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Autor expressa de forma fascinante dimensões abstratas de suas experiências pessoais. | Reprodução
Autor expressa de forma fascinante dimensões abstratas de suas experiências pessoais.| Foto: Reprodução

Lançado originalmente em 2001 e premiado na Europa, o graphic novel “Pílulas Azuis”, do suíço Frederik Peeters, acaba de ganhar uma edição brasileira. Principal trabalho do elogiado quadrinista, a obra é um registro autobiográfico sobre a relação do autor com a companheira Cati e o enteado, ambos soropositivos.

Conforme o próprio livro registra num apêndice desenhado 13 anos depois da obra original, as memórias de Peeters se passam em um período em que a vida com HIV era mais difícil e marcada por perceptivas desanimadoras, além de muitas dúvidas mesmo entre pessoas bem informadas – como as que o próprio casal revela na prática.

“Pílulas Azuis”, de forma até provocadora, esclarece o assunto e desmitifica a relação sexual num casal “discordante” (nome técnico para o casal em que apenas um é portador do vírus). A história começa na virada de 1999 para 2000 – depois da descoberta do tratamento antirretroviral, portanto. É quando Fred ouve de um médico que sua chance de contágio eram as mesmas de encontrar um “rinoceronte branco” na rua.

Mas o rinoceronte vez ou outra se materializa à espreita, o autor admite – e esta é uma das coisas que tornam “Pílulas Azuis” tão inteligente. Trata-se uma história pessoal e bastante íntima, e não de uma cartilha.

Os dilemas e angústias de uma relação como essa são apresentados de forma bem direta. Quando e como contar para os pais? Qual será a reação dos amigos? Como será o futuro do “pequeno”? (A relação de Fred com o filho de Cati, então com três anos, é um capítulo importante da história.) Não é fácil, para Cati, conviver e monitorar sua doença, além de ter de administrar o tratamento (as tais pílulas azuis) ao filho, cuja contaminação é um enorme fator de culpa.

HQ

Pílulas Azuis

Frederick Peeters. Tradução de Fernando Scheibe. Nemo, 208 págs., R$ 39,90.

E há também questionamentos sobre o próprio amor: Peeters conta do esforço que fez para se livrar de qualquer vestígio de piedade enquanto nasce a admiração. E a compaixão gera alguns dos insights mais interessantes, em um diálogo que passa por filosofia e política num contexto que vai do nonsense ao lúdico.

Peeters usa com habilidade as possibilidades narrativas dos quadrinhos para expressar de forma fascinante dimensões abstratas de suas percepções pessoais, descrever sentimentos intensos e fulminantes, capturar experiências fugidias – e belas. As diferentes perspectivas propõem acompanhar a história de dentro, com olhar distraído e reflexivo, buscando significado tanto no transcendental quanto nos detalhes banais. É uma história inspiradora de amor, em seu sentido mais amplo.

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