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Escola primária em Koindu, uma das 1.270 destruídas durante a Guerra Civil em Serra Leoa, ocorrida entre 1991 e 2002. | Laura Lartigue/
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Escola primária em Koindu, uma das 1.270 destruídas durante a Guerra Civil em Serra Leoa, ocorrida entre 1991 e 2002.| Foto: Laura Lartigue/ Creative Commons

Quanto mais histórias se recebe, (...) mais o espírito de uma pessoa se torna forte para lidar com as incertezas da vida.”

Ishmael Beah,  escritor.

Memórias

Escritor Ishmael Beah foi
uma criança-soldado em Serra Leoa. Sobreviveu à experiência para contá-la no livro de memórias Muito Longe de Casa. Agora, ele publica seu primeiro romance.

Livro

O Brilho do Amanhã

Ishmael Beah. Tradução de George Schlesinger. Companhia das Letras, 280 pp. R$ 39,90 e R$ 29,90 (e-book).

Considerado o escritor africano mais popular dos dias de hoje, Ishmael Beah falou à Gazeta do Povo sobre a criação de O Brilho do Amanhã, publicado agora pela Companhia das Letras. Nas respostas, por e-mail, ele confirma o que pulsa firme em sua obra: “Acredito cada que ficção tem fundamento na realidade e na verdade”.

O Brilho do Amanhã é seu primeiro livro de ficção. O que motivou você a escrevê-lo?

Eu já tinha escrito ficção antes. Contos, principalmente. No entanto, esta foi a primeira vez que embarquei em um romance.

Eu queria discutir uma questão muito negligenciada, mas muito importante, sobre o que acontece após a guerra.

Por que e como é que as pessoas voltam para casa, lutam para tentar voltar ao país e ser as pessoas que eram, retornar as suas tradições e encontrar a simplicidade que uma vez os definiu. Como você se move em direção a um futuro quando o passado continua a pulsar em você?

Mais importante, queria discutir a importância de preservar o significado das coisas em tempos de incerteza.

Há muito de você nos personagens deste livro?

Não. Observei muito e fiz pesquisas informais, iniciando com conversas que me deram suporte para o livro.

Então criei um mundo ficcional com base nesses retornos que aconteceram não só no meu país, mas muitas em outras partes do mundo.

No sentido da escrita ficcional, o pessoal surgia enquanto eu criava cada um dos personagens: uma avó, um pai, uma jovem mulher, um homem amputado e até mesmo ex-crianças-soldados que tinham uma vida diferente do pós-guerra do que eu. Então imaginei e reimaginei a vida através de cada um deles.

Acredito que cada ficção tem fundamento na realidade e na verdade. Talvez, isso seja muito bem explicado por Albert Camus, um dos meus escritores preferidos: “A ficção é a mentira através da qual dizemos a verdade”.

Como sua experiência o ajudou a escrever?

Minha experiência como um criança-soldado certamente me ajudou na maneira como exponho os sentimentos sobre guerra e violência.

A minha experiência passada me moldou de várias maneiras. E uma delas é a capacidade de observar profundamente as pessoas e as situações.

Isso, certamente, torna-se útil para um escritor.

No livro, você deixa claro como as histórias são importantes na sua cultura. E o quão importante elas são para você?

Extremamente importantes. Sou da opinião de que as histórias são remédios injetados em nós que nos ajudam na preparação para enfrentar a vida.

Quanto mais histórias se recebe, especialmente aquelas com lições morais e éticas, mais o espírito de uma pessoa se torna forte para lidar com as incertezas da vida.

O que significa para você ser um escritor, principalmente um escritor que relata a realidade de seu povo?

Escrevo para apresentar aos leitores um determinado aspecto da condição humana, o que significa ser humano em certas realidades e regiões do mundo. É como abrir uma pequena porta para outra realidade.

A minha escrita até agora é baseada no continente africano porque é onde eu encontro inspiração. Eu não considero a minha escrita um relatório do que ocorre lá, mas sim uma viagem mais profunda para a beleza, para as dificuldades de lá.

As nuances da vida do meu povo e da minha cultura que muitas vezes são deixadas de fora quando são apresentadas por pessoas de fora.

Talvez, a melhor maneira de descrever o que é a minha ideia sobre a escrita é com mais palavras de Camus: “O escritor não pode colocar-se a serviço de quem faz a história; ele está a serviço daqueles que a sofrem”.

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