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Homem das cavernas asiático no museu de história de Hong Kong.
Homem das cavernas asiático no museu de história de Hong Kong.| Foto:

Ni Hao,

Quem leu o post passado sobre Shenzhen, sabe que estou de férias na universidade. E quem leu o anterior sobre diferenças culturais, já entendeu que há dias em que a gente não consegue digerir alguns comportamentos típicos dos chineses.

Enfim, juntando os dois assuntos, neste feriado aproveitei para, entre outras coisas, terminar de ler o livro “Guia Politicamente Incorreto da Filosofia” de Luiz Felipé Condé. Como ele mesmo diz, o livro foi escrito para ser desagradável com um tipo específico de pessoa: a politicamente correta. Em determinado momento, ele escreve:

 

“Se pensarmos bem, veremos sociedades que primam por se julgarem justas socialmente, como grosso modo, a Europa Ocidental, principalmente, a Escandinávia, que tem uma população de uns mil habitantes…Claro que ironizo, mas não é muito mais do que isso se compararmos com países como Brasil, Estados Unidos ou China, nos quais “gente” é riqueza e maldição ao mesmo tempo. É fácil você pregar sobe convivência com o outro quando sua população é rica e quase todo mundo tem olhos azuis, é loiro e tem um nome do tipo “Amundsen”. O politicamente correto nega que seja normal ser egoísta e com isso dá uma roupagem bonita ao egoísmo, porque pretende torná-lo invisível.”

 

Exageros a parte, é realmente muito difícil conviver com seres humanos que precisam lutar pela sobrevivência todos os dias, como a maior parte dos chineses, e que por isso, deixam aflorar o homem de Neandertal que existe em cada um de nós. No Brasil, a gente também precisa lutar pela sobrevivência, mas nós somos apenas 190 milhões face ao 1 bilhão e 300 milhões de chineses. E, talvez por isso, nós consigamos ser um pouco mais “civilizados” em alguns quesitos como, por exemplo, fazer fila!

Visivelmente influenciada por Luiz Felipé Condé, vou jogar meu lado politicamente correto no lixo e vomitar minha ira contra esta mania enjoada dos chineses de não fazer fila para nada. Por conta do feriado, eu e Luiz fomos dar uma voltinha em Hong Kong (para comprar o presente de aniversário do Dudu, lembram?) e tivemos que disputar espaço com os chineses em quase todos os lugares que fomos.

A começar pelo ferry boat de Shenzhen para Hong Kong, que aliás é frequentado pelos chineses mais bem de vida por conta do precinho salgado (220 RMB ida e volta). Na hora do embarque, como dinheiro não é sinal de educação, a nhanhã começou. O povo até ensaiou uma fila. Foi ficando todo mundo um atrás do outro, bonitinho, organizadinho, mas à medida em que o horário de saída se aproximava, passou a rolar uma tensão no ar. O povo começou a se mexer, a mudar de posição, a dar um passinho para frente, depois mais outro. Aí, a nossa visão lateral, antes vazia, começou a ser preenchida por gente de olhinho puxado. Até que um sujeito emparelhou com o Luiz e, num saltinho, colocou um ombro de diferença em cima dele.

Pronto! Incontrolavelmente, o cérebro pseudocivilizado do Luiz voltou 300.000 anos no tempo e o seu homem de Neandertal saiu do armário, fechou as mandíbulas, estufou o peito e gritou: Pai Dui! 排队!

Pai de quem?

“Paidueiiii!!! É assim que se pronuncia “fazer fila” em mandarim. Aliás, pergunte para as pessoas menos interessadas em aprender a falar mandarim, apesar de viverem na China (e são muitasss pessoas!!!) quais as palavras necessárias à sobrevivência diária. Provavelmente ela vai responder Ni hao (Oi) Xiexie (obrigado) Zai jian (até a próxima), Duo shao qian (quanto custa?), o endereço de casa e Paidui (faça fila).

No mesmo dia, ainda em Hong Kong, fiquei esperando quatro pessoas levantarem de uma mesa no Starbucks para eu poder sentar com o Luiz. Três levantaram, porém uma delas ficou sentada fechando a bolsa, terminando de digitar no celular… e, pronto! Um casalzinho entrou na minha frente e sentou à mesa com a mulher ainda lá, guardando os apetrechos.

O que eu gritei mesmo, leitores? Isso mesmo: Pai Dui!!!

Aí o casalzinho olhou para mim com cara de “o que foi que eu fiz?” e eu senti que eles realmente não tinham furado a minha frente de ato pensando. Aquilo foi maior do que eles! Estava no sangue, no DNA, na educação que receberam dos pais, na revolução cultural ou seja lá o que for.

E é isso que me faz detestar mais ainda esta mania de não fazer fila. É que eu não tenho coragem de brigar com ninguém e ainda fico me sentindo mal pela pessoa que furou a fila. Ou seja, todos os sentimentos envolvidos neste “momento-diferenças-culturais” são para lá de ruins.

Depois do ocorrido no Starbuks, ainda tivemos outras indisposições do mesmo gênero. E, como das outras vezes em que o Luiz se alterou e reclamou do furão, vários chineses se mostraram felizes e o apoiaram com olhares e balanços de cabeça. Como se um estrangeiro tivesse mais autoridade para reclamar dos chineses do que eles próprios.

De qualquer forma, vou enfiando minha viola no saco e me despedindo. Alguém está me obrigando a morar na China? Estou aqui por quero. E quem fizer absoluta questão de “pai dui” que volte para o seu país civilizado.

Homem das cavernas asiático no museu de história de Hong Kong.

Homem das cavernas asiático no museu de história de Hong Kong.

 

Zai Jian

再见

 

 

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