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O mercado de trabalho no Rio começa a dar sinais de freada brusca. Com as incertezas do setor de petróleo e os efeitos da desaceleração econômica no país, os dados são claros: dos 84.189 postos com carteira assinada eliminados no Brasil nos dois primeiros meses do ano, quase metade (39.722) estava concentrada na Região Metropolitana do Rio. Somente em fevereiro, das 2.415 vagas cortadas no país, 82,5% estavam na cidade do Rio e 61,47%, no estado, de acordo com dados do Ministério do Trabalho, compilados pela Tendências Consultoria.

No primeiro bimestre, além da dispensa de temporários do comércio, que cortou 20.072 postos e é típica dessa época do ano, o saldo negativo na região foi influenciado pelo fechamento de 9.231 vagas na construção civil, principalmente por causa das demissões de operários do Comperj. Também pesou o resultado no setor de serviços, que teve saldo negativo de 7.190 vagas no mesmo período.

Crise deve fazer cidade do Rio buscar diversificação, dizem especialistas

A crise do petróleo que atinge em cheio o Estado do Rio pode ser um bom momento para estimular uma economia mais diversificada, principalmente na capital fluminense, avaliam especialistas. Hoje, a maior parte dos investimentos previstos para a cidade ainda está relacionada a óleo e gás, mas governo e empresas já começam a explorar outras possibilidades.

— Para a capital, pode ser o momento para estimular outros setores, como serviços de ponta, pesquisa e desenvolvimento, tecnologia, informação e comunicação — diz Luísa Azevedo, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Renata La Rovere, do Instituto de Economia da UFRJ, destaca a vocação para a economia criativa, como o setor audiovisual, e de startups da área de tecnologia:

— O Rio tem diversas incubadoras. As startups podem ser alternativa. Mas são necessárias políticas coordenadas.

Elevar investimentos é essencial para aquecer comércio e serviços, responsáveis pela maior parte dos empregos da cidade.

O impacto da crise na capital, no entanto, ainda é moderado. Embora tenha recuado, o rendimento médio na região manteve-se acima da média nacional em fevereiro, a R$ 2.391, sustentando dados positivos do comércio. O quadro fiscal também é mais favorável. No início do mês, a mesma Standard & Poor’s que rebaixou o rating estadual manteve o grau de investimento da cidade, com nota “BBB”, pela “sólida gestão financeira”. O país tem hoje a nota “BBB-”.

— O Rio se beneficia do turismo, e o percentual de servidores públicos alivia um pouco a deterioração da crise — diz o economista Rodrigo Leandro de Moura, do Ibre/FGV.

Em um sinal de que o comércio ainda é menos afetado, os preços continuam em alta. Na região metropolitana, a inflação ficou em 9,11% em 12 meses, bem acima da média nacional. Para Lúcia Azevedo, da FGV, é questão de tempo:

— A tendência é de algum arrefecimento na inflação.

— O quadro é de deterioração do emprego. Além da conjuntura econômica, há indício de que a região esteja sofrendo fatores pontuais por concentrar a indústria do petróleo, o escândalo da Lava-Jato e a interrupção do pagamento de fornecedores — disse Rafael Bacciotti, economista da Tendências.

Os dados do mercado metropolitano, medidos pela Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, confirmam a piora. A taxa de desemprego entre janeiro e fevereiro subiu de 3,6% para 4,2%, ainda a menor entre as regiões. A renda do Rio acompanhou a queda em todas as regiões, e recuou 1,4% entre janeiro e fevereiro, o que representa a primeira variação negativa em 28 meses.

O quadro fiscal do estado se soma a este cenário. Ele foi o principal fator que levou a agência de classificação de risco Standard & Poor’s a retirar, na semana passada, o grau de investimento do estado, que funciona como um selo de qualidade aos investidores. O aperto do governo estadual — que rescindiu contratos com fornecedores, contingenciou ao menos R$ 4,5 bilhões e congelou salários — tem efeito sobre o emprego, avalia o economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos.

— Na construção civil, as obras de infraestrutura da Petrobras estão paradas, principalmente em Itaboraí. Há risco de atraso em outras obras. Não é um efeito sazonal, ao contrário, fevereiro é uma época de forte geração de emprego, mas foi fraco no Brasil e no município do Rio — disse Camargo.

