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Nada de axé nem de sertanejo universitário, o negócio de Riad é a MPB velha de guerra, das décadas de 1960 e 70. | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Nada de axé nem de sertanejo universitário, o negócio de Riad é a MPB velha de guerra, das décadas de 1960 e 70.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Era 1979 e Riad Bark tinha acabado de se formar em Direito pela Universidade Federal quando um conselho e um presente de seu professor de Direito Penal Fernando Fowler deram outro rumo para sua vida.

“Ele me disse: ‘Melhor que ser mais um advogado na cidade, é você seguir sua vocação e viver de música’”, lembra Riad.

Como estímulo, o professor levou Riad até a casa Erthel, tradicional loja de instrumentos que existia na Rua Riachuelo no Centro de Curitiba e deixou que Riad escolhesse um violão novo.

Não tinha mais volta. Um advogado a menos no fórum. Um músico a mais na então animada noite curitibana.

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Hoje, aos 60 anos, completados neste sábado (23), Riad conta que sente “arrependimento zero” da escolha. Foi com a voz, o violão e o carisma que o “turco”, como é chamado pelos amigos, fez história na vida noturna da cidade.

Desde 1987, Riad comanda o Ponto Final, reduto boêmio instalado em um antigo casarão no bairro São Francisco. No lugar, resiste a velha tradição do banquinho e violão.

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Riad é, a um só tempo, proprietário e atração principal do Ponto Final, com versões de clássicos da MPB.

Com a proverbial hospitalidade libanesa, ele também sabe abrir o pequeno palco para quem quiser dar uma canja. Desde que não venha com axé ou sertanejo universitário.

O negócio de Riad é a MPB velha de guerra, principalmente das décadas de 1960 e 70. “Para mim, o Tom Jobim é o topo da cadeia alimentar. Depois dele, vem Chico Buarque, Caetano, João Bosco, Gonzaguinha. Esta é a música que eu gosto de ouvir e de cantar”, diz.

O Ponto Final é um bar da velha escola da boemia, descontraído e informal. Por módicos R$ 20 reais de couvert artístico, o sempre bem humorado Riad enfileira sucessos madrugada adentro.

Ele tem cardápio enxuto de bebidas clássicas e petiscos, com destaque para a receita de quibe frito que sua mãe, dona Amide, preparou durante muitos anos.

Nas paredes, fotos da família e dos amigos e pôsteres do panteão de artistas que fazem a cabeça de Riad, a maioria lá pregados desde o dia em que a casa abriu, em 1987.

Destaque para um pôster da equipe de futebol dos tempos de estudante, em que Riad aparece com alguns figurões do mundo jurídico da cidade. “Eu era o centroavante reserva que, quando entrava, metia gol.”

Aliás, no Ponto Final é muito fácil encontrar desembargadores, juízes, advogados, cartorários, toda a ala notívaga do direito local.

O novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fachin é um dos que aparecem às vezes. “Ele foi meu calouro na universidade. Ele é um grande sujeito e merece o sucesso que faz.”

O nome do bar foi dado meio por acaso por um irmão de Riad, no final de um mal sucedido brainstrom. “Vai ser bar do Riad e ponto final”, ele disse, batizando o empreendimento familiar. Um nome que sugere também o último destino de uma ronda boêmia.

“A ideia inicial não era essa: ser o último bar a fechar. Mas acabei adotando porque gosto deste começo de madrugada, acho a melhor hora do dia. Acabei unindo o útil ao agradável”, diz.

Riad nasceu em Ponta Grossa, mas logo veio com oito irmãos para morar na sobreloja do armazém do pai na Rua Riachuelo. Ele lembra de uma “infância difícil”.

Perto dos 13 anos, ganhou um violão e tudo mudou. “Fiquei obcecado pelo violão, tocava sem parar”, lembra. “Me custou o segundo ano colegial e valeu uma bela surra do meu pai. Mas foi bom, me espertou, nunca mais reprovei e passei a ser um bom aluno sem parar de tocar.”

Ex-torcedor do Operário Ferroviário, hoje acompanha meio de longe o Paraná Clube. É casado com Marlene e pai orgulhoso de Juliana e Carolina, que se formaram em Medicina. “Estou de bem com a vida”, diz.

Riad estima que seu repertório tem cerca de 2 mil músicas. Muitas delas em cadernos de cifras escritos ainda na década de 1980. A maioria na memória prodigiosa que dificilmente rejeita pedidos dos clientes habituais . A capacidade de memorizar centenas de canções também serve para Riad “ganhar” o público.

“Você tem que sentir o que as pessoas querem ouvir. Isso é uma arte. Com a experiência que tenho, reconheço o perfil das pessoas e jogo a isca. Na maioria das vezes, dá certo”, diz.

O “turco” porém não esconde uma certa preocupação ao constatar que é um dos últimos representantes do estilo banquinho e violão. “Ainda existe um público para esse tipo de música, mas não sei como será o futuro. Hoje é mais fácil ligar um pendrive com mil músicas no computador, do que ficar cinco horas tocando. Mas sigo otimista”.

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