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Fachada do antigo Cine Império, inaugurado em 1941: ir ao cinema era um evento social. Abaixo, ilustração da fachada do mesmo cinema, pelo artista plástico Ronei Erthal | Acervo do Museu Municipal Atílio Rocco
Fachada do antigo Cine Império, inaugurado em 1941: ir ao cinema era um evento social. Abaixo, ilustração da fachada do mesmo cinema, pelo artista plástico Ronei Erthal| Foto: Acervo do Museu Municipal Atílio Rocco

Projetando o futuro

Dirceu Précoma diz que nasceu dentro do cinema. Em seus 57 anos de vida, um dos três filhos de Daniel Précoma – que arrendou o Cine Ideal em 1949 –, já foi montador de fita, lanterninha e viveu as boas e más fases dos cinemas de São José dos Pinhais. Estar atento aos projetores era uma de suas atividades quando criança.

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  • Scherner: o cinema é valioso

Foram 5.378 dias sem risos, sem drama, sem cortes. São José dos Pinhais ficou sem uma sala de cinema por 15 anos. A cidade vizinha de Curitiba, desde 1910 acostumada às projeções, teve sessões até 1993 e só viu parte da sétima arte voltar às telas em outubro de 2007, com a inauguração da Cinemateca, no Museu Municipal.

No último dia 21 de setembro, os bastões de carvão que abasteciam projetores suíços da década de 1930 deram lugar à tecnologia e à modernidade, visíveis em poltronas anatômicas e no ar-condicionado eletrônico: cinco salas da rede Cinemark foram inauguradas no Shopping São José, proporcionando saudosas lembranças aos antigos freqüentadores das salas escuras e curiosidade aos mais jovens que, além das horas em frente às telonas, gastavam bons minutos no deslocamento até os cinemas de Curitiba.

A história começa lá em 1910. Em uma sala precária no térreo de um sobrado da Rua XV de Novembro, os irmãos Espínola instalaram um projetor adquirido do antigo Cine Éden, de Curitiba. Tudo era novidade e quem – dos 600 habitantes – quisesse assistir aos filmes, que levasse a sua própria cadeira. Foi assim até 1917, quando outro cinema foi aberto e anos depois passou para as mãos de José Zaniolo: era o Cine Ideal. É a essa época que viaja a memória de Ernani Zétola.

"Tinha uns cinco anos quando comecei a freqüentar cinemas. Meus pais me levavam", contou Zétola, nascido na cidade há 87 anos. O ex-empregado dos Correios lembra dos senhores de chapéu enganchados em senhoras de vestido. Ir ao cinema era mais do que uma atividade cultural. Tornava-se um evento social. Já naquela época não era permitido fumar. Menos por possíveis inconveniências e mais por risco de incêndio. "O lugar era todo de madeira, do chão às paredes. No palco, tinha uma pianola que tocava as músicas dos filmes," comentou o aposentado, olhando para cima em busca da lembrança fugidia.

Além do circo, o cinema mudo era a única atração cultural da cidade até 1933, quando problemas financeiros o calaram temporariamente. A falta de som foi responsável por cenas curiosas. Zétola e seus colegas, que ainda não sabiam ler, fechavam os olhos quando as legendas surgiam e só abriam quando a parte animada reaparecia. E havia a professora Nair. "Ela não enxergava direito e sentava sempre na primeira fila. Quando as letrinhas chegavam, seu marido tinha que ler em voz alta e todo mundo reclamava", relembrou Zétola, que seguia correndo para o cinema assim que o "trriiiiiiim" da campainha alertava. Isso às as quintas, sábados e domingos, às 20 horas.

Nos intervalos dos dramas de mais de 180 minutos, café quente e pastéis fritos na hora por Augusta Kürschner – a "Augustona" –, mulher do então proprietário, Alírio Kürschner.

Em 1941, o Cine Império abriu as portas. Era o primeiro cinema falado de São José dos Pinhais. Nessa época, Eddie Polo e Dolores del Rio eram o "mocinho" e a "mocinha". O "bandido" completava o trio dos personagens presentes em faroestes barulhentos.

Daniel Précoma comprou o espaço em 1953 e, em 1968, deu início às obras do "novo e moderno" cinema da cidade: o Supercine Ideal, inaugurado na Praça 8 de Janeiro em outubro de 1979. O espaço funcionou ininterruptamente até 1993, deixando em preto-e-branco parte da vida de Zétola, que foi ao cinema pela última vez em Curitiba, há três anos, e de Leopoldo Scherner, saudoso pela arte que volta em dose dupla.

"O cinema é parte importante, valiosa e necessária de qualquer lugar", explica o ex-professor da PUCPR.

Poeta, 89 anos, Scherner já se perdeu na conta dos livros que escreveu. Seu contato com a cultura em sua cidade natal se dá justamente onde o cinema tem lugar hoje. Na Cinemateca de São José há uma exposição inspirada em poemas seus; no novo shopping – construído no terreno onde ficava seu colégio primário – há fotos suas. E foi depois de ir ao novo cinema com amigos que sua neta, atenta, lhe contou: "Vô, você está em uma daquelas fotos, vá lá ver."

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