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 | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Ele se chama Carlos e ela se chama Helena.

Conheceram-se há muitos anos, quando eram jovens, belos e, como todos os jovens, eternos. Ocorre que não se viam há...

– Muito tempo, sorriu ele.

– É bom nem pensar nisso, disse ela.

Riram os dois, fazendo contas que não revelaram um ao outro. Estavam na entrada do colégio a espera da saída dos alunos. Ele fora buscar o filho e, ela, a neta.

– É verdade, disse ela, já tenho neta.

– Incrível.

– E seu filho?

Como se precisasse se desculpar, ele explicou que casara muito tarde, talvez tarde demais, era um pai quase velhinho.

– Velhinho? Imagine! Você está muito bem.

– E você... perdão, continua linda.

Soou o primeiro sinal de saída de alunos.

– O primeiro sinal, disse Carlos, sem saber o que dizer.

Helena não pareceu ouvir, os olhos perdidos no final da rua, um sorriso nos lábios. Ele observou que ela parecia mais jovem e bonita. Perguntou:

– Está pensando no quê?

– Ah, desculpe. Eu...

– Estava muito longe daqui, comentou Carlos.

– É verdade. Lembrando de um baile.

– Foi longe, então. Já não existem bailes há muito tempo. Não aqueles.

– Você lembra do tango?

– Que tango?

– O tango que dançamos. Todos pararam para ver. Fomos aplaudidos. Não lembra?

Carlos não conseguiu evitar a gargalhada:

– Eu, tango? Sou o pior dançarino do mundo, quanto mais tango! Você foi com outro namorado nesse baile.

Helena balançou a cabeça:

– Nada disso. Lembro como se fosse hoje. A orquestra, a nossa turma, meu vestido novo, vermelho. E você metido num terno azul escuro.

– Não era eu. Eu não tinha terno.

– Não brinque. Veio até a mesa, me cumprimentou e me convidou para dançar. Naquele tempo era assim, lembra?

Foi quando Carlos lembrou. O terno do irmão. A mesa com refrigerantes e algumas flores. Quando se dirigiram para o salão ele disse que ela estava tão linda quanto aquelas flores, frase que lhe pareceu ridícula e da qual se arrependeu, envergonhado. Ela sorriu.

– Mas eu não sei dançar tango, Helena.

– Foi o que me disse naquele dia.

É verdade. Dissera: eu não sei dançar tango. Aliás, não sei dançar nada, sou um desastre, completou com convicção.

– Eu também disse que não sabia dançar tango.

Os dois riram.

– Foi o tango mais maravilhoso da minha vida – disse Helena. Jamais esqueci.

O segundo sinal soou, os dois aproximaram-se do portão. A primeira a chegar foi a neta de Helena, correndo. Mais atrás, arrastando uma mochila, o filho de Carlos.

Despediram-se. Helena atravessou a rua com a neta. Carlos acompanhou o filho pela calçada. Quando chegaram ao automóvel, o filho perguntou:

– Quem era aquela mulher, pai?

– Uma dançarina.

– Dançarina?

– De tango. A melhor que conheci.

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