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Arrigo Barnabé, um dos destaques da cena: “A vanguarda é londrinense e paranaense.” | Imagens: Reprodução
Arrigo Barnabé, um dos destaques da cena: “A vanguarda é londrinense e paranaense.”| Foto: Imagens: Reprodução

Aconteceu em março de 1973, em Londrina, Norte do Paraná. Um grupo de artistas em busca de um palco para se apresentar resolveu produzir seu próprio espetáculo e desde então nada mais foi o mesmo na cidade. Os dois dias do concerto Na Boca do Bode funcionaram como uma espécie de painel da cultura londrinense com dois vetores.

“Potencial de público de Itamar e Arrigo não foi alcançado”

Fábio Henriques Giorgio explica porque Londrina foi um agitado centro cultural na década de 1970

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Olhando para o passado, revelou toda a energia cultural da cidade jovem e pulsante que havia sido desbravada quarenta anos antes. Para frente, o show antecipou a tendência da arte transgressora que seria a experiência musical mais rica da década seguinte: o movimento que aconteceu ao redor do Teatro Lira Paulistana, em São Paulo, no início da década de 1980 – que nos acostumamos a chamar de vanguarda paulista.

Censura

No dia do histórico musical pé-vermelho foram apresentadas 27 canções. Em plena ditadura elas precisaram passar pelo curvo da Polícia Federal e só foram liberadas por conta da habilidade do produtor do show, o escritor Domingos Pellegrini, que ludibriou os censores apresentando trechos alterados das letras que tinham potencial para serem tidas como subversivas.

A história de como a estrada que leva de Londrina a São Paulo alterou os rumos da música nacional estão no livro “Na Boca do Bode”, de Fabio Giorgio. A obra se debruça sobre as origens da “novidade paulista parida em Londrina”. A edição do autor que completa dez anos em dezembro está praticamente esgotada (restam poucas cópias com o próprio escritor) e mostra como o estrada musical entre Londrina e São Paulo afetou a música brasileira.

Logomarca do espetáculo Na Boca do Bode (1973).

Afinal, as duas figuras mais importantes da “vanguarda”, os músicos Arrigo Barnabé (londrinense) e Itamar Assunção, estiveram no palco do Na Boca do Bode e ajudaram a compor a rica cena cultural londrinense daquela época.

Foi no palco do Na Boca do Bode que Arrigo apresentou pela primeira vez uma versão da música “Clara Crocodilo”, título de seu álbum mais importante, que completa 30 anos no próximo mês de novembro.

Antipop

A vanguarda paulista foi um fenômeno cultural que teve lugar em São Paulo entre os anos de 1979 e 1986, tempo em que funcionou o teatro Lira Paulistana no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Na contramão do pop que dominava a programação das rádios e gravadoras, o movimento apostava em uma música experimental e sofisticada e unia artistas como as cantoras Tetê Espíndola e Ná Ozetti e bandas como Premeditando o Breque e Língua de Trapo. Os principais destaques foram Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção.

Mas não eram só eles. Aquela geração incluiu também o escritor Domingos Pellegrini, outros músicos importantes como Paulo Barnabé (da Patife Band), Robinson Borba, a cantora Neuza Pinheiro e outros que seguiram ou interromperam suas atividades artísticas.

Produtor do espetáculo, Pellegrini diz que tudo começou com um pedido de Itamar, seu amigo e parceiro para produzir e dirigir seu show. ”Então fiquei sabendo que havia outros músicos querendo também estrear em palco, como Valter Guimarães, Edvaldo Viecelli, Chico Grilo e outros que passaram por lá nas duas noites memoráveis em que lotamos o Teatro Filadélfia, com capacidade para 600 pessoas, inclusive com gente em pé nos corredores”, relembra.

Para Giorgio, o show foi uma “ousadia”. “Um grupo de jovens músicos resolve desafiar suas amadoras possibilidade e promover longe do caráter competitivo dos festivais um espetáculo onde pudessem se manifestar”, explica.

Livro

Na Boca do Bode - Entidades Musicais em Trânsito

Fábio Henriques Giorgio. Edição do Autor, 140 pp. História musical.

Pellegrini conta que deu um cheque sem fundos para garantir o empréstimo de instrumentos, mas com o sucesso da bilheteria a produção conseguiu pagar todos os gastos e ainda sobrou dinheiro. “Daí decidimos, em reunião, que ou gastaríamos tudo com cerveja e pizza ou – proposta não lembro mais de quem – compraríamos microfones e caixas de som para a Casa de Cultura da Universidade, que co-apoiou o evento”, recorda.

Para ele, o Na Boca do Bode foi o momento em que Londrina sepultou o provincianismo.

A ousadia de arranjos, cenário – cortinas negras ao fundo, apenas com uma cadeira pendurada sobre o palco –, e as interpretações impactantes marcaram época, injetando um espírito de inovação nas artes da cidade.

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