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Com metáforas fortes, o britânico Woodrow Phoenix desconstrói nossa relação com os carros | Reprodução
Com metáforas fortes, o britânico Woodrow Phoenix desconstrói nossa relação com os carros| Foto: Reprodução

Livro

Autocracia

Woodrow Phoenix. Editora Veneta, 192 págs., R$ 44,90.

O título da recém-lançada edição brasileira pode até trazer uma impressão de tom panfletário a Autocracia, do quadrinista e designer britânico Woodrow Phoenix. Mas o "manifesto gráfico", originalmente publicado com o nome de Rumble Strip na Inglaterra, em 2008, funciona mais como uma espécie de ensaio sobre a cultura do automóvel baseado mais em argumentos filosóficos do que em dados com entonação política.

"Rumble strips" são os conhecidos "sonorizadores" das estradas daqui, citados por Phoenix em um intenso relato do livro sobre um quase acidente que sofreu – um dos recursos da brilhante reflexão do autor sobre o quão frágeis somos dentro de um automóvel em alta velocidade. E sobre o quanto é absurda a aceitação desta vulnerabilidade em nossa sociedade, sobretudo para os pedestres.

Em um exercício poderoso de desconstrução de nossa relação com os carros, Phoenix cria metáforas como a de uma rua com pianos suspensos sobre as calçadas, em que, naturalmente, se exigem absoluta responsabilidade e eficiência dos especialistas que manejam as cordas. "Um carro é uma peça de metal densa e firme, centenas de vezes mais pesada que o corpo humano", escreve. "Ainda que tenham esse imenso potencial destrutivo, carros são dirigidos como se seu mau uso não tivesse nenhuma consequência."

Mais à frente, ele reforça a fragilidade pedestre. "Em uma fração de segundos o erro totalmente evitável de outras pessoas poderia fazer com que você nunca mais voltasse. Você poderia morrer. Ao ir buscar a roupa na lavanderia ou levar um pacote ao correio", escreve. "Não seria completamente ridículo?"

Phoenix não desenha carros nem pessoas. As figuras humanas são retratadas na simbologia desumanizadora da sinalização de trânsito. Todo o resto são semáforos, setas e asfalto carregado de tinta preta. O cenário desolado é reforçado pela banalização da relação da morte com as leis de trânsito."Se você quiser matar alguém e se safar", argumenta o autor, "avance sobre ele. Não vai ser nada demais. Acidentes de carro acontecem o tempo todo", ironiza.

A sedução do carro e a publicidade de automóveis também são analisadas com um viés psicológico fascinante. No fim, resta a percepção do absurdo. E de que continuamos seguindo, mesmo que algo esteja muito errado.

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