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Zózimo começou a carreira no “Globo”,  mudou-se para o “Jornal do Brasil” em 1969 e voltou à primeira redação em 1993, onde ficou até morrer, em 1997, aos 56 anos. | Joëlle Rouchou/Divulgação/Intrínseca
Zózimo começou a carreira no “Globo”, mudou-se para o “Jornal do Brasil” em 1969 e voltou à primeira redação em 1993, onde ficou até morrer, em 1997, aos 56 anos.| Foto: Joëlle Rouchou/Divulgação/Intrínseca

Em 1969, Zózimo Barrozo do Amaral chamou a atenção da censura ao publicar uma nota sobre um general do alto escalão do governo militar. Acabou tornando-se o primeiro colunista social preso na história do país. Ao ver o símbolo da elite e do glamour do Rio adentrar sua cela, um dos intelectuais perseguidos pela ditadura exclamou: ”Os homens enlouqueceram! Eles estão agora prendendo eles mesmos!”.

Zózimo teve uma vasta e movimentada carreira no jornalismo. Começou no “Globo”, onde ficou de 1963 a 1969, mudou-se para o “Jornal do Brasil” e voltou à sua primeira redação em 1993, permanecendo lá até a sua morte, aos 56 anos, em 1997.

Não por acaso, porém, o episódio da prisão abre “Enquanto houver champanhe, há esperança: uma biografia de Zózimo Barrozo do Amaral”, de Joaquim Ferreira dos Santos, que será lançada em 3 de novembro.

Os colunistas ainda lutam com essa coisa inglória que é a busca pelo furo. O Zózimo incluiu nela um novo sabor. Ele queria sempre tirar um sorriso do leitor.

Joaquim Ferreira dos SantosAutor de “Enquanto houver champanhe, há esperança: uma biografia de Zózimo Barrozo do Amaral”

Ele confirmou uma mudança nas colunas sociais, que já não se aproximavam dos ricos e poderosos apenas para registrar gourmandises e finesses, mas também para noticiar os bastidores da política e da economia.

Convidado em 2013 pela Intrínseca a escrever a história de Zózimo, Joaquim entende do assunto. Repórter e cronista, trabalhou com o biografado no “Jornal do Brasil” e assinou durante dez anos a coluna Gente Boa, no “Globo”.

Em quase 700 páginas, ele reconstrói o árduo trabalho diário de um colunista que, sem perder o gosto pela boa vida, preferiu ficar “mais perto da máquina de escrever do que do bufê”.

Contar a história de Zózimo é contar a evolução de um produto jornalístico tipicamente brasileiro, a coluna de notícia. Qual a contribuição do seu biografado para essa atividade?

A ideia do livro é trabalhar com a grande angular, fazer um perfil desse período de transição da cidade, da mudança das redações, desse tipo de ocupação dentro de um jornal, a coluna de notícias. Os colunistas ainda lutam com essa coisa inglória que é a busca pelo furo. O Zózimo incluiu nela um novo sabor. Ele queria sempre tirar um sorriso do leitor.

Quando Zózimo começa na profissão, ela já deixou de ser a crônica social pura para se tornar um lugar de notícia...

A revolução começa com Maneco Muller, nos anos 1940. Já existiam centenas de colunas que cuidavam de sociedade carioca, casamentos, batizados... Havia um fascínio por esse mundo, uma espécie de conto de fadas com príncipes reais. Só que os colunistas sociais os afastavam em seus casarões. Maneco percebe que essa gente está misturada na cidade. Com ele, a coluna social ainda não é notícia, mas já tem um tom de crônica, de comportamento.

No livro, Maneco percebe que não há separação entre produção artística e vida social. Com Ibrahim Sued começa a busca pelo furo e até os bastidores da política. Qual é a marca de Zózimo?

O Manoel Bandeira dizia que Rubem Braga era ainda mais genial quando não tinha assunto para sua crônica. Zózimo era assim com as notícias. As notas mais clássicas dele não são furo, aquela “bomba-bomba” do Ibrahim Sued. Ao longo do tempo, ele vai enxugando o texto, num processo de depuração. O Ancelmo Gois dizia que ele tinha o melhor texto em três linhas do jornalismo.

Você faz questão de reproduzir muitas notas do Zózimo. Até hoje, mesmo datadas, elas ainda parecem ter valor...

Um dos objetivos do livro também é reconhecer o valor do texto dele. A atividade do colunista tem prestígio entre os leitores, mas não tem essa pontuação de que é um lugar de bom texto. Se reproduzisse as notas do Ibrahim, que é um superpersonagem, poderia ficar datado. O que ele publicava era ótimo naquele momento, era furo. Mas o Zózimo, além da notícia quente, trabalhava quase sobre o “nada”, o etéreo. O colunista tem que ter um espírito, um borogodó, uma voz que soe diferente dentro do jornal.

Zózimo representava um mundo de alegria permanente, onde sobrava champanhe e faltavam preocupações. Paradoxalmente, ele é um personagem repleto de zonas de sombra.

É um dos baratos do personagem. Ele tinha um problema grave de alcoolismo e com o próprio trabalho, que era uma pedreira, cobrança diária. Ele fez isso por mais de 30 anos e nunca conseguiu fazer outra coisa. No fim, mesmo com todo o reconhecimento e o sucesso, terminou mais pobre do que tinha começado. Isso, para um colunista social que teve todas as oportunidades de melhorar seu patrimônio, é para se abrir o obituário. Ibrahim, por exemplo, foi para o lado empresarial, teve restaurantes, lançou uísque...

Zózimo morreu em 1997. Nesse período, a alta sociedade também já era outra, não?

A cidade vai se transformando, começa no black-tie e acaba na camiseta da feijoada do carnaval. Começa com essa elite vaidosa, que dava grandes festas em casa, e termina nessa elite que vai à casa noturna e sai da festa com uma amostra de garrafinha de uísque nacional. Estava surgindo um novo dinheiro, e o glamour se perdia.

Como Zózimo via esse novo mundo?

Ele não tinha paciência para essa gente e recusava convites dos novos ricos. Até que um dia acaba indo visitar um sujeito na Barra cujo sonho era conhecer o Zózimo e sair em sua coluna, era uma maneira de tornar a grana mais nobre. Ele abre a casa toda, e no closet da mulher mostra as calcinhas dela com brilhante. Imagina só o Zózimo diante daquela cena...

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