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Arte como válvula de escape
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De passagem por Porto Alegre, no mês de março, o professor Afronsius viveu uma experiência para nunca esquecer. Ou, como diriam alguns, “impactante”.
Natureza Morta, no dedo de prosa junto à cerca (viva) da mansão da Vila Piroquinha, quis detalhes.
No Centro Histórico, foi ao Santander Cultural, onde era realizada a exposição “Arthur Bispo do Rosário – A poesia do fio”.
– Simplesmente impressionante.

A arte de Arthur Bispo

Com base no catálogo, o professor Afronsius abriu aspas e mandou brasa:
“A história de um homem diagnosticado como esquizofrênico-paranóico que conseguia extravasar suas emoções em um trabalho catártico e comovente. Esta poderia ser uma história trivial de terapia ocupacional se o resultado da obra deste homem não se consistisse num dos pontos mais altos da arte contemporânea brasileira”.
A exposição reuniu as obras de maior vulto do sergipano que viveu 50 anos enclausurado na Colônia Juliano Moreira, “um hospício carioca que – como todos os outros manicômios brasileiros -, tratava os doentes psiquiátricos a base de química e choques elétricos”.
Arthur Bispo (1909-1989), no entanto, nega o “esperado papel da estagnação pessoal e coloca mãos à obra para transformar seu ócio em criação”.

Linhas dos uniformes

“Desfiando os uniformes dos internos do hospital, o artista encontra sua matéria prima e marca registrada: as nuances de azul das linhas utilizadas em seus bordados”. Bispo já produzia objetos com diversos tipos de materiais oriundos do lixo e da sucata. “Utilizava sobretudo algodão, mas materiais como madeira, concreto, linha, plástico, metal e vidro também podem ser observados nas obras. Quando foram descobertas, críticos classificaram sua arte como vanguardista e chegaram até mesmo a ser comparadas à obra de Marcel Duchamp”.
– Bispo é a prova real de que o homem pode criar, não importa as dificuldades técnicas ou materiais, escreveram Wilson Lazaro e Helena Severo, os curadores da exposição.
São obras “perturbadoras por transpor as fronteiras da insanidade, da realidade e da arte. Refugiado em sua cela, Bispo mesclava genialidade e doses de delírio para compor as instalações, colagens e tapeçarias. Não bastasse ter sido encarcerado em um manicômio, Arthur Bispo também demorou para ser reconhecido no campo artístico e assumiu, mais uma vez, um papel marginalizado, agora no circuito das artes no Brasil”.
Sua obra delirante só foi reconhecida após uma matéria do jornalista Samuel Wainer Filho, veiculada em 1980. Dois anos depois, o crítico de arte Frederico Morais incluiria suas obras na exposição “À Margem da Vida”, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – MAM.
“No total, Bispo elaborou mais de mil obras que foram consagradas no mercado internacional e que circulam em diferentes museus internacionais. O conjunto foi tombado em 1992 pelo Instituto Estadual do Rio como patrimônio artístico e cultural e atualmente está sob os cuidados da Associação dos Artistas da Colônia Juliano Moreira”.

Um estandarte

“Negro, sem documentos e indigente, Bispo foi interditado em dezembro de 1938, aos 29 anos. Antes de ser internado, peregrinou por várias igrejas e terminou no Mosteiro de São Bento, onde anunciou a um grupo de padres que era um “enviado de Deus”, incumbido de “julgar os vivos e os mortos”. Os padres não simpatizaram com a ideia e chamaram soldados que o prenderam imediatamente”.
Detalhes dessa narrativa constam, inclusive, de um estandarte bordado por Bispo, uma das belas peças de sua vasta obra, que mistura autobiografia e ficção. É nesse estandarte que ele registra a frase-síntese de sua vida e obra “Eu preciso destas palavras – Escrita”.
“A palavra tinha para ele status extraordinário, por isso seus bordados estão repletos de nomes de pessoas, trechos poéticos, mensagens”, explica a jornalista Luciana Hidalgo, autora de Arthur Bispo do Rosário – O senhor do labirinto, ganhador do Prêmio Jabuti de 1997.
Novamente tomado pela emoção, ao folhear o catálogo, o professor Afronsius recomendou:
– A exposição deveria ser levada a todos os cantos do país. De qualquer modo, vale a pena acessar o site www.santandercultural.com.br

ENQUANTO ISSO…


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