• Carregando...
Dantibet, sua filha Giulia, Ella e eu em janeiro deste ano: minhas queridas chinesas-brasileiras ou brasileiras-chinesas.
Dantibet, sua filha Giulia, Ella e eu em janeiro deste ano: minhas queridas chinesas-brasileiras ou brasileiras-chinesas. | Foto:

你们好,

Ni men hao,

Vou contar para vocês quatro episódios que, analisados juntos, nos convidam a uma reflexão um pouco mais profunda sobre a China.

Episódio 1

Recentemente, por conta da minha parceria com a Nora, fui assistir a uma de suas aulas de mandarim gratuitas que acontecem no Centro Comunitário administrado pelo Governo. Lá ocorrem também aulas de dança, caligrafia, pintura, workshops, tudo bancado por eles.

Neste dia específico, alguns funcionários de outras cidades estavam visitando o Centro Comunitário e, como era de se esperar, ficaram muito curiosos em relação à gringalhada conversando tatibitate em mandarim. Eu estava me sentindo um bicho no zoológico esperando me jogarem um biscoito mordido, até que um dos funcionários abriu a porta, entrou na nossa jaula, sentou no sofá e ficou assistindo a gente se embrulhar no mandarim. Graças a Buda, o celular dele tocou e seu interesse pelos animaizinhos acabou de repente. Eu fiquei muito indignada com tudo aquilo, mas percebi pela carinha da Nora que, para ela, não havia acontecido nada demais.

Episódio 2

Essa história aconteceu quando a Liu ainda era nossa ayi. Nós compramos seis cadeiras para cozinha que foram entregues num fim de tarde de domingo (a China não para, gente!). As crianças receberam a encomenda e nem repararam que as cadeiras estavam totalmente tortas. No dia seguinte, liguei para a loja para reclamar e eles disseram que não podiam trocar as cadeiras, uma vez que nós não havíamos feito nenhuma queixa na hora da entrega. Eu tentei argumentar que o significado de cadeira é algo que você coloca o bumbum em cima e senta e que, naquelas coisas de quatro pernas que eles haviam entregue, a gente não conseguia se equilibrar e caía para frente ou para o lado. Nada feito! Eles disseram que, talvez no dia seguinte, fossem mandar alguém para consertar as cadeiras.

Resolvi contar para a Liu o que estava acontecendo e ela ficou muito, mas muito indignada. Pegou o telefone, ligou para a loja, discutiu, gritou, cuspiu e desligou dizendo que em meia hora chegariam cadeiras novas. Dito e feito: meia hora depois, havia doze cadeiras na minha casa: as seis tortas devidamente consertadas e as seis novas! Quando os carinhas foram embora, perguntei para a Liu o que ela havia falado para o pessoal da loja: “Eu falei que ia contar para o Governo”, respondeu.

Liu, minha primeira e querida ayi.

Liu, minha primeira e querida ayi.

 

Episódio 3

Num bate-papo de fim de semana com amigos chineses, começamos a falar de democracia e comunismo. Há muito tempo que eu questiono a eficácia da democracia para países como o Brasil (como já comentei no post “Democracia”), mas eu disse que não achava legal o comportamento autoritário do Governo, como o que havia acontecido na sala de aula da Nora. Foi aí que nosso amigo Terry, que é um cara aberto, trabalha em multinacional e conhece o mundo inteiro nos explicou o seguinte.

Há anos a China é governada através de regimes onde há um imperador ou chefe e um povo trabalhando para ele. Portanto, todo mundo possui ligação com o Governo através de amigos, parentes ou colegas que exercem alguma função em uma das suas instituições como, centros comunitários, empresas, hospitais e por aí vai. Por conta disso, os chineses não acham que o Governo e o povo são coisas separadas, muito menos antagônicas. Existe um processo simbiótico que explica bem o porquê da Nora não ter se incomodado com o comportamento do funcionário que entrou na sua sala de aula. A sala de aula não é dela, é de todos.

Terry e Seagle, sábado passado, em nossa casa

Terry e Seagle, sábado passado, em nossa casa

 

Episódio 4

A Dantibet, uma chinesa muito querida que me conheceu por causa deste blog, é casada com um brasileiro e mora há 10 anos em Piracicaba. Foi ela quem me apresentou a uma chinesinha muito especial: a Ella. Ella (este é o seu nome ocidental; o chinês é Zhou Xun Huan)  foi morar na Inglaterra quando tinha 15 anos e ficou lá até conhecer seu marido que trabalha num consulado em São Paulo e se mudou para o Brasil. Ella, ou ela, é pianista clássica profissional, além de linda!

Enfim, estávamos conversando esta semana sobre o Brasil e Ella me disse que, em sua percepção, em nosso país existem duas classes estanques: as pessoas ricas e os serviçais. Os ricos dão ordens e os serviçais obedecem, sem questionar nada. Ella, que foi criada dentro dos hábitos da sociedade inglesa onde não há empregada doméstica, acha os empregados brasileiros subservientes demais.

 

Dantibet, sua filha Giulia, Ella e eu em janeiro deste ano: minhas queridas chinesas-brasileiras ou brasileiras-chinesas.

Dantibet, sua filha Giulia, Ella e eu em janeiro deste ano: minhas queridas chinesas-brasileiras ou brasileiras-chinesas.

 

E aí, leitores? Num país democrático, como o Brasil, existe o que manda e o que obedece. E num país comunista como a China, todo mundo se acha parte do Governo. Claro que esses são pontos de vista isolados de quem conhece apenas parcialmente o país do outro, mas não deixa de ser muito interessante, não acham?

De qualquer forma, tenho a sensação de que quanto mais eu aprendo sobre a China, menos eu sei. E o que conseguimos realmente ver e entender deste país é apenas a pontinha de um enorme iceberg!

再见

Zai jian

Christianedumont@hotmail.com

 

 

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]