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William Binney, ex-agente da NSA: depois de 30 anos como espião, tornou-se um delator | Reprodução/Facebook
William Binney, ex-agente da NSA: depois de 30 anos como espião, tornou-se um delator| Foto: Reprodução/Facebook

O governo americano poderia ter evitado os ataques de 11 de setembro se tivesse concluído o desenvolvimento de um software capaz de localizar terroristas pela análise de seus relacionamentos. Essa é a tese defendida pelo ex-agente da NSA, a agência de segurança nacional americana, William Binney, que, depois de 30 anos de serviços prestados à agência, desligou-se da organização e tornou-se um delator de práticas consideradas por ele ilegais, como o monitoramento indiscriminado de cidadãos civis para fins de segurança nacional.

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Binney deixou a NSA poucos meses depois dos ataques de 11 de setembro, mas somente anos mais tarde decidiu tornar públicas suas denúncias. Uma história muito parecida com a de outro ex-agente da NSA, Edward Snowden, mundialmente conhecido por ter vazado informações secretas e cuja trajetória foi relatada em filmes como o documentário “Citizenfour” e na ficção baseada em fatos reais “Snowden: Herói ou Traidor”, de Oliver Stone. A história de Binney também se tornou filme, o documentário “A Good American” (“Um americano bom”, em tradução livre), dirigido pelo cineasta austríaco Friedrich Moser.

Agente desenvolveu sistema sofisticado de análise de dados

O filme conta a história de Binney e do desenvolvimento do software chamado ThinThread, criado por ele. Matemático especializado em criptografia, Binney foi considerado um dos mais importantes analistas de inteligência dos Estados Unidos quando na ativa. Ao longo dos anos 1990, desenvolveu o projeto do ThinThread, um sistema capaz de manipular grandes volumes de informação usando métodos sofisticados de análise de dados coletados de chamadas de telefone e envio de e-mails.

O ThinThread era capaz de monitorar com quem os alvos de investigação se comunicavam, com quem mantinham relações comerciais, com quem estavam geograficamente em contato e assim por diante. Isso tudo mantendo a privacidade de quem tivesse os dados investigados, pois o sistema fazia a análise criptografada e só permitia a decodificação das informações em caso de potenciais ameaças.

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A questão é que o desenvolvimento do ThinThread nunca foi concluído. Em seu lugar, a NSA – comandada no governo de George W. Bush pelo general Michael Hayden, depois diretor da CIA – abandonou o software para adotar, em seu lugar, um projeto criado por empresas privadas, chamado Trailblazer, que custou ao governo americano centenas de milhões de dólares e que nunca chegou a ser efetivamente implantado.

Uma denúncia transformaria a vida de Binney

A recusa da NSA em utilizar o ThinThread, mais barato e mais seguro que o Trailblazer, fez com que Binney, já fora da agência, questionasse formalmente o Departamento de Defesa americano, que iniciou uma investigação. Essa ação transformaria a vida de Binney e de outros colegas. Perseguido pelo FBI, teve a casa invadida por agentes, computadores confiscados e sua autorização de segurança como ex-agente confiscada. Por essas razões tanto Binney quanto Snowden decidiram ir a público como delatores e revelaram bastidores dos programas de espionagem da NSA, que chegaram até a monitorar a ex-presidente Dilma Rousseff e seus assessores próximos.

Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, Friedrich Moser endossa a tese de que o uso do software criado pelo protagonista de seu filme teria prevenido os ataques de 11 de setembro: “Não é uma questão de crença. Foi feito um teste no software no começo de 2002 baseado no que ele havia coletado na maior base de dados da NSA desde agosto de 2001 e ele encontrou os terroristas”, conta Moser. “Então, pouco antes de 11 de setembro a NSA tinha de fato a informação sobre os terroristas, mas tinha acabado de jogar fora o único software capaz de encontrá-los”, continua.

“O software ThinThread era capaz de encontrar os terroristas porque ele era inteiramente baseado em análise de relacionamentos. Com o ThinThread olhando para quem estava em contato com conhecidos terroristas, os primeiros planos do 11 de setembro teriam sido descobertos até fevereiro de 2001”, afirma o cineasta. “Toda a rede poderia ter sido descoberta, um contato de cada vez. Sem terroristas, não haveria ninguém para realizar os ataques”, conclui.

Relatório do Pentágono é público, mas foi censurado

A história de Binney contada em “A Good American” é também a história de um relatório produzido pelo Pentágono com base no questionamento que o ex-espião e seus colegas fizeram ao Departamento de Defesa em setembro de 2002. O relatório se tornou público, ou pelo menos uma pequena parte dele. Grande parte do documento é ilegível por ter sido censurada pelo governo devido a seu caráter confidencial.

Moser, no entanto, encontrou uma fonte que afirma ter lido o conteúdo do relatório na íntegra. Trata-se de um ex-assessor de segurança nacional de um ex-congressista americano. Patrick Eddington, membro do instituto libertário CATO, já declarou publicamente, mais de uma vez, que o conteúdo do documento revelado no filme é autêntico. Além disso, ele resolveu processar o governo americano pela confidencialidade do relatório do Pentágono sobre o ThinThread.

O filme teve uma boa recepção em festivais internacionais, mas sofre a crítica de parecer insistentemente manipulativo, o que acaba criando terreno para uma leitura cética. Moser, um cineasta cuja formação é em história contemporânea, embarca na onda conspiratória: “Eu me perguntei como diabos nós acabamos nessa situação, começando com um cenário da Guerra Fria em que essas agências de inteligência espionavam em sua maioria nossos inimigos militares. Mas agora nós, os cidadãos, nos tornamos o inimigo, porque agora eles estão nos espionando”.

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