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Café em Londres, século 17.
Café em Londres, século 17. | Foto:

Só nos últimos meses, a China ameaçou fechar as corretoras de bitcoin, diversos países proibiram os “ICOs” (as ofertas públicas de moedas digitais), e a prefeitura de Londres baniu o Uber, aplicativo que continua sendo motivo de protesto de taxistas em todo o mundo.

A resistência à inovação aparece quase toda semana nos jornais, mas esse tema não é atual – ou melhor, é atual há pelo menos quinhentos anos, provavelmente há milênios. Tão antiga quanto a inovação é a luta contra ela, seja por parte de líderes políticos ou de minorias organizadas.

O livro impresso, o café, o trem, o telégrafo, a luneta, a música gravada, os teares mecânicos da Revolução Industrial, todas essas coisas surgiram como inovações transgressoras que sofreram proibições.

Veja o caso do café, que surgiu na Etiópia e se espalhou pelo Iêmen no século 15, onde apareceram as primeiras casas especializadas na bebida. Quando chegou a Meca, o café foi proibido pelo governador local. Ele fundamentou sua decisão na opinião de médicos persas, para quem as casas fomentariam conspirações contra a autoridade religiosa.

Em 1555, a bebida atingiu Constantinopla – quinze anos depois, a cidade já tinha 600 estabelecimentos que vendiam o produto. O sultão da época não gostou da moda e resolveu fechar todas elas, mas o soberano seguinte, Murad III, derrubou a proibição e deu uma sobrevida ao café. Como o Uber hoje em dia, o café ignorava proibições.

Ao chegar na Europa, por meio de mercadores árabes, o café sofreu restrições na Alemanha, na Inglaterra, na Espanha, na Suécia. Esposas inglesas chegaram a escrever a “Petição das Mulheres Contra o Café”, afirmavam que a bebida causava impotência nos homens e faria seus filhos nascerem como “uma sucessão de primatas e pigmeus”.

O economista Calestous Juma mostra muitas outras lutas contra o novo no livro “Innovation and its enemies”. A tipografia, que ameaçava a arte secular da caligrafia islâmica, foi proibida entre os muçulmanos por quase 400 anos.

Os ludistas, como aprendemos na escola, quebravam as máquinas por acreditar que elas lhes roubavam o emprego. Essa resistência durou alguns séculos. Em 1942, a Federação Americana de Músicos proibiu seus integrantes de participarem de gravações musicais, e boicotou as rádios que reproduzissem músicas gravadas. Até então, um trabalho comum dos músicos era tocar ao vivo nas rádios.

“Acreditamos que todos os tratores são ruins, mas alguns são piores que os outros”, afirmou, num panfleto, a Associação Americana de Cavalos há quase cem anos.

Se tivéssemos que escolher um simples fenômeno que faz trabalhadores ganharem mais e a prosperidade reinar num país, esse fenômeno é aumento de produtividade. Temos hoje tempo livre e dinheiro para supérfluos porque produzimos mais com menos recursos. E esse aumento de produtividade se apoia num castelo de tecnologias, descobertas, ideias e inovações.

Mas o progresso é uma “destruição criativa”, como disse o economista Joseph Schumpeter. Extingue profissões, força mudanças, mexe no jogo poder de corporações e de governantes. É criativa, mas nem por isso deixa de ser uma destruição. Por causa dela, “níveis inteiros da sociedade perdem o chão sobre seus pés”, disse Schumpeter. Músicos de 1942 e taxistas de hoje são dois entre tantos exemplos.

É por isso que inovações como o Uber, o bitcoin ou o café sempre enfrentarão resistência, por mais que tornem a vida mais fácil, próspera e abundante.

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