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A ciência torna obsoleta a crença em Deus? – Parte 3: William Phillips
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Depois de divagar um pouco sobre a máquina do fim do mundo, e mostrar os problemas do entendimento atual de morte encefálica, hoje damos seqüência às respostas que 13 personalidades do mundo científico e religioso deram à Fundação John Templeton sobre a questão acima. O texto de hoje traz a resposta mais enfática – é a única que, no original, veio com um ponto de exclamação:

William D. Phillips: De jeito nenhum!

Divulgação/National Institute of Standards and Technology
William Phillips conquistou o Nobel de Física em 1997.

Em 1997, William Daniel Phillips ganhou o Prêmio Nobel de Física com dois colegas por seu trabalho sobre o uso de luz para resfriar átomos de gases, diminuindo sua velocidade e permitindo que sejam melhor estudados. Mas, em vez de escrever uma resposta profundamente “científica”, Phillips optou por uma abordagem muito pessoal, e nem por isso menos eficaz. Eu, particularmente, me surpreendi positivamente com seu texto.

Primeiro, ele se descreve como um cientista “como qualquer outro”: ele pesquisa, publica suas conclusões em revistas especializadas, apresenta seus trabalhos em congressos, orienta pós-graduandos. E, ao mesmo tempo, é uma pessoa de fé “como qualquer outra”: vai à igreja, canta no coro, reza e participa das formações oferecidas por sua igreja (o texto não diz, mas Phillips é metodista, como seu pai; sua mãe era católica). E aí está a grande sacada: como a mídia costuma dar atenção aos extremos – seja religiosos fanáticos que desprezam a ciência, seja cientistas ateus que desprezam a religião –, passa batido o fato de que a maioria das pessoas é como Phillips, ou seja, concilia os dois tipos de conhecimento.

E o físico nos conta a chave para a conciliação: são duas perguntinhas. A primeira é Como eu posso acreditar em Deus? Para um cientista, isso é possível porque a existência (ou inexistência) de Deus não é algo que pode ser provado em laboratório. Afirmações científicas devem ser “desmentíveis” (ou seja, demonstradas como falsas por fatos), mesmo que ainda não o tenham sido. E Phillips nos lembra que todos nós, todo santo dia, fazemos afirmações que não são de caráter científico. “Lewis Hamilton dirigiu muito no domingo passado” ou “os caras do CQC são engraçadíssimos” (Phillips dá exemplos melhores, como “eu amo você”). E nem por isso dizemos que essas afirmações, por não terem caráter científico, não têm valor, ou seja, nas palavras do físico: “Ciência não é o único modo útil de ver a vida”.

A outra pergunta é Por que eu acredito em Deus?, e seu olhar de físico entra em ação, ao perceber um mundo em que os fenômenos podem ser explicados por um conjunto de equações matemáticas, e um universo em que estrelas e planetas, bactérias e gente, nunca teriam surgido se qualquer variável fosse minimamente diferente. E isso é um indício de um Deus inteligente, mas Phillips não avança o sinal – a ordem do universo aponta para a existência de Deus, mas ela continua sendo questão de fé (se fosse cientificamente evidente, não precisaríamos de fé, concordam?). E Phillips tem outros motivos para crer, esses acessíveis para físicos e não-físicos: “creio em Deus porque posso sentir Sua presença em minha vida, porque posso ver a evidência da bondade divina no mundo, porque acredito no Amor e acredito que Deus é Amor.”

E aqui o cientista demonstra uma grande humildade. Ele pergunta se acreditar faz dele uma pessoa (e um cientista) melhor que os outros. Como ganhador de Prêmio Nobel, Phillips podia simplesmente subir no pedestal e dizer “prestem atenção, eu sei do que estou falando”. Mas, em vez de se comparar com seus colegas ateus, ele prefere se comparar a si mesmo: “eu tenho certeza de que a fé me faz melhor do que eu seria se não acreditasse.” Está aí uma lição de vida muito interessante, de alguém que consegue conciliar um conhecimento científico impressionante e uma fé igualmente sólida.

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Mais sobre William Phillips:
Autobiografia para a comissão do Prêmio Nobel

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