo frescor e pela estrutura, explicado por Bassetti pela influência marítima de um vinhedo localizado a cem quilômetros do mar se choca com a lenta e fria maturação da altitude. Mineral, 13,6% de álcool, tem um toque cítrico muito agradável e pode muito bem harmonizar com frutos do mar e carnes brancas sem qualquer restrição.

O outro branco é um espetáculo: Donna Enny (R$ 95), homenagem a avó, neta de italianos e filha de um produtor de vinhos. Com a mesma uva, sauvignon blanc, e da mesma vinha, apenas com diferença de tempo de colheita, com um pouco mais de maturação. No processo de elaboração, descanso de seis meses sobre as borras (sur lies) em barricas novas de carvalho francês e estabilização a frio. Graduação de 13%, um tom de amarelo mais escuro e um aroma muito agradável de frutas maduras. Já um vinho mais consistente, que seguraria muito bem uma combinação com bacalhau, por exemplo.

Aí, para completar, vieram os tintos. O primeiro deles foi o Montepioli (R$59), mais uma combinação entre Merlot e Cabernet Sauvignon, entre 60% e 40% de cada, conforme a safra. Foi batizado com esse nome em uma homenagem ao avô Juca Pioli, aquele que fabricava vinhos, além da referência ao nome da fazenda onde está localizada a vinícola, a qual se chamava Monte Alegre.  E também em menção aos grandes vinhos da região da Itália que possuem o prefixo Monte em seu nome. Com 13% de álcool, é um vinho potente, de um tom vermelho bem expressivo e aroma de frutas vermelhas.

E a estrela da noite foi o Primiero (R$ 115). Produzido em fermentado em barricas de carvalho francês, seu nome refere-se a uma pequena cidade trentina, Fiera de Primiero, na mesma região de onde vieram os Bassetti, e foi escolhido por ser o primeiro vinho da primeira safra produzida. É um vinho classudo, muito elegante, que passa fácil por um vinho do velho mundo, pelo equilíbrio e boa estrutura, sem nada de madeira. Tem aromas de frutas secas, é bem potente e segura bem uma composição com prato de carne mais condimentada ou molhos consistentes. Recomenda-se a decantação (Bassetti costuma dizer ser ideal decantar no almoço para consumir no jantar).

Outros alvos

Com várias ações programadas para o ano, a Villaggio Bassetti acaba de fechar uma parceria com o Centro Europeu de Curitiba. Essa aliança busca trazer o conhecimento técnico da vinícola para alunos e ex-alunos da escola com o intuito de valorizar os produtos nacionais em específico os vinhos de altitude. Em alguns módulos dos cursos relacionados ao mundo do vinho, como por exemplo, o de Sommelier, o enólogo da marca, Anderson De Césaro, e também José Eduardo Bassetti estarão presentes. A previsão é de que, na prática, a parceria aconteça a partir de maio.

A vinícola, além de estar preparada para atender vendas diretas ao consumidor final, já está aberta para visitas guiadas explicando o ciclo completo de produção, desde as videiras até a taça.  Para grupos é necessário agendamento prévio e aos fins de semana é possível agendar almoço com cozinha regional e harmonização com os vinhos da casa.  Conta com uma loja na vinícola, onde os visitantes podem adquirir todos os rótulos próprios da marca em embalagens especiais, além da degustação dos vinhos.

Desde o início da produção os vinhos Villaggio Bassetti são distribuídos por aqui pela Adega Boulevard e podem ser encontrados nas suas duas lojas em Curitiba, além de outras casas especializadas da cidade.

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