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Uma outra família brasileira na China
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Ni Hao,

Quando decidimos vir morar na China por nossa livre e espontânea vontade, ouvi (e ainda ouço) muitos cumprimentos pela minha coragem. Confesso que tomar uma decisão tão radical realmente demandou muito desprendimento de toda a família, incluindo meus pais e sogros.

No entanto, a cada dia que passa, conheço diferentes pessoas com diferentes histórias que fazem da minha aventura um conto de fadas.

Esta semana, tive o imenso prazer de conhecer pessoalmente a Elen (com quem estabeleci contato através deste blog) e desfrutar da companhia de sua família.

Chris Dumont
Da esquerda para direita, eu, Elen, Lia, a garçonete do restaurante onde estávamos, Alexandre e Theo.

Elen, mãe da Lia e do Theo e esposa do Alexandre, morava em Capão da Canoa (RS) onde possuía com o marido um curso de idiomas/intercâmbio. Por motivos que nem eles mesmos sabem ao certo (sempre conhecemos nossas razões, mas nem sempre conhecemos e dominamos nossas emoções) decidiram arriscar a vida fora do Brasil.
Espalharam seus currículos pelo mundo e foram chamados pelos chineses para serem professores de inglês numa escolinha parecida com a que tentei trabalhar tempos atrás, só que em Changchun.

Changchun é uma cidade ao norte da China, perto de Haerbin, mais conhecida pelo Festival de Inverno com suas esculturas e castelos de gelo.

Divulgação
À esquerda o Festival de Gelo de Haerbin e à direita Changchun no inverno.

Só que, chegando em Changchun há quase 5 anos, as coisas não aconteceram exatamente como previsto. Nem tudo o que foi prometido foi cumprido e a família viveu uma barra pesada.

Para começar, em Changchun o inverno dura 7 meses e a temperatura cai a – 30º C, o que é difícil de aguentar até mesmo para gaúchos natos.

Em Changchun, ninguém fala inglês. Ninguém! Ou seja, é quase impossível a comunicação com eles. Como dizer que o ralo do banheiro do quarto do hotel está entupido e transbordando, como aconteceu comigo? Fazendo mímica?

Em Changchun, os chineses são muito mais chineses do que na ocidentalizada Shenzhen (eu já desconfiava que Shenzhen não fosse padrão chinês, mas agora tive a confirmação). Eles arrotam, empurram, fumam em qualquer lugar, escarram, escarram, escarram, não cheiram bem. Os taxistas dirigem como loucos e, na busca por maiores ganhos (a bandeirada lá é 5RMB, menos da metade de Shenzhen) fazem lotação: você está lá, sentada encolhidinha no seu taxi, quando o motorista para e entram mais 2 pessoas!

Fora encarar uma cidade assim, a Elen precisou matricular os filhos em escola chinesa. As crianças choraram muito até se adaptar ao mundo chinês, não sem antes quase desaprender a comer com garfo e faca (Elen diz que eles pareciam uns porquinhos empurrando comida pela boca com os pauzinhos, sujando a mesa, a roupa…) ou voltar para casa com uma ponta de lápis enfiada na testa como aconteceu com o Theo. Quem é mãe, sabe o que é isso, ainda mais quando a escola diz “se não está satisfeita, pode ir embora”.

Fora a cidade, a escola, o preconceito contra os estrangeiros em geral, o emprego como professora num jardim de infância (que maltratava os chinesinhos), outras coisas estranhas e, às vezes, engraçadas aconteciam na vida de Elen. Por exemplo, a proprietária do antigo apartamento, que por “lei” mantinha uma cópia da chave com ela, amanhecia na sala, lendo jornal, para checar se estava tudo bem com o apê. Isso aconteceu com tanta frequência (ela chegava até a lavar a louça do jantar para eles), que a família decidiu mudar de apartamento antes que a proprietária flagrasse o casal em… enfim.

Hoje, 5 anos depois, a família da Elen está muito bem!

Alexandre está trabalhando numa escola americana, o que proporcionou a possibilidade das crianças estudarem lá. Está fazendo mestrado e crescendo profissionalmente. E, mais do que tudo, tem um brilho invejável nos olhos quando fala de seus alunos.

As crianças são os intérpretes da família. Adivinhem quem fez a reserva do meu hotel? Falam, leem e escrevem em chinês, fora o inglês e o português.

Lia toca, entre outros instrumentos, o inimaginável Erhu. Theo aprendeu a fazer sushi e vem mostrando dotes para fotografia. Ambos são doces, meigos e carinhosos. Assim o são, porque estão amparados por pais corajosos que se ajudam e seguram juntos as barras mais pesadas.

Theo fazendo shushi chinês

Lia tocando Erhu

E, finalmente, Elen, depois de 5 anos de resignação, está voltando a se enxergar. Parou de trabalhar e está pensando em aprender chinês, se dedicar mais ao corpo e voltar a pintar. Enfim, a reencontrar a paz de espírito que ficou meio perdida frente a tantos desafios.

Alexandre

Como vocês podem ver, quem sou eu para falar de coragem vivendo em Shenzhen, sustentada por um marido com emprego estável e com dinheiro para encarar os imprevistos?

Galerinha de Changchun vocês são demais!

Obrigada pelos dias maravilhosos que passei e por me deixarem compartilhar da/ a história de vocês!

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