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Depois de uma década de interrupção, a Dorsal Atlântica voltou em 2012 com o álbum financiado pelos fãs e agora mostra um sinal vigoroso de vitalidade com o álbum novo, relançamento de material na China e a finalização do documentário.

Em entrevista ao Caderno G, o líder da banda, o musico, escritor e jornalista Carlos Lopes fala sobre este momento da carreira, sobre as escolhas artísticas que fez e sobre o futuro da Dorsal.

Dá para chamar Imperium de ópera thrash? Já te ocorreu a ideia de encenar a obra como uma opera mesmo, ou um filme ou série de TV?

Os elementos do estilo ópera estão todos neste disco, além é claro, de eu ter sido influenciado por ópera rock estrangeira (Tommy do The Who e The Wall do Pink Floyd). Somente em 2014, além de gravar Imperium, escrevi 3 novos livros. Sobre a questão de adaptar o trabalho a outras mídias, vejo essa possibilidade com muita empolgação. Atualmente, tenho me dedicado bastante à ilustração, animação e quadrinhos.

Os dois últimos álbuns da Dorsal são quase ensaios de politica e história do Brasil ...

Um dos detalhes mais interessantes dos CDs 2012 e do Imperium é que ambos anteciparam fatos da história brasileira, que vieram a ocorrer nos anos seguintes. E isso está longe de ser uma previsão, mas sim uma análise da realidade. De fato, este país não me surpreende. Sempre escrevi música para conscientizar. Ao invés de usar uma arma, tenho empunhado uma guitarra há décadas. E se for preciso, as palavras ferem, não trazem conforto ou acomodação. Esse é meu grande motivador. Não faz sentido algum estar em um palco para divertir o público se dessa sessão de descarrego, que é o show ou o disco, não sair ninguém ferido ou com a cabeça mudada.

Além da questão histórica e politica, a uma trama central de Imperium é cheia traições alcoviteiras palacianas pesada. O que esta história revela sobre as relações de poder no país e a chamada alma brasileira? E será que ela existe?

Hipocrisia em primeiro lugar. Não que o povo brasileiro seja o mais hipócrita do mundo, mas é o país onde nasci e que desejo de coração, que mude de modos. O triângulo amoroso do CD Imperium ocorre entre um casal da alta sociedade, cujo marido é abolicionista. Há então uma relação extraconjugal de sua esposa com o Imperador escravagista. Esse relacionamento não é apenas “adúltero”, mas a opção pelo externo e não pelo interno; a admiração pela forma e não pelo conteúdo.

A alma brasileira existe sim, mas também há grupos que a renegam. Tocamos em muitos lugares no sul do país e em São Paulo nos quais os garotos diziam com orgulho que pertenciam à “raça superior” de alemães e italianos, apesar de terem nascido no Brasil. Esses não-brasileiros nada sabem sobre o nosso povo miscigenado e nem se importam. Esses brasileiros me dão vergonha.

Para acrescentar, quem mais me influenciou na crença de que há uma alma brasileira, distinta da dos outros povos, foram Darcy Ribeiro, Paulo Freire, Celso Furtado, Graciliano Ramos e José Lins do Rego, entre outros mestres.

Durante uma entrevista para o documentário Guerrilha você conta que os últimos trabalhos da Dorsal são os melhores da banda pois as referencias estão presentes e bem resolvidas. O que o leva a pensar assim?

Meu objetivo como artista tem sido até hoje, falar sobre o Brasil, mas com uma linguagem brasileira. No caso do rock pesado, meu intuito sempre foi recriar o estilo, dar-lhe uma cara personalista, que não tinha e nem tem relação com o “movimento” no sentido mais anacrônico da palavra. Meu movimento é o de me mover à frente.

Quando cito as descobertas e criações da banda, falo dos 20 anos de Dorsal e mais 10 anos de minha carreira solo. Uma longa temporada de 3 décadas que me fez reaprender que boa música não é apenas uma montoeira de riffs, mas de boas canções.

A volta em 2012 se deu em relação direta com os fãs, sem atravessadores, a partir de financiamento coletivo. Agora a banda volta com, um disco muito bem produzido e lançado por uma gravadora. Qual é o melhor caminho?

Creio que não há “um” melhor caminho, há escolhas..Foi o crowdfunding para a gravação de um novo disco, que fez o público se reinteressar pela banda, como o Imperium só nasceu por causa do CD 2012. Imagine ambos os discos juntos como os versos de um LP duplo. Um complementa o outro, acrescenta textura, forma e soma conceitos. Não poderia haver um sem o outro. Tematicamente, ambos os discos empregam o passado para refletir sobre a política atual e ambos têm diferenças estéticas.

Sobre a questão profissional, o contrato para o Imperium me permitiu ser o proprietário da master, algo inédito até em contratos no exterior. Uma nova conquista e mais uma quebra de paradigma.

A criação do Metal no Brasil deve muito a Dorsal e a você como o mais criativo compositor e o mais articulado pensador. Como você avalia a sua contribuição para o Gênero no Brasil?

Creio que minha contribuição ao metal foi ter trazido 3 elementos: Brasil, poética e política. O metal é um estilo uniforme e globalizado (no pior dos sentidos) e isso ainda me desagrada como artista. Enquanto adolescente o meu maior interesse era a música. Hoje já não é mais. Música é mais uma ferramenta que possuo para me exprimir, desde que seja ousada.

Por que vocês decidiram voltar com toda esta força? Por que você voltou a escrever metal depois de declarar publicamente que estava fora deste metier?

Sobre a volta da banda em 2012, o primeiro motivo foi termos sido convidados pela produção do festival Metal Open Air no Maranhão para fechar o evento, com duas famosas bandas de abertura: o Anthrax e o Exodus. Enfim, analisando a questão pelo lado positivo, o escândalo da desorganização do festival trouxe a Dorsal à vida. Naquele momento percebi que havia uma demanda concreta, palpável, real, mas só isso não bastava. O mercado de música precisava mudar, ser menos dependente de gravadoras que não gravam, revistas que não imprimem e empresários que não empresariam. Então, propus aos fãs que bancassem o disco. Na época fomos criticados pela maioria das bandas, mas o tempo já me deu razão.

O que a banda planeja para 2015? Há chance de uma turnê que passe em Curitiba?

O futuro a Deus pertence, mas a gente cria o nosso no dia-a-dia.

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