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A pegadinha dos radioisótopos
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Como já comentei aqui, o Reasons to Believe é um grupo criacionista “de Terra antiga”: eles aceitam tudo que a Geologia e a Astronomia nos dizem sobre a idade da Terra e do universo; seu problema mesmo é com a teoria da evolução proposta por Darwin. Pois é justamente desse grupo que está vindo uma contestação a uma nova investida dos criacionistas “de Terra jovem”. O astrofísico Jeff Zweerink escreveu sobre o assunto no site do RTB.

O Institute for Creation Research (ICR) bancou um projeto de nove anos de duração chamado Radioisótopos e a Idade da Terra (Rate, na sigla em inglês), cujo objetivo era mostrar problemas na datação por radioisótopos que atribuía à Terra uma idade com a qual os criacionistas não concordavam.

E aqui interrompemos para uma explicação muito breve: isótopos (variantes de um elemento químico) radioativos, com núcleos instáveis, emitem partículas e se transformam em outros elementos. O processo se repete até se chegar a um elemento com núcleo estável. O processo é chamado “decaimento”. O urânio-238, por exemplo, passa por sucessivos decaimentos até se transformar em chumbo-206, que tem um núcleo estável. Ocorre que sabemos quanto tempo levar para um isótopo se transformar em outro elemento, e graças a isso é possível calcular a “idade” das coisas (o carbono-14, por exemplo, é um radioisótopo).

Então: os criacionistas do projeto Rate chegaram à conclusão de que realmente a datação indica uma Terra com bilhões de anos, mas apenas se considerarmos que o ritmo do decaimento radioativo foi constante durante todo esse tempo. O que eles alegam que nem sempre foi assim. Em algumas épocas o decaimento foi muito mais veloz, afirmam. Então, a Terra na verdade seria muito mais nova que parece; ou, em outras palavras, os radioisótopos estariam nos pregando uma peça. Zweerink resume os argumentos da equipe do Rate em seu artigo, e depois oferece uma refutação.


Segundo os criacionistas do projeto Rate, toda a radiação emitida pelo decaimento acelerado dos radioisótopos durante o Dilúvio foi absorvida pela água que cobriu a Terra na ocasião. (Imagem: Reprodução autorizada / www.thebricktestament.com)

O astrofísico lembra que os próprios membros do Rate viram problemas nas suas alegações. Uma delas era a de que o decaimento radioativo teve uma aceleração significativa tanto durante a semana (literal) da criação quanto durante o Dilúvio. No caso da criação, haveria um conflito teológico. Se entendermos o decaimento como uma espécie de “degradação” ou “corrupção” do elemento químico, surgiria uma contradição, já que no relato bíblico Deus sempre descreve sua criação como “muito boa”, ou seja, perfeita, sem margem para degradações, que só teriam entrado no mundo com o pecado (muito tempo atrás, discutimos no blog a questão da morte antes da queda dos primeiros humanos, lembram?). O que o pessoal do Rate sugere é simplesmente encarar o decaimento não como degradação ou corrupção, mas um processo natural, e aí estaria resolvido o problema teológico.

Os responsáveis pelo Rate ainda veem um problema mais sério, de ordem científica mesmo: se o decaimento radioativo foi tremendamente acelerado durante o Dilúvio, por exemplo, o calor gerado teria derretido o planeta, sem falar das enormes quantidades de radiação que teriam sido emitidas no processo. Aqui, o grupo recorre à explicação de uma intervenção divina para remover o calor (além de uma simultânea expansão do universo que teria “esfriado” o planeta) e alega que a enorme quantidade de água que cobriu a Terra toda durante a enchente deu conta da radiação. Então tá…

Mas essas são as complicações levantadas pelos próprios autores do estudo (temos que admitir que eles foram bem honestos ao afirmar que há boas objeções às suas conclusões); falta a refutação aos elementos que o Rate usou em favor da sua tese de decaimento acelerado (a saber: a datação do zircônio em rochas, medições de carbono-14 em depósitos de carvão, uma revisão da literatura em que se encontraram algumas discrepâncias em medições, e halos de polônio em rochas), e é isso que Zweerink oferece na parte final do artigo, com links para estudos que trazem os argumentos contrários aos do Rate. Dei uma passeada por eles, mas acho que eles serão uma leitura muito mais fascinante para quem tiver conhecimentos mais profundos de Química, em comparação com o pouco que sobreviveu aos meus anos de ensino médio.

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Prêmio Top Blog 2012, obrigado pelo apoio!
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