Efeito sobre prestadores de serviço

Carro-chefe da economia, o setor de óleo e gás já sente os efeitos da queda dos preços no mercado internacional e dos desdobramentos dos escândalos de corrupção da Petrobras. Os três municípios que mais perderam vagas no ano estão de alguma forma relacionados à cadeia do petróleo, segundo Mauro Osório, da UFRJ. Em primeiro lugar está Itaboraí, afetado pelas demissões nas obras do Comperj, seguido por Niterói, sob influência da indústria naval, e Macaé, muito dependente da extração de óleo e gás. A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) já calculou em R$ 58,9 bilhões os investimentos na área de óleo e gás em risco, em razão de possíveis paralisações de empreendimentos na esteira da Lava-Jato.

Para Júlio Bueno, secretário estadual de Fazenda do Rio, a crise é forte, mas passageira. Ele admite que, num primeiro momento, a decisão da S&P pode influenciar investidores, mas crê em mudança a médio e longo prazos.

— As dificuldades atuais não são banais, mas são conjunturais, passageiras, provocadas por uma deterioração do cenário econômico muito brusca no segundo semestre do ano passado — afirmou. — O país ainda receberá grandes investimentos no setor de petróleo, e a maior parte desses investimentos será realizada no nosso estado.

As baixas afetam não só a indústria extrativa como os serviços prestados na cadeia de petróleo. José de Sá, sócio da consultoria Bain & Company, explica que o impacto é até maior do que sobre a indústria, já que empresas de menor porte costumam ter menos margem de manobra.

— Na crise, as empresas de bens e serviços sofrem mais que as operadoras de petróleo, que têm mais alavancas para acionar. Os serviços de exploração, sondas, sísmica, sentem mais o impacto.

Osório, da UFRJ, diz que o momento é de incerteza, mas já vê sinais de melhora:

— Ainda não dá para ver uma situação particularmente grave para o Estado do Rio. Há uma desaceleração importante e muitas incertezas, mas acho que a Petrobras já está começando a sair da crise.

Quem procura emprego, porém, enfrenta dificuldades. Nove anos após chegar ao Brasil para fazer pós-graduação, o colombiano Camilo Aristizábal deve ficar desempregado em breve. A empresa em que trabalha como geólogo, uma norueguesa de pesquisa em exploração de petróleo, deixará o país em razão dos problemas econômicos do setor.

— Não é uma particularidade dessa empresa, é uma situação geral — afirmou.

Aristizábal já começou a enviar currículos, mas vê poucas oportunidades. Foi o que percebeu o engenheiro de petróleo Raphael Pimenta, que procura uma vaga há dois anos. Diante da falta de oferta, ele já fez pós-graduação em segurança do trabalho:

— Não há oportunidades para quem é engenheiro de petróleo recém-formado. Pedem experiência.

Procura por executivos caiu 30%

A crise já causou a queda na procura de empresas por executivos no primeiro trimestre, disse André Nolasco, gerente-executivo da Michael Page no Rio.

— O mercado de trabalho virou. A procura de empresas de óleo e gás caiu 30%. No mercado de construção, agora aumentou em 40% a disponibilidade de imóveis comerciais — afirmou Nolasco.

Nelson Bravo, consultor na área de RH da Mercer, também atesta essa mudança:

— Há dois anos, éramos contratados para trazer empregados para as empresas, oferecendo salários maiores e bônus de contratação. Este ano, fomos contratados para organizar bônus de retenção.

Nolasco vê, porém, oportunidades em 2016, já que muitos investidores internacionais têm chegado ao país para ocupar o espaço deixado por fornecedores que rescindiram contrato ou quebraram.

Na construção civil, Leopoldo Cunha e Herbert dos Santos foram demitidos em fevereiro pela Alumini Engenharia. Eles trabalhavam nas obras do Comperj. Cunha, que saiu do Ceará para trabalhar em Itaboraí, se preocupa, pois precisa ajudar a mãe:

— Dei entrada no seguro-desemprego. Devo receber em 40 dias e tenho pedido ajuda a colegas.

Para Ana Castelo, pesquisadora da Fundação Getulio Vargas (FGV), o Rio e o Brasil já veem os efeitos do fim do boom do mercado imobiliário. Na capital fluminense, porém, há esperança de que as obras para as Olimpíadas amenizem o impacto.

— No bimestre, o emprego na construção caiu 6,99% no país e 5,38% no Rio. Essa queda menor pode estar relacionada aos Jogos — disse.

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