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Os 195 países se comprometeram em Paris a zerar as emissões de CO2 na segunda metade do século. | Benoit Tessier/Reuters
Os 195 países se comprometeram em Paris a zerar as emissões de CO2 na segunda metade do século.| Foto: Benoit Tessier/Reuters

O acordo climático assinado na última semana, em Paris, foi o maior avanço diplomático em direção a uma resposta ao aquecimento do planeta. Também deve se tornar um sinal para empresas e investidores de que essa ação pautará o crescimento econômico nas próximas décadas. Se levado a sério, o acordo levará a trilhões de dólares em investimentos em fontes limpas de energia, desenvolvimento de novas tecnologias e adaptação às mudanças climáticas que já estão ocorrendo.

INFOGRÁFICO: Veja o orçamento das emissões de carbono que o planeta pode absorver.

A meta estabelecida é mais ambiciosa do que o esperado. Ao estabelecer como objetivo manter o aquecimento da Terra até o fim do século abaixo de 2°C, em relação à temperatura pré-industrial, e o mais perto possível de 1,5°C, os governos de 195 países se comprometeram a zerar as emissões de gás carbônico na segunda metade do século, começando por uma redução de até 40% até 2030 em relação a 2010.

Esses números não estão no acordo – o que é sua maior fragilidade. Primeiramente, ainda não existem estudos sobre quanto exatamente é preciso cortar das emissões para um cenário de aquecimento até 1,5°C, já que os cientistas trabalhavam com 2°C. Além disso, os países em Paris só precisaram apresentar metas voluntárias. Somados, esses objetivos levariam a um aquecimento de 2,7°C.

“Existem recursos para a economia de baixo carbono, mas é preciso retirar os subsídios dos combustíveis fósseis.”

Marina Grossi, presidente do CEBDS.

“O aquecimento até hoje já passou de 0,8°C. A expectativa agora é que haja cobrança em cima dos cortes de emissões propostos e que as revisões a cada cinco anos levem a metas maiores”, explica Guilherme Karam, coordenador de estratégias de conservação da Fundação O Boticário.

Iniciativa privada

Pelo que se viu em Paris, a iniciativa privada quer participar do processo de descarbonização. Vários grupos representando empresas, como o We Mean Business, que tem em seus quadros 360 grandes grupos, como Coca-Cola, Microsoft e Carrefour, pressionaram pela aprovação do acordo.

Não é por acaso. Alguns cálculos mostram que será necessário multiplicar por quatro o investimento em geração de energia limpa até se chegar a US$ 1 trilhão por ano, em um desafio gigantesco. Serão necessários investimentos também em agricultura de baixo carbono, redução de emissões de aterros sanitários, entre outros.

Soluções

“Muitas empresas foram a Paris para mostrar que têm soluções”, diz Marina Grossi, presidente do Centro Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). “Existem recursos para a transição para a economia de baixo carbono, mas é preciso retirar subsídios para combustíveis fósseis e investir em tecnologias limpas.”

Uma das entidades presentes em Paris, a Low Carbon Technology Partnership Initiative mostrou nove ações empresariais que cumpririam 65% das reduções de emissões necessárias até 2030. Seriam gerados entre US$ 5 trilhões e US$ 10 trilhões em oportunidades de negócios e até 10 milhões de empregos. “O gargalo agora é resolver a fonte de financiamento. Os recursos existem, mas estão no lugar errado”, completa Marina.

Dependência

A economia global é movida a combustíveis fósseis. Atualmente, 85% da energia utilizada no mundo vem de carvão, gás natural e outros combustíveis derivados de petróleo, segundo o BP Energy Outlook. É esse uso intenso que fez com que o mundo chegasse perigosamente perto de uma situação climática incontornável. Relatório da ONU calcula que a emissão do equivalente a 3,6 gigatoneladas de gás carbônico levaria ao aquecimento da Terra em 2°C. Desse “orçamento” inicial, sobra apenas 1 gigatonelada. Tirar essas fontes energéticas do radar exigiria a implantação de 1 gigawatt de energia limpa por dia nas próximas décadas.

Preço do carbono

Uma das mudanças que o acordo de Paris deve trazer à economia é a adoção crescente de mecanismos que coloquem um preço no carbono gerado em atividades econômicas. Hoje, essas iniciativas são isoladas e têm formatos diferentes. Há a possibilidade de taxação da poluição e a criação de um mercado de créditos, como o tentado com o Protocolo de Kyoto. “É importante haver a precificação para o custo das emissões ser internalizado ao valor dos produtos. Isso já estava previsto na lei brasileira e há debates para que se avance nessa área aqui no Brasil”, explica Rachel Biderman, diretora do World Resources Institute no Brasil.

Com meta ambiciosa, Brasil terá de acelerar “descarbonização”

O Brasil foi o único país emergente a fazer uma proposta de redução em suas emissões totais até 2030 – a meta é colocar 43% menos gás carbônico na atmosfera do que em 2005. Se levar o objetivo adiante, o país terá de rapidamente cortar as emissões em diversas frentes.

Na agricultura, a tendência é que o Brasil tenha de concentrar a expansão da produção em áreas de pastagens degradadas para cortar a praticamente zero o desmatamento. Aliada ao replantio de áreas, como já prevê o Código Florestal, essa medida reduziria drasticamente a “pegada de carbono” do setor.

“O caminho será redirecionar o crédito agrícola para que ele estimule a adoção das técnicas produtivas de baixas emissões”, diz Rachel Biderman, diretora do World Resources Institute. Estudos da Embrapa já trazem soluções viáveis, como o maior adensamento da criação extensiva de gado e a combinação de culturas.

Em outra frente, o Brasil terá de reverter a decisão de investir mais em energia térmica e continuar o processo de integração de renováveis alternativas, como eólica e solar, à matriz energética. Aqui, o desafio tecnológico é global. Como são fontes intermitentes, elas exigem que se encontre um sistema viável de armazenamento de energia para os momentos em que não há sol ou vento.

Uma terceira área de trabalho será nas cidades. Aterros sanitários e lixões precisam ser estruturados para emitirem menos metano (gás do efeito estufa mais danoso para o aquecimento do que o gás carbônico), e sistemas de refrigeração e iluminação precisam se tornar mais eficientes.

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