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Lucas Dezordi, economista: “governo precisa cortar gastos” | Marcelo Andrade/ Gazeta do Povo
Lucas Dezordi, economista: “governo precisa cortar gastos”| Foto: Marcelo Andrade/ Gazeta do Povo

Opinião

"Crescimento duradouro virá com resgate de políticas econômicas"

Gilmar Mendes Lourenço, economista, professor da FAE e diretor-presidente do Ipardes.

É praticamente consensual o diagnóstico de que a recuperação da estabilidade monetária brasileira e o encaixe do país em um ciclo de crescimento duradouro, no transcorrer das próximas duas décadas, exigirão, antes de qualquer iniciativa, o resgate da capacidade de formulação e execução de políticas econômicas, sacrificada pela aplicação equivocada do keynesianismo entre 2009 e 2014. Esta é uma condição essencial ao retorno da disposição dos agentes sociais para a construção compartilhada de um projeto de desenvolvimento.

Nessa perspectiva, será crucial a busca de uma sintonia fina entre as variáveis de estabilização e aquelas direcionadas à alteração sustentada dos patamares de expansão econômica. Isto significa que, ao lado da adoção de mecanismos de combate à inflação pelo lado da oferta, centrados na redução estrutural dos juros e dos dispêndios governamentais correntes e financeiros e na depreciação da taxa de câmbio, urge o lançamento das reformas estruturais.

Mais precisamente, as imprescindíveis cirurgias nos arcabouços tributário, fiscal, administrativo, patrimonial, trabalhista e previdenciário oportunizarão forças para o afastamento, em definitivo, dos perigos de formação de focos inflacionários oriundos do desequilíbrio das finanças do setor público, e a promoção da desejada elevação da inversão pública e privada, elemento antecedente de sólidos estágios virtuosos.

A permuta de prioridades, mirando o investimento em vez do apoio ao consumo desenfreado, ensejará espaço para as inversões em infraestrutura econômica, científica e tecnológica e, por extensão, a reversão da desidratação da matriz manufatureira, através da impulsão da produtividade e da inserção competitiva das empresas atuantes no Brasil em um ambiente de radicalização da terceira revolução industrial em escala global.

Desafio

Desatar o nó dos investimentos é a lição de casa mais importante

O país viveu, a partir de 2010, uma segunda onda de consumo – ainda mais forte que a provocada pelos primeiros anos do Plano Real – amparada pela renda e principalmente pelo crédito. O financiamento direto ao consumo triplicou, para 15% do PIB. Mas esse movimento dá sinais de esgotamento sem que os investimentos, outro motor importante do crescimento, tenham deslanchado, diz o economista Otto Nogami, professor do Insper.

Nogami engrossa a lista de economistas que acredita que sem desatar o nó dos investimentos, o país vai continuar a patinar. "Fazer um ajuste fiscal rigoroso, fazer uma política monetária que garanta liquidez ao mercado e estimular de maneira efetiva o investimento são os desafios", diz. Segundo ele, o Brasil precisa elevar a taxa de investimento sobre o PIB para 25% para crescer 4% ao ano. Nesse sentido, segundo a maioria dos economistas, será necessário também repensar o papel do financiamento público – em especial via BNDES – nos próximos anos. "O BNDES usou dinheiro do Tesouro e se concentrou em financiar grandes grupos apenas", diz Fernando Barbosa, professor da FGV.

O Brasil venceu a batalha da hiperinflação, mas o crescimento ainda não decolou como deveria. Na última década, conseguiu avanços importantes, como o aumento da renda e do consumo e a inclusão de uma massa de 35 milhões de brasileiros na chamada nova classe C. Passou sem grandes traumas por uma crise financeira internacional (a bolha imobiliária de 2008), expandiu o mercado de crédito e bateu recorde de geração de empregos.

INFOGRÁFICO: Veja o resultado de transações correntes e do superávit fiscal

Mas ainda patina para conseguir índices de crescimento mais robustos, sofre com problemas estruturais, como a elevada carga tributária, baixa produtividade, infraestrutura deficiente e elevados gastos públicos. Ou seja, ainda há um longo caminho para que o Brasil atinja um novo patamar de desenvolvimento econômico e social. Neste ano, a previsão de crescimento da economia é de um avanço de 1,24% no Produto Interno Bruto (PIB).

Depois de passar pela dor do nascimento e pelas incertezas da adolescência, o modelo de estabilização econômica brasileiro caminha para a maioridade com o desafio de elaborar uma estratégia de longo prazo. Para a maioria dos economistas, a receita é a mesma. "Se comprometer com um superávit fiscal maior, entre 3% e 3,5% do PIB, uma inflação menor nos próximos anos e fazer as reformas, em especial a tributária", diz Lucas Dezordi, coordenador do curso de economia da Universidade Positivo (UP).

Para Alexandre Porsse, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), se não fosse o Plano Real, o Brasil provavelmente não teria ampliado o nível de distribuição de renda dos últimos anos, mas há uma preocupação crescente com a falta de produtividade e a inflação, que insiste em ficar próxima do teto da meta, de 6,5%.

"É preciso pensar, por exemplo, sobre a inflação dos serviços, que foi influenciada pelo aumento da demanda e a falta de mão de obra qualificada nos últimos anos. Além disso, o país está entrando em uma transição demográfica e a questão da mão de obra será central também para a inflação nos próximos anos", acrescenta.

Economistas divergem sobre inflação "ideal"

A alta incômoda dos índices de preços nos últimos anos reabriu a discussão entre os economistas sobre qual seria, hoje, 20 anos depois, a inflação "ideal" para o país. O economista Edmar Bacha, um dos criadores do Plano Real, defende que o Brasil precisa perseguir um índice anual ainda mais baixo – algo como 3% nos próximos 20 anos. Somente assim estariam garantidas as bases para um desenvolvimento mais sustentável no longo prazo.

Mas a tese de Bacha não é consenso mesmo entre aqueles que defendem um controle atento e efetivo da inflação. Hoje ela ronda os 6%. O Banco Central estabeleceu como objetivo uma inflação de 4,5% por ano, com tolerância de dois pontos porcentuais para mais e para menos. "O que se viu, nos últimos anos, foi que o governo passou a mirar não ultrapassar o teto e não o centro da meta", diz Otto Nogami, professor de economia do Insper.

Para Alexandre Porsse, professor da UFPR, para o Brasil ter uma inflação de primeiro mundo terá que ter fundamentos de primeiro mundo. "Uma carga tributária de primeiro mundo, por exemplo. Hoje parte do déficit em transações correntes que o Brasil registra está sendo provocado pelas compras de brasileiros no exterior, onde encowntram uma carga tributária menor", acrescenta.

A inflação também está intimamente relacionada às expectativas do mercado e à condução das contas públicas, na avaliação de Lucas Dezordi, da Universidade Positivo. "Há uma relação entre o superávit fiscal e as expectativas sobre a economia e a inflação. Ou seja, se o governo cortar gastos provavelmente teremos uma inflação menor também", diz ele.

Na corrente contrária está um grupo de economistas que defende que o regime de metas como está estruturado hoje não reflete mais a realidade. Para Fabio Tadeu Araújo, da PUCPR, como o governo não consegue cumprir o centro da meta, de 4,5%, talvez o problema seja mesmo a meta. "Uma inflação acima de 6% não é o fim do mundo", diz.

Pressão

Outro fator de pressão inflacionária é que a economia brasileira ainda é bastante indexada e a correção, muitas vezes, se dá de maneira não formal. Os preços administrados também são fonte de pressão constante.

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