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Trabalhadores seguram panfleto com a foto do motorista assassinado durante ato na Praça Rui Barbosa | Daniel Caron/Gazeta do Povo
Trabalhadores seguram panfleto com a foto do motorista assassinado durante ato na Praça Rui Barbosa| Foto: Daniel Caron/Gazeta do Povo

Ter uma arma apontada para sua cabeça, ser humilhado por bandidos e até presenciar a morte de alguém são situações que causam significativo desgaste emocional e têm impactado a rotina de motoristas e cobradores de ônibus em Curitiba e Região Metropolitana. Diariamente, o sindicato da categoria (Sindimoc) encaminha profissionais para atendimentos com psicólogos e psiquiatras devido à violência de que foram vítimas. E os casos têm se tornado cada vez mais frequente com o aumento dos arrastões, que subiram 50% em relação a 2016, chegando a nove por dia, de acordo com dados da entidade.

Um deles aconteceu no último sábado (22) e deixou a classe em luto ao terminar com a morte do motorista Edmilton José de Melo, 45 anos. “Esquecer o que aconteceu eu nunca mais vou esquecer. Todo dia que eu for trabalhar, não importa a escala que eu fizer, vou me lembrar e ele vai fazer muita falta”, afirmou a cobradora que acompanhava Edmilton na noite do crime.

A mulher preferiu não se identificar, mas, em meio às lágrimas, afirmou estar lutando para deixar os momentos de terror para trás. “Quero seguir a minha vida, voltar a trabalhar. Quero que achem os responsáveis e que seja feita justiça”. De acordo com a Viação Castelo Branco, a funcionária está muito abalada e foi afastada de suas atividades durante uma semana.

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Assim como ela, muitos profissionais precisam deixar o trabalho por determinado período após situações de violência e ainda podem apresentar transtornos psicológicos relacionados ao fato. Esse é o caso de uma cobradora que atua na linha Iguape II, entre os terminais Hauer e Boqueirão. Na função há cinco anos, ela não consegue enumerar todos os assaltos sofridos . No entanto, garante que, apenas em 2016 e 2017, passou por dez abordagens enquanto trabalhava. “Já se tornou normal eu ter uma arma apontada para minha cabeça e ver bandidos agredindo passageiros”, lamentou a mulher, de 56 anos.

Por causa de toda a violência a que foi submetida, no ano passado ela começou a apresentar mudanças de humor e descontar sua raiva nas pessoas ao redor. Foi necessário buscar atendimento psicológico para controlar a situação. “Eu trabalhava muito estressada, não media minhas palavras e tinha que pedir desculpas aos colegas depois. Ainda bem que moro sozinha. Se tivesse alguém comigo em casa, essa pessoa iria sofrer”.

De acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros em Curitiba e Região Metropolitana (Setransp), os assaltos a motoristas e cobradores chegaram a 1.017 somente no período de janeiro a junho deste ano. Nos dados apresentados não foram contabilizados arrastões, em que passageiros são abordados e registram o boletim de ocorrência individualmente.

“Pensei que ia morrer”

O motorista Antônio Tangerino, 50 anos, é uma das vítimas dos casos contabilizados e se revolta com a situação. Segundo ele, o caso aconteceu no ponto final da Avenida Presidente Kennedy, no bairro Portão. “Três rapazes deram sinal, entraram no ônibus e colocaram a arma na minha cabeça. Pensei que ia morrer”, contou o motorista, que ainda foi humilhado pelos bandidos. “Eles me chamaram de vagabundo. Na hora eu não fiz nada, mas lembro da situação com revolta”.

Motorista na há 20 anos, Antônio Leal, 53, tem o mesmo sentimento que o colega. Ele já foi assaltado com o uso de revólveres, facas e até pedaços de madeira. Além disso, viu companheiros serem agredidos e convive diariamente com as lembranças. “A gente fica muito abalado com tudo isso”.

Outro colega – que preferiu não se identificar – também leva na memória todos os dias em que ficou à mercê dos bandidos. “Em um dos oito assaltos que sofri, eu até cheguei a prensar a perna do marginal na porta. Ele ficou com metade do corpo para dentro e a arma apontada para mim enquanto gritava dizendo que ia me matar”.

Apoio

Segundo o diretor do Departamento de Apoio ao Trabalhador do Sindimoc, Ricardo Ribeiro, todos os colaboradores que passam por situações assim são atendidos por uma equipe especializada no local do fato e recebem acompanhamento psicológico. “Temos um veículo à disposição 24 horas por dia para ir ao local e oferecer suporte ao motorista e ao cobrador, e ainda oferecemos acompanhamento psicológico”, afirma.

Além disso, as empresas de transporte mantêm um canal de diálogo direto com a Guarda Municipal e a Polícia Militar para trocar informações e mapear os locais com mais incidência de roubos, a fim de que as corporações possam agir preventivamente e até efetuar a prisão dos criminosos.

No entanto, os colaboradores pedem mais. “Queremos segurança porque o trabalhador não pode conviver com isso. Esta semana perdemos nosso colega Edmilton, mas poderia ter sido eu ou qualquer um dos passageiros que carrego diariamente. Não podemos esperar mais”, finalizou o motorista Humberto Pacheco, que atua na função há nove anos.

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