As reações da Bolsa de Valores são sempre extremadas, mas ilustram bem como a análise do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff pode exercer influências ambíguas sobre a economia.
INFOGRÁFICO: Veja a evolução da atual recessão
ANÁLISE: Desfecho rápido é melhor para a economia, mas pode afetar ajuste fiscal
Boa parte do empresariado e a maioria do mercado veem com bons olhos a saída da presidente. Por outro lado, a instabilidade que o processo traz é grande, e não sabemos quanto vai durar.
Na quinta-feira (3), primeiro dia de negócios após a acolhida do pedido na Câmara, o Ibovespa subiu quase 5% durante a sessão, com operadores eufóricos com a possibilidade de um novo governo. Na sexta (4), a Bolsa chegou a recuar 3% no pior momento. O mercado parece ter entendido que ainda há todo um caminho até o desfecho do processo – e, quanto mais demorado for o trajeto, pior.
Já havia adiamento de investimentos, de decisões de consumo. A recessão para o ano que vem já está contratada. Uma demora na definição do impeachment apenas prolonga isso.
Muita gente vê chances de uma melhora na economia com a saída da presidente. Em primeiro lugar, porque foi sob seu comando que o país caiu na recessão mais longa desde o governo Collor – e a tentativa de mudar de rumo neste ano, com o ministro Joaquim Levy e seu programa de ajuste fiscal, deu em quase nada até agora.
Independentemente se Dilma fica ou sai, a abertura do processo indica que essa história tem data para acabar. E aí termina esse chove-não-molha que já dura um tempão.
Em segundo lugar porque, tal como no time que perde um jogo após o outro na luta contra o rebaixamento, a troca de treinador cria um “fato novo” que, pelo menos por um tempo, pode trazer ânimo à equipe e, eventualmente, bons resultados. Ocorre que, nessa analogia, ainda estamos na fase das derrotas seguidas – e não se sabe até quando dura o técnico atual.
A discussão vai gerar um grande aumento de incerteza, e uma certa paralisação no Congresso e na economia. Uma vez resolvido, se for na direção de aprovar o impeachment, acho que haverá uma reação positiva.
Retração ainda pior
Enquanto durar o processo, o mais provável é que empresários e consumidores esperem para ver o que acontece antes de decidir se vale a pena investir ou tomar um empréstimo, por exemplo. O problema é que, conforme revelou o PIB do terceiro trimestre, divulgado na véspera da acolhida do pedido de impeachment, a retração da economia é ainda pior do que se imaginava – e o termo “recessão” passou a dar lugar a “depressão econômica” em algumas análises.
Se até então o mercado esperava quedas seguidas do PIB até o fim de 2016, agora a ameaça pode se estender a 2017. Não existe uma definição precisa para a depressão, mas é comum chamar assim um período de pelo menos três anos de recessão, com inflação (ou deflação) e desemprego elevados, escassez de crédito, baixa confiança, queda na produção e nos investimentos e um grande número de falências.
Um processo de impeachment muito arrastado pode não ser determinante para levar a economia a esse estado, mas certamente não ajuda a evitá-lo. “Medidas importantes para corrigir o rumo das contas públicas tendem a ficar de lado, até porque o governo vai estar mais preocupado em se defender”, diz Pedro Jucá Maciel, assessor de assuntos econômicos do Senado.
Futuro
Enquanto alguns analistas internacionais falam até em “megatempestade” se Dilma cair, o professor de Economia José Márcio Camargo, da PUC-Rio, crê numa “reversão positiva” de expectativas no caso de um afastamento da presidente. “Além de este governo ser percebido como pouco eficiente, o PMDB, do vice-presidente Michel Temer, já lançou um programa que certamente será muito bem avaliado pelos agentes econômicos”, diz Camargo, em referência às medidas liberalizantes do documento “Ponte para o futuro”, apresentado em novembro. “Mas a transição vai ser muito complicada. A discussão vai gerar um grande aumento de incerteza, e uma certa paralisação no Congresso e na economia.”
Desfecho rápido é melhor para a economia, mas pode afetar ajuste fiscal
O governo trabalha para suspender o recesso de fim de ano no Congresso e, com isso, definir logo o processo de impeachment. Independentemente do desfecho, a rapidez tende a ser positiva para a economia, pois limita a fase das incertezas. Se Dilma ficar no cargo, pode ganhar musculatura política para tocar projetos de seu interesse. Uma eventual queda pode se reverter em aumento na confiança de empresários e consumidores.
Mas a celeridade também tem seus efeitos colaterais. A tendência é de que medidas que fazem parte do pacote de ajuste fiscal sejam prejudicadas. Segundo o Valor Econômico, sem o recesso, sete medidas provisórias (MPs) que venceriam em fevereiro ou março passam a “caducar” já em janeiro, o que poderia causar um impacto negativo de R$ 21,8 bilhões no já combalido caixa federal.
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