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Cena da série American Gods | Divulgação
Cena da série American Gods| Foto: Divulgação

Desde que Game of Thrones liberou o caminho para que outras redes exibissem sem culpa séries de fantasia e ficção científica de grande orçamento com temas que fogem do âmbito do realismo, outras produções seguiram a trilha, como Westworld e American Gods, que terá seu último episódio da primeira temporada disponibilizado hoje pela plataforma de streaming Amazon Prime. Com grande cuidado de produção e visual sofisticado, American Gods é também a primeira tradução com alguma fidelidade para a TV da obra de um autor referência na literatura com toques de fantástico, o inglês Neil Gaiman.  

American Gods é baseado no romance mais conhecido de Gaiman, lançado no Brasil como Deuses Americanos. A premissa é que, nos Estados Unidos, país formado por imigrantes de todo mundo, os deuses e crenças de cada um foram aos poucos sendo substituídos por outras divindades cultuadas pela sociedade racionalista e tecnológica. Lançado originalmente pela Conrad, voltou em nova edição no ano passado pela Intrínseca, que atualmente detém os direitos das obras do autor.  

Sobre o autor

Conhecido por renovar a concepção dos quadrinhos como gênero, Gaiman nunca foi um desconhecido nas estantes brasileiras – sua obra literária vem sendo publicada com regularidade por aqui desde o início dos anos 2000 (e seus quadrinhos, reeditados mais de uma vez desde os anos 1980). O que chama a atenção agora é como a repercussão de American Gods parece ter provocado uma corrida de reedições de seus trabalhos. A própria Intrínseca já relançou seus outros romances Os Filhos de Anansi e Lugar Nenhum, também publicados pela Conrad na década passada.

Uma coletânea de histórias fantásticas chamadas Criaturas Estranhas, organizada por ele, foi lançada por aqui recentemente, pela Rocco. Seu romance Belas Maldições, escrito em parceria com outro mestre da fantasia, Terry Pratchett, ganhou edição nova pela Bertrand Brasil. E, este ano, uma coletânea de lendas da mitologia nórdica reinventadas por ele também saiu pela Intrínseca. É tanto relançamento que quase passa batida a publicação de um novo volume de contos, Alerta de Risco. Gaiman, definitivamente, é um nome com retorno comercial garantido – são lendárias suas sessões de autógrafos que duram 12 horas.  

O trabalho que catapultou Gaiman para o Olimpo da cultura pop foi a série em quadrinhos Sandman, com 75 volumes de histórias em que o escritor pegou um super-herói antiquado da DC e virou o conceito de cabeça para baixo, reescrevendo a própria história das HQs no processo. Até hoje o material é considerado um marco, um dos “três pilares” responsáveis por demonstrar o potencial dessa mídia para tratar temas “adultos”, ao lado do Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, e de Watchmen, de Alan Moore.  

Gaiman nasceu em 1960 na cidade de Portchester, na Inglaterra. Seu pai foi um dos primeiros membros proeminentes da Igreja da Cientologia no Reino Unido. Quando tinha sete anos, Gaiman foi recusado em uma escola particular porque o diretor declarou que ele não poderia ser aceito devido à má fama do culto no qual havia sido criado. Gaiman hoje está afastado da Cientologia, a que se refere como “a religião de sua família”, e não a sua. Trabalhou como jornalista no início da carreira, mas, depois de se aproximar de Alan Moore, à época já famoso pelo que andava fazendo com a série do Monstro do Pântano, da DC, passou a escrever roteiros de HQs.  

Logo chamou a atenção do hegemônico mercado americano, que importou nos anos 1980 muitos artistas das ilhas britânicas, como o próprio Moore, Brian Bolland, Steve Dillon, Peter Mulligan, Dave Gibbons e Dave McKean, parceiro de Gaiman no primeiro trabalho americano do autor, a minissérie Orquídea Negra (McKean se tornaria colaborador de Gaiman em Sandman).  

Outros trabalhos

American Gods não é, claro, a primeira experiência de Gaiman no audiovisual. Em 1996, ele escreveu o roteiro de Neverwhere, minissérie da BBC sobre um homem comum que se vê tragado por uma Londres mágica paralela àquela em que vivia. Como dificuldades de produção levaram a muitos cortes e a algumas alterações no material, ele reorganizou tudo na forma do que viria a ser seu primeiro romance, Lugar Nenhum, publicado no mesmo ano.

Mais tarde, dois de seus livros para o público infantil e juvenil foram adaptados para o cinema: Stardust, o Mistério da Estrela e a animação Coraline. Gaiman também escreveu o roteiro de Beowulf, esquecível adaptação do épico anglo-saxão feita por Robert Zemeckis em 2007.  

O que torna American Gods um caso diverso é que, pela primeira vez, a obra de Gaiman vira uma série razoavelmente fiel e com recursos de produção à altura das viagens fantásticas propostas pelo autor em sua obra. Curiosamente, numa mostra do “espírito do tempo”, a repercussão crítica obtida até aqui por American Gods está bem além da recebida nos filmes – numa época em que séries que não passam na TV aberta se tornaram um dos espaços em que criadores podem ousar com radicalidade, incluindo dois elementos importantes na obra de Gaiman que costumam ficar fora das adaptações de sua obra até aqui: horror e sexo. 

 

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