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A vitória de Trump nos EUA e alguns fenômenos do Brasil recente, como as manifestações de 2013 e a eleição de candidatos que não se identificam como políticos, têm a ver com um mesmo sentimento: a desconfiança com o que os pedantes chamam de establishment e o vulgo prefere chamar de “tudo isso que está aí”. Governo, partidos, instituições financeiras, imprensa, estão todos no mesmo copo de liquidificador, batidos como se fossem uma vitamina difícil de engolir. Não é por outra razão que agências bancárias e carros de reportagem foram alvo privilegiado das pedras dos black blocs.

Aqui, como lá, o adversário maior parece ser o governo e o fato de ele se identificar com um sistema de valores que não é aceito por boa parte da população. Corrupção, opressão econômica, ideologias, pecado… Pode chamar do que quiser. De modo mais ou menos difuso, a manifestação, a ocupação e o voto de protesto dizem que os governos servem a esses valores.

Longe de mim discordar ou concordar, pois sou um reles servidor de meus leitores. Mas proponho que os amigos detenham o olhar sobre dois mecanismos previstos pela lei brasileira há tempos: a caderneta de poupança e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

A caderneta é a forma de aplicação mais disseminada no Brasil e, possivelmente, a menos rentável no longo prazo. No mês passado, pela primeira vez em 21 meses, ela venceu a inflação (a rentabilidade anualizada foi de 8,33% contra 7,87% do IPCA). Sim, porque normalmente ela vem sendo insuficiente sequer para repor a perda de poder de compra do dinheiro nela guardado. A justificativa para isso é que ela teria uma função social – rende menos para que o banco possa destinar parte dos saldos ao financiamento da habitação.

Já o FGTS é um dinheiro descontado do vencimento dos assalariados, que pertence a ele, mas ele não pode usar. Fica depositado em uma conta e é corrigido pela metade do rendimento miserável da poupança. Por quê? Para financiar a habitação e investimentos em infraestrutura.

Ambos são construções de governos passados, que foram mantidos porque ninguém achou (ou nem buscou) forma melhor para cumprir as funções que lhe são atribuídas. O que não quer dizer que sejam boas, pelo contrário. A poupança cria uma ilusão de rendimento que contamina a forma como o brasileiro vê os investimentos. Já o FGTS é a versão financeira do cárcere privado: recurso particular, mas sem direito de ir e vir.

Esse é só um pequeno aspecto da espoliação diária a que o cidadão é submetido no Brasil. Qualquer governo que queira reorganizar sua relação com o zé-povão vai precisar tocar nesse assunto.

Ema, ema, ema, cada um com seus pobrema. Trump e a sociedade americana terão muitas encrencas a resolver. Mas os nossos – passando pelo FGTS e pela caderneta – não são menores.

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