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Alessandra Colasanti transforma uma bailarina de Dégas numa metralhadora blasée contra o esnobismo | Divulgação
Alessandra Colasanti transforma uma bailarina de Dégas numa metralhadora blasée contra o esnobismo| Foto: Divulgação

Quantas vezes você já se sentou na plateia de uma palestra e se irritou com a profusão de citações de autores que desconhece? Pior ainda se a voz da sabedoria lá na frente for enfadonha e blasé. Em um da­­do momento você desconfia: Será que as frases estão sendo atribuídas aos verdadeiros donos?

A situação acima vira uma sátira nas mãos de Alessandra Colasanti, autora, diretora e atriz de Anticlássico. A peça teve curta temporada em Curitiba em dezembro último e conquistou fãs em todo o país. Vestida como uma bailarina em vermelho saída de um quadro de Edgar Dégas, a atriz profere uma palestra com moldura intelectual, mas que não tem pé nem cabeça.

Aliás, o formato "cabeça" está lá. Os óculos são retirados e recolocados de acordo com a ênfase do momento. Interjeições como "não é?", "vocês estão acompanhando?" e "vou apenas citar a título de reiteração, porque obviamente todos já tiveram contato com o autor" lembram o ambiente de competição por inteligência das universidades.

A certo ponto, a bailarina sem nome conta uma anedota de uma suposta visita de Michel Foucault ao Rio de Janeiro. O venerado filósofo francês se torna então referência recorrente na peça, capaz de fazer a apresentadora engasgar.

Um vídeo passado em Paris apresenta ainda hordas de turistas que fotografam o quadro "Monalisa", de Leonardo da Vinci, no Museu do Louvre. Tudo isso é em­­balado por arroubos de sensualidade da bailarina, que contracena com Hamlet (João Velho).

Com a ajuda dele, ela encerra a peça abrindo para perguntas da plateia (em Curitiba ninguém disse um "a").

Ela mesma simula perguntas com­­plexas que teriam vindo de crianças e adolescentes superdotados.

Releituras

A satirização da postura de quem se esconde por trás de nomes de grandes pensadores e artistas feita por Alessandra Colasanti tem sua chave quando ela questiona: "Um livro que nunca foi lido pode ser considerado um clássico?"

Ecoa assim o livro Por Que Ler os Clássicos?, de Ítalo Calvino, em que o italiano enumera diferentes formas de lidar com livros e autores imortalizados.

Uma das constatações é a de que o medo de ser discriminado por tudo aquilo que ainda não se leu leva alguns a afirmar que estão "relendo" um clássico, nunca lendo pela primeira vez. Ou­­tros apelam para a falta de maturidade para não tê-los lido, como se exigissem leitores em outro nível na escala evolutiva intelectual.

Vale a pena ler o livro e assistir à peça. E citar os autores que você leu, por que não? Mas sem perder o bom humor.

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