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O que os variados tipos de carne de aves – que vão do vermelhíssimo corte de avestruz à delicada codorna, passando pelo sabor marcante do pato – têm em comum? Para os chefs de cozinha, a resposta é simples: a leveza. Independentemente da cor e da textura da carne, o fato de ela ter pouca gordura e um sabor suave, faz com que as aves dividam um mesmo capítulo da gastronomia e que sejam muito versáteis na hora do preparo.

Aliada a essas características, a relativa facilidade para criá-las ajudou a popularizar a carne ao redor do mundo. Elas hoje fazem parte de culinárias muito distintas, da indoasiática à mediterrânea.

No Brasil, o consumo de aves ainda é muito limitado ao “frango nosso de cada dia”, como resume o chef Tarciso Lopes, do restaurante português Cais da Ribeira, do Hotel Pestana Curitiba.“Existem muitas opções, o que nos falta é quebrar o preconceito e buscar as alternativas que já estão no mercado.”

Longe da rotina

Se a ideia é ousar, é possível sim fugir do trivial, mesmo mantendo o frango na preparação. Uma das dicas é lançar mão de temperos e acompanhamentos. “O alho, o tomilho e o alecrim dão mais personalidade à carne, que combina com os mais variados tipos de acompanhamento, já que é neutra”, ensina o chef José Serra, professor do curso de Chef Cuisine-Restaurateur do Centro Europeu.

Além das ervas, outra dica é caprichar na elaboração do molho, que pode incluir elementos sofisticados da gastronomia. Exemplo disso é a tradicional receita italiana do frango à caçadora (pollo alla cacciatora), em que a primeira – e superficial – impressão de ser mais um frango com molho vermelho é rapidamente quebrada pelo sabor do demi-glacé (molho base da culinária francesa) e do vinho chianti, que se evidencia assim que a iguaria é levada à boca.

Para outros chefs, como Ivan Lopes, do restaurante Terra Madre, para se alcançar um sabor legítimo é fundamental substituir o frango de granja pela versão caipira, chamada também de orgânica. “O que se compra no mercado não tem gosto de frango”, critica. A coloração amarelada e o sabor marcante do frango caipira são acompanhados por outra característica: a maior rigidez da carne, que exige atenção no preparo. “O segredo é amaciá-la. Uma opção é a marinada seca, em que se colocam ervas e temperos secos, além de um fio de azeite sobre a carne, deixando-a no refrigerador descansando por 6 a 12 horas”, ensina o chef do Cais da Ribeira. O mesmo efeito pode ser conseguido com uma vinha d’alho, em que os temperos são misturados ao vinho e a carne fica nessa marinada. “A única ressalva é que a carne perde uma pouco do seu sabor, evidenciando o vinho que, para o frango, deve ser sempre o branco.”

Outra dica é consumir frangos abatidos ainda “novos”, já que com o passar do tempo a carne se torna cada vez mais rígida. “Mas, como para tudo sempre há uma exceção, um clássico da gastronomia francesa quebra a regra. O Coq au Vin (frango ao vinho) é preparado com um frango velho, amaciado em uma vinha d’alho feita com tinto”, diz Tarciso.

Variações

Para quem quer ir além do lugar comum, há muitas outras opções, tanto de aves quanto de preparos. Entre as mais populares está o pato, consagrado pela culinária francesa. “Depois do frango, o que mais se consome é essa carne”, diz Tarciso, deixando de lado os perus e chesters, que invadem as mesas brasileiras na época de Natal.

“O pato tem uma carne avermelhada e mais forte, que exige um pouco mais de tempero”, alerta Ivan Lopes. Segundo o chef, cada corte tem características diferentes, o que deve ser levado em conta na hora do preparo. “O magret (peito), chamado por muitos de “picanha do pato”, é servido malpassado. Já o confit, feito com as coxas e sobrecoxas, tem um preparo demorado. Ele fica dois dias no tempero, que leva alho, cebola e ervas fortes, como o alecrim, a sálvia e o tomilho. Depois é confitado (cozido na gordura) lentamente, em baixa temperatura, por quatro ou cinco horas. Só então é grelhado e servido.”

Os acompanhamentos também variam. “Para o confit, batata grelhada em camadas ou uma mochilinha de batatas cai muito bem”, sugere a sócia do Le Réchaud Heloísa Fuganti, que, além do confit, tem em seu cardápio o original fondue de pato. “Os pedaços de carne são levemente empanados com farinha de trigo e acompanhados de molhos adocicados, como os chutneys de maçã e pera e os molhos de laranja, cereja e ameixa. Uma ótima combinação”, sugere.

Parecido com o pato, o marreco tem uma coloração que puxa para o marrom e sabor um pouco mais suave, além de ter coxas e sobrecoxas modestas. Uma das receitas mais tradicionais é o marreco recheado, muito difundido pelos descendentes de alemães. “Há alguns segredos para que ele fique bem macio. O primeiro é o tempero, uma marinada feita com vinho branco. O segundo é o tempo de forno: pelo menos quatro horas, em temperatura baixa, para que ele cozinhe aos poucos”, explica Wilce Brunatto Taruhl, sócia do Cantinho do Eisbein, umas das referências da gastronomia germânica em Curitiba. O prato é servido com repolho roxo e purê de maçã – segundo ela, esses acompanhamentos agridoces realçam o sabor da ave –, além de arroz e purê de batatas. A iguaria harmoniza bem tanto com chope claro ou escuro quanto com vinho tinto.

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